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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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Roberto Jefferson vê "pragmatismo" no inchaço de seu partido e alega afinidade ideológica com o PT

Líder do PTB admite cargos e elogia Dirceu

Alan Marques - 20.mai.03/Folha imagem
O líder do PTB, deputado Roberto Jefferson, discursa na Câmara


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O PTB é a maior vedete deste início de mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Elegeu 26 deputados em outubro passado. Na sexta-feira, estava com 48. Um crescimento de 22 cadeiras -ou 84,6%.
Como esses 22 deputados foram cooptados? Para o líder do PTB na Câmara, Roberto Jefferson (RJ), as filiações ocorreram por razões ideológicas e pragmáticas.
No caso do pragmatismo, cargos. O PTB tem o Ministério do Turismo e a presidência da Infraero. São os postos mais visíveis. Mas recebeu também posições na Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária) de Paraná, Mato Grosso e Tocantins. No Rio de Janeiro e no Paraná, há indicados do partido nas delegacias regionais do trabalho espalhadas no país.
Há um roteiro quando um deputado quer entrar no PTB. Primeiro, fala com Roberto Jefferson -congressista polêmico, que apoiou o governo de Fernando Collor (1990-1992). Depois, o líder petebista faz um contato com a Casa Civil, comandada pelo ministro José Dirceu.
"Ele [Dirceu] não veta, mas quando ele não demonstra muito entusiasmo, a gente sabe que não adianta enfrentar a posição. Quando ele diz: "Vamos ver". Quando ele diz isso eu já senti que morreu", relata Jefferson, para quem o ministro da Casa Civil tem sido "muito correto".
A seguir, trechos da entrevista de Jefferson (FR):
 

Folha - O PTB elegeu 26 deputados federais e hoje tem 48. Vai parar por aí?
Roberto Jefferson -
Vamos chegar a 56 e vamos parar por aí. Explodindo, 60. Mas 56 com certeza. Nesta semana que entra bateremos em 50 deputados.
Há 14 deputados federais do PSDB pensando em sair. Mas em bloco não vêm, porque na base dá conflito. Vão uns para o PTB, quatro para o PP, uns três ou quatro para o PMDB.

Folha - Como é a participação do PTB no governo com cargos?
Jefferson -
Nós só temos um ministério [do Turismo, com Walfrido Mares Guia] e uma crise na Infraero, pois o Carlos Wilson [ex-senador por Pernambuco] não atende ninguém nem telefone. Vamos devolver a Infraero com ele dentro.

Folha - Como assim?
Jefferson -
É. Porque ele assumiu um monte de compromissos com deputados que não cumpre e gera crises para a gente. O Zé Dirceu diz assim: "Eu não aguento mais o Carlos Wilson".

Folha - O que ocorre?
Jefferson -
Ele não dá bola. Ele assumiu compromisso de nomear um cara superintendente, o outro gerente de um aeroporto. E ele não faz nada disso.

Folha - O PTB está sugerindo nomes para cargos no governo?
Jefferson -
É claro que sim. Algumas das pessoas já foram nomeadas.

Folha - Quem?
Jefferson -
Não vamos pôr isso, não. Aí eu exponho o meu companheiro que fez. Algumas já foram contempladas. Vamos falar o Estado sem contar o santo: Paraná, Mato Grosso e Tocantins na Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária]. Delegacia do Trabalho no Rio e no Paraná. No Norte, na área de administração da empresa de eletricidade.

Folha - Quando o deputado entra no PTB ele pergunta sobre se o governo vê essa ação com bons olhos?
Jefferson -
É claro que sim.

Folha - Como funciona?
Jefferson -
É assim mesmo. Primeiro, o deputado vem ao partido e conversa. Depois, eu converso no governo. E digo: "Olha, eu estou conversando com fulano, fulano e fulano. Posso trazer para o PTB?". Se eu receber uma sinalização, "não há problema", não tem veto do PT àquele nome. Eu trago para o partido. Sem problema, está havendo isso, sim.

Folha - Fala-se com a Casa Civil?
Jefferson -
É claro que sim. Articulação política do governo.

Folha - Como tem sido a atuação do ministro José Dirceu?
Jefferson -
Muito correto [o José Dirceu].

Folha - Ele veta alguém?
Jefferson -
Ele não veta, mas quando ele não demonstra muito entusiasmo, a gente sabe que não adianta enfrentar a posição. Quando ele diz: "Vamos ver". Quando ele diz isso eu já senti que morreu.

Folha - O sr. tem algum exemplo?
Jefferson -
Os cinco deputados de Pernambuco [filiados recentemente ao partido] tinham uma preocupação de que o PTB teria de apoiar o candidato a prefeito do PT. Queriam ouvir do Zé Dirceu que o compromisso é na governabilidade. Aí se tranquilizaram.

Folha - E o que disse o ministro? Teve uma reunião dos deputados com ele?
Jefferson -
Claro que sim. E comigo. No Palácio. É assim que temos feito, com muita correção do Zé Dirceu.

Folha - Como o sr. responde às críticas de que esses deputados entram no PTB em troca de cargos ou por fisiologia?
Jefferson -
As teses do governo são as que o PTB esposam. Reforma da Previdência, reforma tributária. Eu aposto que se fosse o fim da propriedade privada e reforma agrária na marra, ninguém ia apoiar. Como as teses são convergentes, dá conforto para as pessoas caminharem para a base.
E esses críticos do PSDB e do PFL têm de dizer isso porque eles fizeram assim. Eles pagavam para ter base.

Folha - Pagavam como?
Jefferson -
Pagavam dando cargo, dando estrutura de poder.

Folha - Mas agora os deputados entram para o PTB e recebem cargos. Não se configura também o "pagamento"?
Jefferson -
Se você for governo e não tiver poder, é melhor não ser governo.

Folha - Mas o que diferencia a nomeação para os cargos hoje do que ocorria antes?
Jefferson -
Mas nós estamos no governo desde a formação dele. E governar é ter responsabilidade junto. É claro que tem interesses pragmáticos. Você não pode ser político sem poder. Mas tem interesses ideológicos também. As teses aproximam. Antes era mero fisiologismo.



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