|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
Consultor de mentira
Uma conclusão está estabelecida: todos os pagadores, recebedores e demais envolvidos
com os dinheiros expelidos por
Marcos Valério são absolutamente inocentes e nenhum tem
informação alguma sobre a maluca história de corrupção que
anda por aí. Mas não anda sozinha, não. Como Lula tem dito
nos seguidos discursos populares,
a imprensa é a responsável pelas
mentiras difundidas a cada dia
aos cidadãos. E, desde que assumiu a Presidência, ninguém é
portador de mais autoridade do
que Lula para falar de mentiras,
tapeações, invencionices, logros
de que o eleitorado tem sido vítima.
Há uma semana, aqui foi dito
que a crise chegava à porta do
palácio presidencial. Os discursos
agressivos de Lula não a afastaram. O fato, positivo para Lula e
para o governo, de José Dirceu
aparecer para sua pretensa defesa, nem a intimidou. A crise ontem chegou aos pés de Lula. Por
uma ironia perversa: a ida e a
atitude de José Dirceu ao Conselho de Ética da Câmara, que
agradaram muito a Lula, é que
ensejaram o surgimento das informações que enrolaram o próprio presidente brasileiro nos fios
dos negócios telefônicos que ocorrem nos subterrâneos deste país.
Para não fugir à regra, como
disse José Dirceu, era mais uma
mentira de Roberto Jefferson. A
Portugal Telecom manteve a regra, e logo soltou uma nota mentirosa, no entanto forçada à correção por um inadvertido ex-ministro português e seu interessante esclarecimento: a Portugal Telecom recebeu, sim, um consultor
do presidente brasileiro -claro,
Marcos Valério, além de financista do oficialismo, agora embaixador privado.
O depoimento de José Dirceu
não rendeu muito mais do que o
canhonaço luso-brasileiro lançado por Roberto Jefferson. No pouco a mais, porém, ficaram duas
das tantas intervenções. Uma,
formalmente exemplar, do deputado paulista Mendes Thame,
que foi reunindo as partes constitutivas da crise até, por sua óbvia
conexão, concluir pela existência
de uma organização com tarefas
distintas, distribuídas e coordenadas como um sistema orgânico
para ilegalidades financeiras. A
outra intervenção competente foi
do deputado gaúcho Fernando
Coruja, que desenvolveu um raciocínio condutor à conclusão de
forçosa presença de parte, ou
partes, do governo no esquema
que a crise desvenda.
É impossível imaginar, de fato,
R$ 55 milhões emprestados ao PT
por amizade, a justificativa de
Marcos Valério e Delúbio Soares
ainda de pé. Mais: R$ 55 milhões
garantidos só pela palavra de Delúbio, ou Genoino, ou Dirceu?
Por isso mesmo, o que a defesa de
José Dirceu houvesse conquistado -o que se deveu sobretudo à
recusa de renúncia- ruiu, de repente. É impossível não admitir
que Roberto Jefferson seja verdadeiro ao dizer que falou do "mensalão" a José Dirceu. Falou a Ciro
Gomes, falou a Miro Teixeira, falou a Antonio Palocci, falou até a
Lula, e nenhum desses o desmentiu. Por que não falaria a Dirceu,
se era mais lógico e fácil que o fizesse?
A negação de José Dirceu à conversa é inconvincente. E chama
atenção para outro fraquejo seu,
ao atribuir, titubeante, a intensa
transferências de parlamentares
para partidos governistas, já em
2003, à simples vontade de apoio
ao governo. Ansiosos neolulistas
que vinham até lá da ponta direita. José Dirceu era, então,
coordenador da ação política do
governo no Congresso. Nem que
fosse só em homenagem à alta
função, já que não deseja homenagear a inteligência geral, devia
uma resposta menos miúda.
Paciência, que a crise ainda
tem muito fôlego. E só agora se
aproxima da fase crucial, que,
provavelmente, espera a queda
das fortíssimas resistências à investigação dos fundos de pensão
estatais.
Texto Anterior: Unidade com presidente não quebra, diz Alencar Próximo Texto: Escândalo do "mensalão"/Ligações cruzadas: Para português, Valério era "consultor de Lula" Índice
|