São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2004

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ECOS DO ORIENTE

Para Planalto, interesse chinês em comprar urânio foi superdimensionado

Governo vê erro de ministros ao sugerirem acordo nuclear

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A cúpula do governo Lula avalia que o único deslize grave da "exitosa" viagem à China foi o imbróglio que deu a entender que o Brasil exportaria urânio para o país asiático. Não havia, antes, nada acertado nessa linha. Tampouco chegou-se a tal acordo na visita.
A confusão começou na terça-feira passada, dia 25 de maio, quando autoridades chinesas e brasileiras discutiram parceria na área aeroespacial. No encontro, houve menção informal à possibilidade futura de cooperação bilateral no comércio de urânio.
No ano passado, foi lançado em órbita o segundo satélite conjunto, o Cbers-2 (sigla em inglês para Satélite de Pesquisa China-Brasil). A cooperação aeroespacial prevê ainda o lançamento de mais dois satélites, em 2006 e em 2009.
Foi só no final da reunião do dia 25, da qual participava o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos, que a questão nuclear entrou em pauta. Autoridades chinesas manifestaram interesse na compra de urânio não enriquecido do Brasil. Para produzir energia nuclear e bomba atômica, é necessário enriquecer esse minério.
De acordo com o Ministério da Ciência e Tecnologia, Campos afirmou aos chineses que o Brasil não tem histórico na exportação de urânio e que precisaria estudar a possibilidade de vender o minério. A produção brasileira não é suficiente, no momento, nem para as demandas internas do país.
Na mesmo dia 25, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso em que disse que poderia haver parceria futura na "exploração conjunta de minas de urânio". Detalhe: a Constituição proíbe a exploração de minerais em parceria com outros países.
A Folha apurou que o imbróglio começou quando o ministro Guido Mantega (Planejamento) relatou a conversa de Campos a jornalistas. Os dois ministros, na visão da cúpula do governo, superdimensionaram o assunto. Por ordem de Lula, foi feita uma nota de Campos, que, por sua vez, atrapalhou-se numa entrevista que insistiu em dar, apesar de conselhos em sentido contrário.
No Rio, o ministro disse ontem que também explicou aos chineses que o Brasil está reexaminando seu programa nuclear, o que deverá ser concluído até agosto, e que prometeu voltar a falar do assunto em outubro próximo, quando virá ao país uma delegação chinesa para renovar o acordo bilateral na área aeroespacial.
"Nós não fechamos as portas para uma posição de conversa, mas deixamos muito claro o que tem sido historicamente a posição: o Brasil não exporta urânio."
Na reunião de anteontem de Lula com seus ministros, avaliou-se que Mantega e Campos erraram. O episódio gerou até reação extra-oficial dos EUA à possibilidade de venda de urânio à China e obrigou o governo a oficializar um desmentido. Nos bastidores e como de costume, a imprensa foi acusada de ter entendido mal.
Apesar de os discursos de Lula no exterior terem sempre revisão final do ministro Celso Amorim, o chanceler não foi criticado na comitiva brasileira pela menção à "exploração conjunta". Mas, anteontem, avaliou-se que isso também colocou lenha na fogueira.


Colaborou a Sucursal do Rio

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