São Paulo, domingo, 02 de maio de 2004

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CONGRESSO

Petista afirma que presidente deseja sua permanência à frente da Câmara e a manutenção de Sarney no Senado

Lula quer reeleição nas Casas, diz João Paulo

Sérgio Lima/Folha Imagem
O presidente da Câmara, João Paulo Cunha, abraça o presidente do Senado, José Sarney


RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Parte interessada, o presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), havia decidido não se manifestar sobre a emenda constitucional que, se for aprovada, permitirá que ele e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) concorram à reeleição ao final de seus atuais mandatos, em fevereiro de 2005.
Mudou de idéia. Segundo ele, em virtude da "rede de intrigas e de fofocas" surgida em torno do projeto e da intenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a respeito da reeleição.
A verdade, segundo João Paulo: "O presidente Lula já declarou particularmente para mim que deseja que eu continue à frente da Câmara dos Deputados e que o presidente José Sarney continue à frente do Senado".
Semana passada, até o nome do ministro José Dirceu (Casa Civil) foi relacionado aos que estariam contra a reeleição de Sarney e João Paulo, pois estaria interessado em retomar sua cadeira de deputado e concorrer à presidência da Câmara. João Paulo jura que isso não é verdadeiro.
A emenda deve ser votada nesta semana em comissão especial da Câmara. Mas é no Senado que se localiza o principal foco de resistência. O líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), alega que fez um acordo com Sarney, Dirceu e o presidente do PT, José Genoino (SP), pelo qual ele sucederia Sarney em 2005. Sarney, que nega a existência do acordo, e Calheiros chegaram a travar uma áspera discussão por causa do assunto.
"Se tem alguém de seu governo [de Lula] que está articulando contra, é bom que saiba que está fazendo um movimento contra o presidente da República", adverte João Paulo. Ele não diz, mas refere-se sobretudo ao líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), que aliou-se a Calheiros na artilharia contra a emenda.
João Paulo Cunha falou à Folha na tarde de sexta-feira passada:
 


Folha -A emenda da reeleição é um projeto pessoal seu?
João Paulo Cunha-
Não, absolutamente. Não é pessoal e é importante que não seja, porque o exercício da presidência de um poder só tem razão se estiver amarrado com força a um projeto de país, a um projeto coletivo de visão desse poder e das conseqüências que ele propicia para o país.

Folha -Afinal, o presidente Lula está a favor ou contra a reeleição?
João Paulo -
O presidente Lula já declarou particularmente para mim que ele deseja que eu continue à frente da Câmara dos Deputados e que o presidente Sarney continue à frente do Senado. Se tem alguém de seu governo que está articulando contra, é bom que saiba que está fazendo um movimento contra o presidente da República.

Folha -O sr. por acaso está se referindo ao ministro José Dirceu?
João Paulo -
Não estou me referindo a ninguém, mas dizendo que o presidente Lula declarou e autorizou que fosse apresentada a sua opinião a favor da continuidade do presidente Sarney à frente do Senado Federal e da minha continuidade à frente da Câmara dos Deputados. Mesmo compreendendo que são poderes diferentes, distintos, independentes e autônomos, e que deve ser assim. Mas a opinião dele, se puder ser considerada, é uma opinião a favor da continuação.

Folha -Mas e o ministro José Dirceu?
João Paulo -
O ministro José Dirceu teria condições e capacidade para exercer qualquer função em nosso país, inclusive a presidência da Câmara, mas, neste momento, eu acho que o ministro também é favorável tanto à continuação do presidente Sarney como à minha. É isso o que ele tem manifestado pessoalmente para mim, para o presidente Sarney e para todos os companheiros que o têm procurado com sinceridade.

Folha - O que justifica a reeleição na Câmara e no Senado?
João Paulo -
Nós podemos pensar o contrário: por que não ter reeleição? Nas Constituições do Brasil nunca teve esse dispositivo proibindo a reeleição. Nunca. A primeira Constituição que escreveu isso foi a de 1988. A proibição da reeleição apareceu na ditadura militar. Além disso, veja o paradoxo que existe no Brasil: várias Assembléias Legislativas no Brasil têm reeleição. Nós temos casos de presidentes de Assembléias Legislativas que têm ficado dez anos à frente da Assembléia Legislativa. E muitas Câmaras de Vereadores estão introduzindo a reeleição, ficando [o presidente] por muitos anos.

Folha -Mas esse não é exatamente o risco que a reeleição propicia?
João Paulo -
A nossa idéia é que você permita uma reeleição só, independentemente de legislatura. É uma coisa positiva para o país. Uma coisa boa. Positiva porque pode assegurar durante uma legislatura toda um mesmo presidente. Com a possibilidade de, no meio desse mandato, os próprios deputados, os próprios senadores avaliarem se está indo bem ou não. Se está indo mal, muda; se está indo bem, exerce seu mandato todo como presidente. Além disso, veja que coisa grave: os presidentes da Câmara e do Senado, nos dois primeiros anos da legislatura, não podem se reeleger. Já os presidentes da Câmara e do Senado dos dois últimos anos do mandato de quatro anos podem se reeleger, porque é uma outra legislatura. Então você tem, na realidade, a constituição de presidentes de duas categorias. De qualquer forma, apesar de eu apresentar esses argumentos, eu estou fora, afastado desse debate, porque eu não queria emitir a minha opinião sobre a questão da reeleição. Porque eu posso ser parte interessada.

Folha -O que o leva a falar, então?
João Paulo -
Acho importante diante da rede de intrigas, da rede de fofocas que tem abastecido o noticiário em relação a esse tema. Não estou me referindo a ninguém. Estou me referindo ao fato de que, efetivamente, nas últimas duas ou três semanas, em particular o presidente Sarney tem sido foco de muita fofoca, de muita intriga e que a maior parte delas não tem procedência nenhuma.

Folha -O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), alega que foi firmado um acordo com o governo pelo qual sucederia Sarney em 2005.
João Paulo -
Se o acordo existe, e eu não tenho conhecimento dele, que relação isso tem com o instituto da reeleição? Qual a segurança que tem quem está no cargo agora que será reeleito? Você aprova e depois escolhe o candidato. Mesmo tendo a reeleição, não significa que os atuais serão eleitos.


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