São Paulo, quinta-feira, 02 de julho de 2009

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ANÁLISE

Crise no Senado continuará com ou sem Sarney

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A crise do Senado continuará grave com José Sarney na presidência da Casa ou fora dela. Motivos: ela se estende a outros senadores e possui raízes podres antigas em todas as esferas da instituição.
Sarney está na berlinda porque personifica como poucos os vícios do Senado e da tradição patrimonialista da política brasileira. Ele é o último grande oligarca do século 20.
Apesar do importante papel na transição da ditadura para a democracia em 1985, dono de um temperamento que dissipou e não alimentou crises, Sarney fez carreira política na base da troca de favores, com frequente confusão entre o público e o privado.
No entanto, senadores do DEM, PMDB, PT e PSDB, para ficar nos quatro principais partidos, também usaram o patrimônio público como se fosse particular. Se Sarney permanecer enfraquecido na cadeira, esses senadores terão de responder por seus pecados. Se Sarney sair, também.
No cenário de licença, o substituto imediato é o atual primeiro-vice-presidente do Senado, Marconi Perillo (PSDB-GO). O tucano seria candidato a mandato-relâmpago. Tem processos na Justiça e entraria na mira de peemedebistas humilhados. É detestado por Lula, e a própria bancada do PSDB acha que duraria pouco.
Na hipótese de inviabilização de Perillo, a substituta é a segunda-vice-presidente, Serys Slhessarenko (PT-MT). Ela faz parte da turma com funcionário-fantasma morando no exterior e salário pago pelo Senado. Uma licença de Sarney poderia desencadear efeito dominó.
E se o peemedebista renunciar à presidência do Senado? Nova eleição teria de ser feita em cinco dias. Talvez isso forçasse à renúncia de toda a Mesa Diretora, o que exigiria nova eleição no mesmo prazo.
Ora, o estopim da atual crise foi justamente a disputa entre as alianças inusitadas de PMDB e DEM contra PT e PSDB. Não parece haver clima para reeditar embate semelhante àquele em que Sarney derrotou Tião Viana (PT-AC).
E uma chapa única, de consenso, com um nome "ético" ou inofensivo aos olhos do governo e da oposição? Seria difícil encontrar, mas há alguns poucos senadores a preencher esse perfil. Os tradicionalmente lembrados são o democrata Marco Maciel (PE) e os peemedebistas Pedro Simon (RS), Jarbas Vasconcellos (PE) e Garibaldi Alves (RN).
Mas, resolvidos embaraços políticos, estaria solucionada a crise do Senado? Não.
Motoristas continuariam a ganhar R$ 12 mil por mês, com direito a dublagem de mordomo. Dos R$ 2,8 bilhões de orçamento anual do Senado, cerca de R$ 2 bilhões servem para custear apenas a folha de pagamento de ativos e inativos -uma despesa insustentável perante uma opinião pública, que vai tomando conhecimento da caixa-preta do Congresso.
A maioria dos 600 atos secretos (que podem ser mais de mil) seria legalmente vista como ato jurídico perfeito. Traduzindo: dificilmente tais atos seriam revertidos na Justiça.
O atual primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes (PI), diz que não dá para saber quantos funcionários exatamente a Casa tem. Sua secretaria é uma espécie de prefeitura do Senado. Heráclito revela que, no início do ano, o Senado tinha 12 mil e que o número caiu para cerca de 11 mil. Os contratos de terceirização de funcionários, uma mina de ouro da gestão Agaciel Maia, são outra caixa-preta. Os funcionários de carreira têm penduricalhos salariais que multiplicam seus salários.
Sarney é a cara da crise, mas não a única. Uma solução de verdade custará tempo e vontade de cortar na carne de senadores, partidos e servidores.


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