São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2005

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LEME VERMELHO

Dirigentes mundiais de esquerda cobraram posicionamento duro do ministro sobre o governo

Quarta Internacional orienta Rossetto

Bruno Stuckert/Folha Imagem
O presidente Lula e o ministro Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário) em reunião com agricultores sobre estiagem no Sul


EDUARDO SCOLESE
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ataque do ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, contra os cortes orçamentários na pasta, nesta semana, ocorreu pouco mais de um mês após dirigentes mundiais de esquerda com os quais ele tem forte ligação terem cobrado um posicionamento duro seu sobre o governo.
No fim de janeiro, uma carta de líderes da Quarta Internacional, organização sediada em Paris que reúne movimentos de esquerda do mundo, reclamou que o ministro "tem permanecido muito discreto" diante dos "atrasos" no programa de reforma agrária.
A Democracia Socialista, corrente do PT ao qual Rossetto é filiado, é alinhada politicamente com a Quarta Internacional, de linhagem trotskista. A DS participa da indicação de líderes e integra fóruns, mas não é obrigada a se submeter a suas deliberações. A carta, em português, surgiu pela primeira vez no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, e causou polêmica na DS. Os três autores, o deputado socialista português Francisco Louçã, o francês Daniel Bensaid e o franco-brasileiro Michel Lowy são figuras respeitadas na Quarta Internacional e atuam como porta-vozes eventuais da DS.
"Diante dos obstáculos, orçamentários notadamente, teria sido possível [a Rossetto] elevar o tom para fazer a responsabilidade pelos atrasos recair sobre opções macroeconômicas e preparar dessa forma uma possível saída do governo ou, ao menos, a apresentação de balanço defensável diante dos movimentos sociais."
A repercussão foi tamanha que motivou a DS a enviar uma resposta em 24 de fevereiro: "A carta e a forma como foi utilizada para tentar impor uma orientação a uma corrente política nacional rompem com a boa tradição da colaboração amiga. Cria um ambiente absolutamente constrangedor para o debate".
Na esquerda petista, a carta está sendo vista como uma vocalização da insatisfação de integrantes da DS com a timidez de Rossetto nas críticas ao governo.
O texto dos dirigentes mundiais faz um alerta: "Parece que o MDA [Ministério do Desenvolvimento Agrário] tem permanecido muito discreto na sua expressão pública. Ele se arrisca, assim, a ser imprensado entre uma política de governo da qual quase não se demarcou e o descontentamento crescente dos movimentos agrários".
Internamente, no ministério e no Incra, os reclamos de Rossetto foram vistos em grande parte como uma satisfação à corrente petista e aos movimentos sociais. Isso porque, em 2004, a pasta enfrentou esses problemas, e o ministro preferiu não polemizar publicamente. Desta vez, o ministro tomou a iniciativa de ligar para algumas redações e rotular de "pesado" o corte de R$ 2 bilhões.
Há ainda uma notória preocupação com os rumos tomados por alguns ministros. Neste ponto, Rossetto é citado.
"A participação no governo torna-se cada vez mais problemática. (...) Sobre a participação de Miguel [Rossetto no governo] existiam, desde o início, avaliações diversas, tanto na Internacional quanto entre vocês [dirigentes da DS]." Procurado ontem, o ministro não comentou.
Um dos líderes da DS, o deputado estadual Raul Pont (RS) diz que Rossetto não acatou ordens da organização e que a posição de saída do governo é minoritária.

História
Entidade mundial esquerdista com sede em Paris (França), a Quarta Internacional foi criada em 1938 pelo líder comunista russo Leon Trotsky (1879-1940), que, em 1917, foi um dos artífices da Revolução Russa.
A organização, que teve em seus quadros o marido de Marta Suplicy, Luis Favre, defende linha revolucionária e reúne partidos e movimentos de todo o mundo.
A Quarta Internacional se considera herdeira das tradições da Primeira Internacional, fundada por Karl Marx e Friedrich Engels, da Segunda Internacional e da Internacional Comunista. Ela é adversária da Internacional Socialista. Uma parte do PT "moderado" defende a integração à última.


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