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ANÁLISE
Crise no Senado continuará com ou sem Sarney
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A crise do Senado continuará
grave com José Sarney na presidência da Casa ou fora dela.
Motivos: ela se estende a outros
senadores e possui raízes podres antigas em todas as esferas
da instituição.
Sarney está na berlinda porque personifica como poucos
os vícios do Senado e da tradição patrimonialista da política
brasileira. Ele é o último grande oligarca do século 20.
Apesar do importante papel
na transição da ditadura para a
democracia em 1985, dono de
um temperamento que dissipou e não alimentou crises,
Sarney fez carreira política na
base da troca de favores, com
frequente confusão entre o público e o privado.
No entanto, senadores do
DEM, PMDB, PT e PSDB, para
ficar nos quatro principais partidos, também usaram o patrimônio público como se fosse
particular. Se Sarney permanecer enfraquecido na cadeira, esses senadores terão de responder por seus pecados. Se Sarney
sair, também.
No cenário de licença, o substituto imediato é o atual primeiro-vice-presidente do Senado, Marconi Perillo (PSDB-GO). O tucano seria candidato a
mandato-relâmpago. Tem processos na Justiça e entraria na
mira de peemedebistas humilhados. É detestado por Lula, e
a própria bancada do PSDB
acha que duraria pouco.
Na hipótese de inviabilização
de Perillo, a substituta é a segunda-vice-presidente, Serys
Slhessarenko (PT-MT). Ela faz
parte da turma com funcionário-fantasma morando no exterior e salário pago pelo Senado.
Uma licença de Sarney poderia
desencadear efeito dominó.
E se o peemedebista renunciar à presidência do Senado?
Nova eleição teria de ser feita
em cinco dias. Talvez isso forçasse à renúncia de toda a Mesa
Diretora, o que exigiria nova
eleição no mesmo prazo.
Ora, o estopim da atual crise
foi justamente a disputa entre
as alianças inusitadas de
PMDB e DEM contra PT e
PSDB. Não parece haver clima
para reeditar embate semelhante àquele em que Sarney
derrotou Tião Viana (PT-AC).
E uma chapa única, de consenso, com um nome "ético" ou
inofensivo aos olhos do governo e da oposição? Seria difícil
encontrar, mas há alguns poucos senadores a preencher esse
perfil. Os tradicionalmente
lembrados são o democrata
Marco Maciel (PE) e os peemedebistas Pedro Simon (RS),
Jarbas Vasconcellos (PE) e Garibaldi Alves (RN).
Mas, resolvidos embaraços
políticos, estaria solucionada a
crise do Senado? Não.
Motoristas continuariam a
ganhar R$ 12 mil por mês, com
direito a dublagem de mordomo. Dos R$ 2,8 bilhões de orçamento anual do Senado, cerca
de R$ 2 bilhões servem para
custear apenas a folha de pagamento de ativos e inativos
-uma despesa insustentável
perante uma opinião pública,
que vai tomando conhecimento da caixa-preta do Congresso.
A maioria dos 600 atos secretos (que podem ser mais de mil)
seria legalmente vista como ato
jurídico perfeito. Traduzindo:
dificilmente tais atos seriam
revertidos na Justiça.
O atual primeiro-secretário
do Senado, Heráclito Fortes
(PI), diz que não dá para saber
quantos funcionários exatamente a Casa tem. Sua secretaria é uma espécie de prefeitura
do Senado. Heráclito revela
que, no início do ano, o Senado
tinha 12 mil e que o número
caiu para cerca de 11 mil. Os
contratos de terceirização de
funcionários, uma mina de ouro da gestão Agaciel Maia, são
outra caixa-preta. Os funcionários de carreira têm penduricalhos salariais que multiplicam
seus salários.
Sarney é a cara da crise, mas
não a única. Uma solução de
verdade custará tempo e vontade de cortar na carne de senadores, partidos e servidores.
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