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JANIO DE FREITAS
Horrores do caos
Na contramão: a despeito
de toda a inculpação escrita
e dita todos os dias, nenhum governo, desde que me entendo, investiu mais recursos e esforços
pessoais e administrativos na segurança pública do Rio do que os
governos Garotinho/Rosinha,
nem houve governo federal mais
diligente no uso legítimo de seus
meios policiais do que o governo
Lula.
O assassinato da freira Dorothy
Stang fez recair sobre o governo
Lula, e em particular sobre o Ministério da Justiça e a Polícia Federal, uma torrente de responsabilizações pela consumação das
ameaças à religiosa. Governo é
responsável, sim, pela segurança
e pela vida de todos. Os assassinatos na Amazônia, de religiosos
e ativistas, não se contam mais às
dezenas nem às centenas: já são
milhares, em série, em cumprimento de sentenças de morte
pronunciadas pela mais alta instância da Justiça local -os grileiros e os cortadores/exportadores de madeira nobre, os que fizeram com grandes invasões e falsas compras as maiores propriedades de terra do Brasil e, muitas, do mundo mesmo. Mas os focos de risco também não se contam mais às dezenas nem centenas, são milhares. E não cabem
só na Amazônia.
As pessoas que comandam, por
sua posição social e econômica de
influência, a condenação do aparelho estatal pelas suas omissões
e insuficiências são as mesmas
que pregam, com êxito, a contenção de gastos governamentais como prioridade absoluta do governo. O resultado na segurança
pública é que, em várias operações da Polícia Federal, ocorre a
humorística necessidade de que
os agentes operem com dinheiro
seu. Se antes já precisava de
maior quadro de pessoal, com a
vasta ampliação de suas atividades a PF está nesta situação inacreditável: sabe onde se localizam inúmeros núcleos de corrupção e contrabando, por exemplo,
mas está freada pela falta de pessoal e outros meios decorrente da
falta de verbas imposta pelo Ministério da Fazenda (onde está o
verdadeiro centro do governo
Lula).
A ocorrência de tragédias como
a de Dorothy Stang é muito proveitosa para políticos e jornalistas fazerem imagem pessoal admirável, mas não é boa medida
para a operosidade ou o relaxamento de governos na segurança
pública. São os fatores que devem
medir os governos.
O Brasil pode estar com saldo
maravilhoso nas contas da Fazenda e do Banco Central, mas,
do ponto de vista da segurança
pública e da própria vida humana, o Brasil está em estado caótico. Nem mãe de jogador de futebol está isenta da ação de criminosos mesmo que esteja dentro
de sua casa. E o que pode fazer o
governo paulista, mandar proteção policial para cada mãe de
um dos incontáveis jogadores endinheirados? A quantidade de
policiais e seus carros nas ruas do
Rio, hoje em dia, é impressionante. Mas como policiar todas as
ruas e todas as calçadas e esquinas e praças para que não haja
lugar aproveitável pelo assaltante?
O estado caótico da insegurança na sociedade tem uma de suas
raízes no próprio dispositivo da
segurança. Os quadros policiais
estão infiltrados a ponto de fazerem, muitas vezes, com que polícia seja tão temida, e pelos mesmos motivos, quanto assaltante e
seqüestrador. Uma das ações
mais notórias da Polícia Federal,
no governo Lula, desmontou em
São Paulo uma quadrilha integrada por policiais da sua cúpula
no Estado, associados a juizes. Os
inquéritos internos na PF nada
devem às suas ações externas tão
numerosas e bem sucedidas.
A chacina atribuída a policiais
em dois municípios vizinhos do
Rio e o lançamento de duas cabeças em quartel da PM, também
na Baixada, voltam a acentuar a
dúvida de saber se o problema
maior da insegurança, no Rio, está na criminalidade comum. Um
dos feitos mais positivos, nos últimos anos da ação contra o crime
na cidade, é o duro esforço de
limpeza das polícias, como jamais foi ousado antes. Nos últimos quatro a cinco anos, foram
cerca de mil expulsões completadas, sem contar os processos em
andamento na corregedoria policial e no Judiciário. Isso, apesar
do corporativismo que dificulta,
com freqüência, tanto a investigação como a condenação. A
chacina e o crime das cabeças,
por sinal, foram reações ao rigor
afinal aplicado a um batalha da
PM na Baixada.
O desespero compreensível,
aliado à sensação de impotência,
move conclusões mal fundadas, e
inculpações nem sempre justas
com o poder público. No caso do
Rio, essa tendência é agravada
por interesse de grupos políticos/
empresariais que pretendem tomar o poder, todos os poderes, na
cidade e no Estado, e por setores
do catolicismo inquieto com o
crescimento das igrejas evangélicas. São duas forças com poderosa influência em todos os tipos de
comunicação pública, já voltadas também para a desfusão dos
ex-Estados do Rio e da Guanabara. Ou seja, uma coisa é o problema da criminalidade, outra são
os variados propósitos e formas
de sua exploração.
O caos é complicado, valha o
truísmo.
Espeto de pau
Como sempre, o Rio paga. A
chacina nos municípios de Nova
Iguaçu e de Queimados foi assim
noticiada, como sempre, pelo
"The New York Times": "30 mortos em ruas do Rio". Quando comecei o velho sorriso, em homenagem à não menos velha opinião pessoal e profissional sobre
o NYT, dei com esta outra manchete de primeira: "Massacre no
Rio deixa 30 mortos". No meu
jornal, como costumam dizer os
jornalistas.
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