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JANIO DE FREITAS
Ciro e Serra
Os dois são melhores do que
estão se mostrando. Mas o
que estão mostrando é autêntico, é um lado conhecido e incontestável do temperamento de
cada um deles. Em alguns pontos desse lado, os dois são mesmo quase idênticos.
Foi como ministro da Fazenda, no governo Itamar Franco,
que Ciro Gomes começou a revelar sua personalidade fora do
Ceará. Em Brasília e nas muitas
viagens que então fez a várias
capitais, exibiu uma atitude nova em ministros da Fazenda:
não se mostrou desfrutável aos e
às jornalistas. Atitude muito positiva, mas que se fez acompanhar, com frequência, de asperezas desnecessárias diante de
perguntas tolas, que são a grande maioria. E, sobretudo, quando confrontado com algum sentido crítico.
Já àquela altura, Ciro Gomes
deixou a impressão de que também ele, como a quase totalidade dos políticos, posto ou se sentindo sob tensão torna-se susceptível de destemperos em
graus variados, mais do que à
argumentação. Numerosos momentos da sua campanha têm
confirmado e ampliado a impressão de impulsividade verbal, às vezes por franqueza, de
outras por evidente e mal colocada irritação, ao menos em relação aos momentos em que
eclode. Ciro Gomes, não há dúvida, é arrebatado e nisso, como
nos traços anteriores, identifica-se a presença do componente
autoritário.
Longe de mim afirmar que
tais características de personalidade sejam necessariamente negativas ou, se o forem, que o sejam sempre. Mas que assumem
aparência negativa em se tratando de candidato, isso está demonstrado. Tanto mais se a mídia está toda predisposta a explorar qualquer deslize. Está aí
o caso, explorado há dias e dias,
do "burro" aplicado por Ciro
Gomes a um eleitor desconhecido. É a sua versão do "neoburro" dirigido por Fernando Henrique Cardoso, indiretamente, a
Luiz Inácio Lula da Silva e repetido em relação aos críticos do
seu sempre crítico governo
-mas entre o burro e o neoburro a mídia vê grande diferença.
José Serra mostra menos o seu
temperamento. Sua sensibilidade ao que tome como crítica
-não precisa ser crítica, propriamente- está entre os casos
extremos. Mas a reação é formalmente oposta à de Ciro Gomes. José Serra reage quase em
surdina, criando um segundo
tempo para agir. Isso em nada
diminui a força da reação, dá-se
mesmo o contrário, como tantos
jornalistas têm experimentado.
Em todas as redações há sempre algum novo episódio a comentar, na relação conflituosa
de José Serra com jornalistas.
Ninguém telefona mais, todos os
dias, para dirigentes de mídia e
editores do que Serra. A crônica
lhe debita prejuízos sofridos por
profissionais sérios e créditos, estes escassos mas efetivos, para
certas carreiras.
Na relação com o exercício do
jornalismo, entre José Serra e
Ciro Gomes há total diferença
de maneiras e muita de objetivos, mas não da conflituosidade. Bem, há uma diferença adicional, esta por parte da mídia:
é a diferença de tratamento, entre a tolerância silenciosa e o rigor.
A relação de José Serra com a
mídia contém o mesmo elemento que contribuiu, e muito, para
o PSDB tornar tão difícil o seu
percurso até a indicação como
candidato. É a imagem de prepotência que José Serra projeta.
Nos ataques a Ciro Gomes, José Serra não está adaptando
uma atitude momentaneamente necessária. Mudou o estilo de
praticar o seu temperamento.
É deplorável que José Serra e
Ciro Gomes estejam exibindo o
que neles não é o melhor.
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