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ANÁLISE
Os erros de Lula no Congresso
FABIANO SANTOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
UM GOVERNO NORMAL tem ao final de
seu mandato sempre
coisas boas e ruins a
mostrar. As intenções de voto
em favor da reeleição do presidente Lula revelam que boa
parte da população aprova dimensões importantes de sua
administração, mais especificamente os ligados ao desempenho da economia e ao combate dos problemas sociais.
Entre os aspectos positivos, todavia, não se pode incluir a estratégia adotada para o relacionamento com o Congresso. Os
problemas vividos com a base
aliada e o espaço conquistado
pela oposição na condução das
CPIs constituem excelente
aprendizado sobre o modo pelo
qual não deve se dar a interação
entre Executivo e Legislativo.
A separação de Poderes e o
multipartidarismo são a base
de funcionamento de nossas
instituições democráticas. Deles, surge a necessidade de se
organizar coalizões de apoio ao
presidente no Legislativo, uma
vez que são remotas as chances
de que sua legenda conquiste a
maioria no Congresso.
Esse contexto define o presidencialismo de coalizão, adotado no Brasil e em vários países
da América do Sul, onde é freqüente a conjugação de presidencialismo e fragmentação
partidária. O exame dos últimos mandatos revela pelo menos quatro condições para o
bom funcionamento do presidencialismo de coalizão:
1) A decisão de montar a coalizão e a disposição de distribuir
poder entre os partidos que desejem integrar o governo; 2) A
redução tanto quanto possível
do número de parceiros, assim
como de sua heterogeneidade;
3) A distribuição proporcional
de cargos no Executivo ao peso
que os partidos têm na base
aliada; 4) A definição de uma
agenda que seja consenso na
coalizão e a conquista dos postos-chave no Congresso tendo
em vista a sua tramitação.
O governo Lula decidiu montar
uma coalizão e distribuiu poder
aos partidos que revelaram disposição de participar do governo. Portanto, a primeira condição foi atendida.
Contudo, o mesmo não ocorreu
com relação aos demais pontos.
O número de parceiros foi extremamente alto, bem como a
sua dispersão ideológica. A distribuição de pastas ministeriais
esteve longe da proporcionalidade dos partidos no Congresso -pode-se dizer que o PT
controlou muito, restando
pouco aos demais parceiros.
Finalmente, com exceção do
primeiro ano de mandato, no
qual uma agenda de reformas
constitucionais ficou bem estabelecida, o restante do período
ficou marcado por grande indefinição quanto ao que o governo gostaria de ver aprovado.
Ademais, a oposição conseguiu
emplacar nomes pouco palatáveis para o governo em postos-chave da Câmara e do Senado,
sendo o episódio que levou à vitória de Severino Cavalcanti na
presidência da Câmara apenas
o mais ruidoso deles.
Uma outra lógica governamental adviria da decisão do presidente de não governar com
maioria, experiência comum
no presidencialismo norte-americano e em diversos países
parlamentaristas da Europa.
É preciso ter em conta que, em
alguns casos, os custos de organização de maiorias, através da
concessão de postos no Executivo, podem se tornar proibitivos. A disputa de partidos como
PTB, PL e PP pelo espólio estatal é expressão desse problema.
Entretanto, no momento em
que o Executivo decide governar com minoria, é essencial
encontrar no Congresso atores
dispostos e capacitados a negociar uma agenda para o país.
Sob esta perspectiva, a atual estrutura institucional concentra
muito poder no Executivo,
principalmente no que tange
ao poder de iniciativa legislativa, e torna o Legislativo irresponsável sob a ótica das políticas públicas de alcance geral.
A discussão em torno da reforma política está deslocada em
seu foco mais precípuo. Não se
trata de intervir nos mecanismos eleitorais, mas sim de tornar o Congresso definitivamente co-responsável, para o
bem e para mal, pela agenda governamental no Brasil.
FABIANO GUILHERME MENDES SANTOS,
cientista político, é professor doutor do Iuperj
(Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de
Janeiro). Escreveu "O Poder Legislativo no Presidencialismo de Coalizão" e, com Fátima Anastásia e Carlos Ranulfo Melo, "Governabilidade e
Representação Política na América do Sul".
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