São Paulo, sexta, 4 de dezembro de 1998

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JANIO DE FREITAS
Gravações privatizadas


A importância do caso que estoura agora no Rio, mais um a partir de gravações, não está no alto suborno oferecido a deputados, do qual o principal acusado é o secretário fluminense de Fazenda e filho do governador Marcello Alencar, Marco Aurélio. Inexistindo surpresas, há, porém, um grave elemento a mais sobre o que têm sido as privatizações.
A irada insistência dos dois Alencar de fazer a privatização da imensa Cedae (Companhia de Águas e Esgotos), de qualquer maneira, mesmo neste finalzinho de governo, por si só já denunciava motivação muito além da batalha política com a Assembléia Legislativa e da batalha judicial comandada pelo ex-advogado Marcello Alencar.
A privatização do Banerj deixou um rastro comprometedor, para o governo estadual e para o processo brasileiro de privatizações. O conselheiro Sérgio Quintella, do Tribunal de Contas fluminense, fez um estudo mais do que convincente sobre as impropriedades (para usar uma palavra branda) na privatização do banco.
A oferta de US$ 80 mil a US$ 100 mil por voto de deputado que contribuísse para tornar a Cedae privatizável, derrubando decisão em contrário da própria Assembléia, tem como principal originalidade o fato de que a denúncia pública partiu de um deputado do PSDB, Sérgio Cabral Filho. Contra um governador do PSDB. E um secretário do PSDB. E, dos quatro deputados que gravaram as propostas, dois são do PSDB.
Pela tese até ontem sustentada pelos peessedebistas, e exposta com toda a sem-cerimônia na Folha em artigos de Bresser Pereira e professores do governismo, nas gravações clandestinas só importa o crime de fazê-las. A partir desse crime, o revelado pelas gravações, seja qual for, não tem importância alguma. Ou serve apenas para "a imprensa montar um espetáculo".
Como têm sido pessoas coerentes, pelo menos em relação a gravações -desde a que registrou o impune tráfico palaciano de influência na bilionária concorrência do Sivam-, é justificada a expectativa em torno dos malabarismos ético-verbais que devem vir por aí. Feitas e divulgadas por peessedebistas, as gravações clandestinas têm autoria conhecida e declarada. Constituíram crime? São seus autores criminosos? As propostas de suborno registradas não merecem consideração?
O PSDB, pelo visto, privatizou para si as gravações clandestinas, contra ou a favor. Nesse caso, se um amigo ligado ao PSDB for visitá-lo, leitor, evite envolvimentos indesejados: certifique-se de que os meninos não deixaram ligado o gravador do seu aparelho de som.



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