São Paulo, sexta, 4 de dezembro de 1998

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CELSO PINTO
Quanto o PIB cairá em 99

A projeção oficial do governo e do FMI imagina uma queda de 1% do PIB no próximo ano. Para o banco americano JP Morgan, a queda pode chegar a 4,3%, mas, para o diretor do Banco Central Francisco Lopes, a economia pode ficar estável ou até crescer um pouquinho.
Quem tem razão? O crescimento em 99 vai depender de vários fatores, especialmente da trajetória das taxas de juros. Algo que está ligado ao restabelecimento da confiança externa e da implementação do ajuste fiscal.
Existe, contudo, um aspecto técnico na discussão do PIB em 99 que faz diferença e para o qual nem todos estão atentos. A mudança de metodologia na apuração do PIB faz com que a queda da economia tenda a ser mais suave do que foi em recessões passadas, como argumenta o economista Elson Aguiar Teles, do Banco Boreal.
Teles examina quatro períodos recessivos recentes. Na recessão de 81, o PIB caiu 4,27%, na de 83, caiu 2,92%, na de 90, caiu 4,35%, e na de 92, caiu 0,29%. Existe algo em comum nas quatro recessões. Quatro setores foram mais sensíveis à contração da demanda: indústria de transformação, construção civil, comércio e transportes.
Os quatro setores, principalmente a indústria de transformação, virtualmente explicam a queda do PIB. Nas duas piores recessões, 81 e 90, a indústria de transformação caiu 10%, enquanto a queda média dos quatro setores "sensíveis" foi de -8,3%.
Os quatro setores respondiam por 61% da formação do PIB em 81. Ao cair 8,4%, levaram a uma queda de 5,1% do PIB, parcialmente amenizada pelo crescimento do setor agropecuário. Em 90, com peso de 54,6%, os quatro setores caíram 8,3%, levando a uma queda de 4,5% do PIB. Ou seja, esses setores "fizeram" a recessão.
Acontece, contudo, que o peso relativo desses setores mudou, e a mudança foi acentuada por uma recente alteração metodológica no cálculo do PIB. O cálculo do peso relativo dos setores na formação do PIB usava uma base de preços fixos de 80, a partir da qual era feita uma correção anual, pela variação na quantidade produzida.
A nova metodologia, ao contrário, passou a rever as ponderações dos setores com base no valor adicionado aos preços básicos do Sistema de Contas Nacionais do ano anterior, ou, na ausência de dados, do último ano disponível.
Ao embutir, na nova metodologia, as variações de preço, além da quantidade, o cálculo do PIB ficou muito mais sensível à perda relativa da importância do setor industrial em relação ao setor de serviços. De 80 a 97, o peso da indústria passou de 47,5% do PIB para 33,3%, o setor de serviços subiu de 40,6% para 59,1%, e a agropecuária caiu de 11,9% para 7,6%.
Pela metodologia antiga, o movimento ia na mesma direção, mas de forma mais suave: a indústria, em 97, ainda pesaria 39,7%, os serviços, 46,3% e a agropecuária, 14%. Os serviços, especialmente administração pública e aluguéis (com peso de 28% no PIB), têm um crescimento constante, próximo à variação populacional.
A consequência foi que os quatro setores mais sensíveis à contração da demanda tiveram seu peso relativo reduzido de 61% para 40% na formação do PIB, de 80 a 97, enquanto outros setores mais "estáveis" aumentaram seu peso relativo.
Teles calcula que uma queda de 5% na indústria de transformação, acompanhada, linearmente, pelos outros três setores sensíveis, em 99, levaria a uma queda do PIB de 1,3%. Usando a metodologia anterior e a ponderação de 90, a queda seria de 1,9%. Com a ponderação de 80, a queda seria de 2,4%.
Uma queda de 7,5% da indústria de transformação levaria a uma queda de 2,2% do PIB em 99, e uma queda de 10% levaria a uma redução do PIB de 3,1%. Teles acha que a hipótese de redução de 5% da indústria de transformação em 99 é a mais realista, porque o setor, neste ano, já vai fechar em queda (que ele estima em 2,8%), e o próprio PIB deve ficar perto de zero (0,3% na projeção dele).
Nas duas fortes recessões anteriores, em 81 e em 90, o PIB havia crescido no ano anterior (9,1% em 80 e 3,2% em 89), ajudado pela indústria de transformação (9,1% e 2,9%). Desta vez, a base de comparação já será mais baixa.
A conclusão de Teles é que é improvável que o PIB caia de 3% a 4% em 99. Ele estima a queda em 1,3%, em linha com a estimativa oficial. Pode ser pior, mas não tão pior.




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