São Paulo, domingo, 02 de dezembro de 2001

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JUDICIÁRIO

Apelidado pelos rivais de PCC, grupo apóia Lazzarini contra Nigro Conceição

TJ faz eleição polarizada por movimento do "baixo clero"

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A eleição para a presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo, o TJ, que ocorre na próxima quarta-feira, pôs em evidência não apenas os dois adversários que disputam o mais alto cargo da magistratura paulista. O debate pré-eleitoral foi esquentado pela presença e atuação heterodoxa de um grupo de juízes que se autodenomina do "baixo clero".
O nome do grupo: Movimento de Renovação e Revalorização da Magistratura. Surgiu há cerca de um ano. Os adversários o chamam de PCC -alusão ao Primeiro Comando da Capital, organização criminosa com ramificações nos presídios do país. Alguns juízes chegam a adotar a expressão "fascista" para se referir ao grupo, que costuma rebater a acusação nos mesmos termos.
A tensa atuação nos bastidores do TJ à véspera da eleição serve para compensar o fato de a maioria dos magistrados não ter direito a voto. Dos 1.921 juízes estaduais, a decisão é uma prerrogativa dos 132 desembargadores -juízes mais antigos.
Formado por cerca de 35 desembargadores, o movimento vê na eleição do tribunal uma possibilidade de chegar à cúpula do Judiciário paulista. Entre os dois candidatos, Sérgio Augusto Nigro Conceição (ex-corregedor-geral) e Álvaro Lazzarini (atual vice-presidente), apóiam o último por considerá-lo mais "afinado" com as idéias do movimento.
A declaração de apoio desagradou às maiores associações paulistas de magistrados, a Apamagis (Associação Paulista de Magistrados) e a AJD (Associação Juízes para a Democracia), e desencadeou uma reação contrária à candidatura de Lazzarini, colocando o nome de Nigro Conceição em vantagem na disputa.
"Há um grupo aí de que eu não gosto e que fecha com Lazzarini. Diante desse fato, tendo mais para Nigro Conceição. Entendo que o objetivo maior do movimento seja a busca do poder, o que preocupa", diz o presidente do Conselho Executivo da AJD, Ary Casagrande. Ele ressalva que essa é uma opinião pessoal, já que a associação não apóia nenhum candidato.
Para o presidente da Apamagis, Artur Marques da Silva Filho, o movimento "deixou vazar" uma articulação política dentro do TJ, o que ele considera preocupante. "Os juízes não gostam de nenhum movimento de dominação ou de democracia imposta."

Papel apócrifo
O principal motivo da preocupação dos juízes é um documento apócrifo, que circulou recentemente no tribunal, no qual o movimento diz estar cansado da "obediência cega e servil" e conclama seus membros a disputar cargos de poder no Judiciário.
"Este movimento inicia uma nova era. Daqui a 20 anos, quando já efetivamente instalado, será lembrado e aplaudido", diz um trecho extraído da carta.
O documento, de dez páginas, é, na verdade, a transcrição de um discurso que o desembargador José Rodrigues de Carvalho Netto, um dos idealizadores do movimento, fez durante uma reunião fechada do grupo.
"Essa carta é coisa séria. Falei isso em uma reunião. Alguém gravou e transcreveu. Você deve levar em consideração que falei muitas coisas em tom de brincadeira. Por exemplo, uso expressões militares e não sou militar."

Orçamento
O movimento foi protagonista ainda de uma das questões mais importantes do Estado de São Paulo neste ano, que terminou com o desgaste interno de Lazzarini: a paralisação do Orçamento.
Descontente com o corte efetuado pelo governo paulista na verba solicitada pelo Judiciário para o exercício de 2002, o desembargador Luiz Pantaleão, que também é membro do movimento, pediu ao TJ a paralisação do Orçamento.
Na ação, ele incluiu o atual presidente do tribunal, Márcio Bonilha, como um dos responsáveis pelo corte. Sendo Bonilha uma das autoridades co-autoras, o mandado de segurança foi distribuído para o primeiro vice-presidente, Álvaro Lazzarini, como dita as normas internas do TJ.
"Sabíamos que a ação iria para ele, mas não foi proposital. O Lazzarini não sabia o que planejávamos", afirma o desembargador Carvalho Netto. "O que interessa é que, se não fosse por nós, a verba do Judiciário não teria sido aprovada [e não foi]. Foi uma vitória enorme do movimento. E o Lazzarini lutou desde o início para que isso fosse respeitado."
Após 20 dias, a proposta foi enviada ao Legislativo com a "sugestão" de que o valor solicitado pelo TJ para 2002 fosse analisado pelos deputados. O projeto final deve ser aprovado ainda neste mês.


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