São Paulo, quarta-feira, 03 de novembro de 2004

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ELIO GASPARI

O PT está vivo, na periferia de São Paulo

Os comissários José Dirceu e José Genoino presidiram a primeira coça eleitoral tomada pelo PT. Perderam a maior prefeitura do país (São Paulo), o mais antigo reduto petista (Porto Alegre) e a maior vitória da militância das bandeiras vermelhas (Fortaleza). Perder vitória é coisa de craque. Dirceu e Genoino conseguiram. A nação petista precisa entender o resultado da periferia de São Paulo, onde chegou a vencer os tucanos por três votos contra um. Ou Lula e seu governo acordam ou serão moídos em 2006.
A derrota do PT nada teve a ver com estratégias eleitorais ou bases de apoio. O PT apanhou porque ficou ruim de serviço. Seu problema está na cúpula, não na base, com um presidente da República que circula de Ômega australiano à espera do Airbus europeu. Lula vive em estado de felicidade enquanto seus comissários foram capazes de acreditar que poderiam presentear o PC do B com o ducado de Fortaleza. Fizeram isso no Rio, em 1997. Destruíram o partido e produziram Anthony Garotinho, que na sua versão mais tímida chamou-se Benedita da Silva.
A caminho do seu terceiro ano de governo, Lula acredita que vai redesenhar o mapa geopolítico do mundo e que sua chegada à Presidência é um marco da história da humanidade. Acredita também que se reuniu com uma dúzia de empresários no Alvorada para um jantarzinho e convenceu-os a cacifarem a reforma do palácio. Coisa de R$ 16 milhões. Esse é o engano dos petistas que passaram a fumar charutos cubanos (Lula fuma cigarrilhas holandesas). A mesa dos empresários do Alvorada é constante, como o valor de Pi. Quem muda é o presidente. Durante a ditadura militar, uma das pessoas jurídicas sentadas à mesa do companheiro cacifou a construção do pavilhão de tiro de um quartel paulista.
Ao deslumbramento proletário somou-se uma administração de parolagem. Enquanto a diretoria do Banco Central e a ekipekonômica da Fazenda atuam em harmonia com a herança tucana e os bons ofícios da banca, a área social do governo de Lula é uma ruína. Teve três ministros da fome (José Graziano, Benedita da Silva e Patrus Ananias). Revelaram-se fracassos de estilos diversos. Dois foram os ministros da Educação e poucas lembranças permitem. O ministro da Saúde dá compostura à inutilidade. Essa equipe fracassada abriga-se no Planalto sob o guarda-chuva da marquetagem. Os ministros acreditam que são ótimos. Tudo seria um problema de marketing.
O que falta ao PT Federal é a centelha do olhar dos militantes que em eleições passadas iam felizes para rua, sacudindo bandeiras. Vê-los, uns poucos, circulando pelas ruas de São Paulo, chegava a ser comovente. São os petistas que vivem longe das "boquinhas". Gente indignada e, por isso, no início da campanha paulista, foram substituídos por assalariados. Partido rico é assim. Mal sabem os comissários que no fim da novela os partidos ricos acabam sem malas e sem votos.
Não há em Brasília hierarcas curiosos para discutir as minúcias técnicas do bilhete único de transporte. Passaram-se quase dois anos de governo e o Ministério das Cidades não conseguiu botar de pé um programa de legalização dos lotes urbanos dos brasileiros que vivem nas grandes cidades. Foi a centelha da velha militância quem fez o bilhete único, os uniformes escolares e as mochilas da garotada pobre de São Paulo. Eram pessoas que pretendiam mudar o Brasil, não suas vidas. É dessa gente a monumental vitória petista na periferia da maior cidade do país. Uma vitória que marcará a história de São Paulo por muitos e muitos anos.


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