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ALIADOS EM CRISE
Para dois ministros do STF e associação de procuradores, medidas inibem apresentação de denúncias
Pacote inclui nova tentativa de "mordaça"
SILVANA DE FREITAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Além da criação da Corregedoria Geral da União, órgão encarregado de combater a corrupção, o
governo propôs um projeto de lei
que, se aprovado pelos congressistas, inibirá a iniciativa de apresentação de denúncias contra a
sua administração.
O projeto é uma mais uma tentativa de impor a chamada "mordaça" a procuradores e cidadãos,
na opinião de dois ministros do
STF (Supremo Tribunal Federal),
que falaram em caráter reservado,
e do presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Carlos Frederico.
A proposta enviada ao Congresso é polêmica porque amplia a
possibilidade de punição da pessoa que fizer denúncia infundada
e sabidamente falsa contra outra.
Esse crime já é previsto atualmente no Código Penal, que estabelece pena de dois a oito anos de
prisão. Mas essa punição está limitada à hipótese de uma pessoa
acusar outra de praticar algum
crime. Pelo projeto, a palavra crime é substituída por "fato". Assim, ninguém poderá acusar alguém de praticar "fato" se souber
que ela é inocente, sob pena de até
quatro anos de prisão.
Pelo texto proposto, é considerado crime: "Dar causa a instauração de investigação policial, de
processo judicial, instauração de
investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe fato de que
o sabe inocente".
Um dos ministros do STF ouvidos pela Folha disse que o conceito de "fato" é excessivamente amplo e o conhecimento prévio da
inocência é conceito excessivamente subjetivo.
Por essas duas razões, o ministro afirmou que a iniciativa poderá ser questionada no Supremo
por falta de razoabilidade, uma
exigência da Constituição.
De acordo com esse ministro,
essa norma representará, na prática, uma intimidação.
O outro ministro do Supremo
ouvido ontem afirmou que ainda
não havia examinado o texto do
projeto e que, em princípio, considerava a medida do governo
uma tentativa de mordaça, cujo
alvo seria o Ministério Público.
O procurador Carlos Frederico
disse que a Associação Nacional
dos Procuradores da República
pressionará parlamentares para
que eles rejeitem o projeto.
"Contradição"
A punição está prevista somente
para as pessoas que souberem
que estão fazendo denúncias infundadas contra a administração.
Para Carlos Frederico, essa norma não incentivará as pessoas de
boa-fé a apresentar denúncias de
corrupção e irregularidades.
Ele afirmou que mesmo essas
pessoas estarão sujeitas a responder processo criminal e, nessa hipótese, terão que comprovar perante a Justiça que não sabiam da
inocência de determinado agente
público quando o acusaram.
Carlos Frederico lembrou que a
maioria das denúncias contra a
administração pública surge a
partir de informações fornecidas
pelos cidadãos.
Segundo ele, a restrição à denúncia infundada deverá implicar
na prática a exigência de apresentação de provas e não de suspeitas
para início de cada investigação.
"Esse projeto é uma contradição em relação à criação da Corregedoria Geral da União. Os poderes do novo órgão serão limitados
já no seu nascimento."
O projeto de lei faz parte do pacote anunciado juntamente com a
criação do órgão, que será comandado pela subprocuradora-geral da República aposentada
Anadyr de Mendonça Rodrigues.
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