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GRUPO DO RIO
Países da América Central resistem à proposta; vice-chanceler do México diz que questão não está em pauta
Lula voltará a defender diálogo com Cuba
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva deverá fazer hoje, dois dias
depois das eleições americanas,
um discurso defendendo a "ampliação do diálogo" dos países latino-americanos com Cuba, que
vai chamar de "nação-irmã". O
discurso será durante a sessão
inaugural da reunião do Grupo
do Rio, que foi criado em 1986 e
reúne 19 países das três Américas.
A Folha teve acesso ao texto original do discurso de Lula, que lhe
foi apresentado pela assessoria especial da Presidência e pelo Itamaraty e ainda era considerado
um rascunho. O cuidado se explica: há fortes resistências no Grupo
do Rio à aproximação com a ilha
de Fidel Castro, especialmente entre os países da América Central,
como Panamá e El Salvador.
Na última reunião de chanceleres do Grupo do Rio, realizada em
Brasília no mês de agosto, o Brasil
já tinha proposto uma demonstração política favorável à aproximação com Cuba, mas a idéia foi
rechaçada, principalmente por El
Salvador -que tem economia
dolarizada e enviou tropas para o
Iraque-, e não obteve consenso.
Mesmo países da América do Sul
lavaram as mãos por não terem
simpatia por Fidel. O Uruguai
nem sequer mantém relações diplomáticas com Cuba.
O vice-chanceler do México,
Miguel Hakim, garantiu que até
ontem, por volta das 14h, a questão de Cuba não havia entrado na
pauta das discussões técnicas que
precederam as reuniões de chanceleres e de presidentes. "Não se
falou nisso [ampliação do diálogo
com Cuba] até agora", disse Hakim, acrescentando: "E a inclusão
de Cuba no grupo nunca esteve
em discussão. Não se fala nisso".
O embaixador da Argentina,
Juan Pablo Lohlé, também disse
que Cuba não estava na agenda,
apesar das versões em contrário
da delegação brasileira. O discurso de Lula, portanto, deverá ser
em nome do Brasil, não do grupo.
A posição brasileira pró-aproximação com Cuba é não só um
gesto para agradar Fidel, velho
amigo da cúpula do PT, como
uma reafirmação da política externa "pró-ativa" e "independente" (sobretudo em relação aos
EUA) que vem sendo desenvolvida pelo chanceler Celso Amorim.
Ele chegou ontem ao Rio com
duas preocupações: a da própria
reunião do grupo e o resultado
das eleições americanas.
O principal aliado do Brasil na
disposição de fazer um aceno pró-aproximação com Cuba é o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que chegou ontem ao Brasil
com uma agenda lotada de compromissos. Além de Chávez e de
Lula, são esperados outros dez
presidentes para as reuniões de
hoje e amanhã do Grupo do Rio:
os de Argentina, México, Costa
Rica, Uruguai, Guiana, República
Dominicana, Colômbia, Chile,
Peru e Bolívia.
Haiti
No discurso, Lula também fará
um apelo para que os países do
Grupo enviem as tropas e os auxílios prometidos para o Haiti, onde
o Brasil lidera as tropas da Força
de Paz. Segundo o Itamaraty, nem
metade dos cerca de 6.000 soldados prometidos chegaram até
agora ao país, onde a tensão nas
ruas é grande e tende a aumentar.
Lula também deverá pedir
apoio político dos países, além de
cobrar o envio efetivo de milhares
de dólares prometidos há meses
por setores da iniciativa privada,
inclusive dos Estados Unidos. Em
entrevista, Celso Amorim deu o
tom do encontro: "A importância
em lastrear democracia numa justiça social". Ele disse que, entre os
temas que serão tratados, estão o
combate à fome e o Haiti.
Outros itens da agenda do encontro, que serão consolidados
numa ata, foram confirmados pelo coordenador da delegação brasileira, ministro Marcelo Vasconcelos, e pelo mexicano Hakim.
São eles: 1) fortalecimento de organismos multilaterais, como a
ONU (Organização das Nações
Unidas) e a OMC (Organização
Mundial do Comércio); 2) mecanismos de financiamento do desenvolvimento da região, transformando a CAF (Corporação
Andina de Fomento) no embrião
de uma nova agência financeira.
Segundo Hakim, a tendência é
que o documento final, a ser divulgado pelos presidentes amanhã, faça referências genéricas ao
fortalecimento da ONU, sem entrar em detalhes sobre formas e
propostas do grupo para eventual
reformulação do organismo. Esse
é um outro assunto tratado com
um certo constrangimento pelos
americanos, especialmente depois de invadirem o Iraque sem
autorização da ONU.
O Grupo do Rio foi criado há 18
anos como mecanismo para a discussão de questões políticas de interesse comum aos países latino-americanos, naquela época em fase de redemocratização (como o
próprio Brasil) e às voltas com denúncias de desrespeito aos direitos humanos. Com o tempo, as
questões econômicas foram agregadas. Foi pegando carona numa
reunião do Grupo do Rio, no governo Itamar Franco, que o então
ministro da Fazenda, Ciro Gomes, anunciou um brutal alívio
nas tarifas de importação no país.
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