São Paulo, domingo, 04 de setembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ RETÓRICA DA CRISE

Presidente afirma que não sobe em palanque para "contar mentiras" e "fazer promessas"

Lula diz que, por não ser "duas caras", apanha muito

EDUARDO SCOLESE
ENVIADO ESPECIAL A ANGICOS

No momento em que enfrenta uma queda de popularidade nas pesquisas e vê o governo federal diante de sua pior crise política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem, em Angicos (RN), que sempre "apanhou" muito pelo fato de não ser um político de "duas caras". E disse à população que não esperem dele um presidente que sai de palanque em palanque contando "promessas" e "mentiras".
As declarações ocorreram em discurso de 42 minutos, diante de cerca de 3.000 alunos, jovens e adultos do Rio Grande do Norte, recém-formados pelo programa Brasil Alfabetizado (criado em 2003 pelo governo federal).
"Eu apanhei muito neste país. Apanhei muito por não querer ser um político de duas caras, aquele que chegava ao Ceará e falava ser favorável à transposição do rio São Francisco, chegava ao Rio Grande do Norte e dizia ser favorável, em Sergipe dizia não ter uma posição definida e chegava à Bahia e dizia ser contra", afirmou o presidente, em fala de improviso, arrancando aplausos dos presentes.
Mais tarde, voltou ao tema, desta vez com o gancho da construção de uma refinaria de petróleo no Nordeste. Pernambuco e Rio Grande do Norte travam um duelo nos bastidores para receber as obras. "Eu não vou chegar em cada palanque e contar uma promessa e uma mentira. Não esperem, não esperem, até porque, quando eu deixar a Presidência, vocês farão parte dos companheiros que eu vou continuar encontrando neste país afora."
Usando um boné branco do evento, o presidente demonstrou irritação com as seguidas vaias dos presentes a alguns políticos locais presentes, como os senadores Fernando Bezerra (PTB) e Garibaldi Alves (PMDB) e a governadora Wilma de Faria (PSB), que, ao discursar, disse que Lula "vai conseguir sair dessa crise como um grande vitorioso por ser um homem honesto".
Lula aproveitou o início de sua fala para demonstrar sua insatisfação com as vaias.
"Não tem nada mais desagradável para mim, como presidente da República, de vir a uma festa que não é nossa, não é de nenhum partido, não é de nenhuma religião, mas é do povo mais humilde desse país. E as autoridades que venham participar, seja do PT ou não, sejam vaiadas. É que nós precisamos aprender a distinguir quando a gente está numa manifestação política ou quando a gente está num ato como esse."
Durante o evento, Lula entregou diplomas a cerca de 20 alunos formados pelo programa de alfabetização do governo federal. Entre eles, a agricultora Maria Leonor Freitas do Nascimento, de 103 anos. Ela abraçou o presidente, cumprimentou os ministros e foi aplaudida.
No palanque, bem-humorado, Lula distribuiu autógrafos e ganhou um par de chinelos de couro de presentes.

Mudança de agenda
O presidente cancelou a visita que faria a Natal (RN), prevista para ontem, e para Belo Horizonte (MG), onde iria amanhã. Também mudou o destino do seu descanso hoje. Ao invés de viajar para São Bernardo do Campo (SP), voltou à Brasília. Não está descartada a ida do presidente ao jogo de futebol entre Brasil e Chile, válido pelas eliminatórias da Copa da Alemanha, que acontece hoje na capital federal.

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