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DAY AFTER
Mudança frustrada do ministério provoca desarranjo político e pressiona presidente a pensar em reabrir processo
Erosão na base induz Lula a rever reforma
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Desde o supreendente engavetamento da reforma ministerial
pensada para reorganizar politicamente o governo ao acúmulo
de erros no episódio da MP 232,
as últimas decisões do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva desgastaram ministros e vitimaram até o
"invencível" Antonio Palocci Filho (Fazenda).
José Dirceu (Casa Civil), que se
fortalecera nas articulações da reforma, acabou desautorizado
quando Lula enterrou quase todas elas. Aldo Rebelo (Coordenação Política), demitido e depois
confirmado no cargo, ficou fora
do recuo final na MP 232 e continua na mira do PT. Palocci vetou
uma medida no final da tarde de
quarta-feira e Lula o fez aceitá-la
na manhã seguinte.
Na opinião de membros da cúpula do governo, essa série de desacertos é fruto da fracassada reforma ministerial e de rompantes
de um presidente disposto a decidir cada vez mais de forma solitária. Apesar de Lula dizer que não
pretende retomar o tema reforma
ministerial, auxiliares e aliados
avaliam que, se ele não o fizer,
questões que ficaram em aberto
poderão piorar o que já está muito ruim: o controle político do governo sobre sua base de sustentação no Congresso.
Ao decidir deixar de fora do primeiro escalão o PP, recusando-se
a aceitar o ultimato do presidente
da Câmara, o pepista Severino
Cavalcanti (PE), para dar uma
pasta ao partido ou vê-lo se aliar à
oposição, Lula optou por priorizar uma aproximação com o
PMDB, partido dividido entre
oposicionistas e governistas.
Auxiliares julgam correta a
aproximação com todo o PMDB,
legenda com 87 deputados federais, dos quais cerca de 45 votam
com o governo.
No entanto, avaliam que procurar os oposicionistas e descumprir acertos com os governistas
poderá deixar o presidente com
menos apoio ainda no partido.
Motivo: o ex-presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP)
aguardava a nomeação de sua filha, Roseana Sarney (PFL-MA),
para um ministério. Assim, o governo selaria de vez a estabilidade
política no Senado, Casa na qual
tentará corrigir decisões tomadas
pela Câmara, onde a base do governo está em frangalhos.
Em conversa reservada com
Sarney e em telefonema a Roseana, Lula prometeu aos dois nomear a senadora. A outros interlocutores, porém, avalia que agora ficou difícil. E Roseana, ao saber das hesitações, diz que, se
convidada de novo, pode recusar.
Dirceu e Aldo
Dirceu, ministro que se fortaleceu nas articulações da reforma
ministerial, tarefa que Lula lhe delegou, acabou contrariado com o
desfecho do processo. Ele deu razão a Lula pela não-nomeação de
um ministro do PP após o ultimato de Severino, mas viu outros
compromissos firmados por ele
serem desconsiderados.
A situação de Dirceu é complexa. Voltou à articulação política
por chamado de Lula, fez acertos
em nome dele, viu parte deles
naufragar. O problema é que os
políticos buscam Dirceu mais do
que procuram Aldo Rebelo, que
continua bombardeado pelo PT.
O ex-presidente da Câmara João
Paulo Cunha (PT-SP), que quase
substituiu Aldo, disse na terça-feira com todas as letras que faltava
"comando" na Câmara, alfinetando o coordenador político.
Anteontem, Severino procurou
Dirceu e propôs reaproximação
com Lula. O governador Germano Rigotto (PMDB-RS) pediu
uma audiência para tratar da reforma tributária e da aproximação do governo federal com peemedebistas da ala oposicionista, à
qual dá apoio. Ou seja, mesmo dizendo que só cuida do gerenciamento do governo, a política acaba na mesa de Dirceu.
Já Aldo, que conduzia com Palocci uma estratégia de rejeição da
MP 232 e de apresentar projeto de
lei para tentar recuperar parte da
perda de arrecadação de R$ 2,5 bilhões anual prevista com os 10%
de correção da tabela do Imposto
de Renda, ficou fora das negociações para o desfecho de um episódio que foi uma das maiores derrotas de Lula em 27 meses de administração.
O ministro da Coordenação Política, junto com o novo líder do
governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), optou por obstruir a votação no Congresso para
não ceder à oposição.
Mas Lula, atendendo a sugestão
de Dirceu e do líder do governo
no Senado, Aloizio Mercadante
(PT-SP), abandonou essa estratégia e simplesmente recuou. Manteve a correção da tabela do IR e
retirou da 232 o aumento de impostos dos prestadores de serviço.
Aldo e Arlindo se desgastaram
para nada.
Até Palocci, que é considerado o
mais habilidoso político do governo e ministro acostumado a contabilizar vitórias, acabou ferido
pelo presidente Lula.
Ajuste fiscal
O ministro da Fazenda insistia
em preservar alguma compensação à perda de arrecadação com a
MP 232, num sinal de manutenção de austeridade fiscal, apesar
de não renovar o acordo com o
Fundo Monetário Internacional.
Na quarta-feira, Palocci chegou
a vetar a saída final do governo
para o imbróglio da MP 232, que
uniu setores da classe média, do
empresariado e da imprensa numa campanha contra o governo,
carimbando-o como faminto por
mais impostos.
Como a bancada do PT não
bancou a posição de Palocci, Lula
teve de ceder após um desgaste
político que durou três meses. Na
semana que vem, outro tema incômodo para Palocci entrará em
pauta: emenda constitucional que
aumenta repasse da União aos
municípios.
Se mantiver o padrão de decisões atrapalhadas e incorretas na
área política, com a base de apoio
ainda desarticulada e com ministros cujas autoridades são questionadas, o governo corre o risco
de sofrer nova derrota na Câmara
e de transmitir um sinal de descontrole político e fiscal, avaliam
ministros e auxiliares próximos
ao presidente.
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