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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/CONEXÃO RIBEIRÃO
Proprietário de aeronave contesta explicação dada por Antonio Palocci a parlamentares de que partido teria custeado viagens
PT não pagou uso de jatinho, diz Colnaghi
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ministro da Fazenda, Antonio
Palocci, apresentou uma versão
falsa ao contar para a CPI dos Bingos que foi o PT que pagou a conta de um jatinho particular que
usou em 2003, quando já integrava o governo do presidente Lula.
Na versão de Palocci, o diretório
do PT em São Paulo bancou o
transporte dele entre Brasília e Ribeirão Preto em 23 de julho de
2003. "O PT disponibilizou um
avião particular, alugou um avião
para fazer a viagem", disse o ministro a deputados e senadores no
dia 26. A história é uma farsa. Não
houve pagamento pelo jatinho.
O dono do avião, o empresário
José Roberto Colnaghi, confirmou à Folha que não existiu pagamento do PT pelo uso do jato.
Ele só se pronunciou depois que a
Folha disse que não encontrara
notas fiscais nem recibos de pagamento pelo aluguel do jatinho na
prestação de contas dos diretórios
estadual e nacional do PT.
A versão de Palocci é particularmente inverossímil porque o jatinho do empresário nunca foi alugado nos cinco anos em que a aeronave está com ele.
Colnaghi é dono de um outro
avião, um Seneca, que teria sido
usado pelo PT para transportar
recursos recebidos de Cuba, segundo a revista "Veja" -o valor
varia de US$ 1,4 milhão a US$ 3
milhões, dependendo do interlocutor que conta a história.
As verdades do ministro
Não é a primeira vez que Palocci
cai em contradição ao tentar rebater a informação de que pegou carona no avião de Colnaghi quando já era ministro. Em 6 de novembro de 2005, quando a Folha
revelou que o ministro pegara carona duas vezes no avião do empresário, Palocci negou que houvesse viajado no jatinho.
A versão não durou 24 horas.
No dia em que circulou a reportagem, o ex-deputado federal José
Genoino confirmou à Folha que
viajara com o ministro no jatinho
de Colnaghi na condição de presidente do PT. Contou que o avião
saíra de Brasília e havia parado no
Rio para que ele embarcasse. Rumaram para Ribeirão, onde participaram da cerimônia de filiação
do prefeito da cidade, Gilberto
Maggioni, ao PT. No mesmo dia,
23 de julho de 2003, o jatinho levou Palocci de volta a Brasília.
Não era a primeira vez que Palocci voava no Citation Jet, um jatinho para seis passageiros cujo
preço varia de US$ 2,5 milhões a
US$ 3 milhões. Quando depôs à
CPI dos Bingos, em 7 de dezembro, Colnaghi confirmou que levara duas vezes Palocci no jatinho
quando ele já era ministro.
Na campanha, Palocci usou o
jato "cinco ou seis vezes", segundo o depoimento do empresário
na CPI dos Bingos. Em 1º de janeiro de 2003, quando Lula tomou
posse, a família de Palocci foi a
Brasília no jatinho de Colnaghi.
Ao aceitar a carona no jatinho,
Palocci desrespeitou, em tese, o
Código de Conduta da Alta Administração Federal. Esse código,
que vigora desde agosto de 2000,
diz o seguinte em seu artigo 7º: "A
autoridade pública não poderá
receber salário ou qualquer outra
remuneração de fonte privada em
desacordo com a lei nem receber
transporte, hospedagem ou
quaisquer favores de particulares
de forma a permitir situação que
possa gerar dúvida sobre a sua
probidade ou honorabilidade".
Palocci apresentou a mesma
versão de que o PT de São Paulo
pagara pelo jatinho à Comissão de
Ética Pública do governo. Em dezembro, o órgão aceitou as explicações sem que o ministro apresentasse um único papel para
comprovar o que afirmara.
O ministro sustentou que, ao
aceitar a aeronave "disponibilizada pelo PT", cumpriu a resolução
número sete da Comissão de Ética, que veda a autoridades o uso
de bens públicos em atividades
político-eleitorais.
O presidente da Comissão de
Ética, Fernando Neves, disse à Folha que não é atribuição do órgão
investigar se o ministro mentiu.
"A gente parte [do pressuposto
de] que o ministro está dizendo a
verdade. Não tenho como supor
que o ministro está mentindo."
A comissão foi criada por meio
de decreto presidencial em maio
de 1999. Sua função é propor normas de conduta ética para a alta
administração pública federal.
Segundo o procurador regional
eleitoral de Goiás Hélio Telho Filho, os partidos são obrigados a
declarar à Justiça Eleitoral todas
as doações estimáveis em dinheiro, como o uso de veículos cedidos por terceiros. Ao não prestar
contas dessas doações ao Tribunal Superior Eleitoral, os partidos
estão sujeitos a ter suas cotas do
Fundo Partidário suspensas.
Qualquer partido pode pedir ao
TSE que reabra as contas do PT e
verifique se houve irregularidade.
República de Ribeirão
Colnaghi, dono de uma das
maiores empresas de irrigação do
país, conheceu Palocci em 2002,
quando o petista era prefeito de
Ribeirão em segundo mandato.
Quem os apresentou foi Ralf Barquete, assessor de Palocci que teria participado da "operação Cuba", segundo Rogério Buratti, outro membro da chamada República de Ribeirão -grupo que
usava a proximidade com o ministro para alavancar negócios.
O mais extraordinário desses
negócios não foi concluído. A
venda de um banco a empresários
de Angola. Em 2002, Colnaghi,
Barquete, Buratti e Vladimir Poleto tentaram intermediar a venda
de um banco ligado ao Prosper,
do Rio, a dirigentes do Banco Regional de Keve, de Angola.
Eles usavam a amizade com o
ministro para seduzir os angolanos -diziam que graças a ela o
Banco Central agilizaria os trâmites, complexos quando se trata da
compra de um banco brasileiro
por estrangeiros. O negócio fracassou aparentemente porque os
amigos de Palocci notaram que
suas conversas eram monitoradas
pela polícia numa investigação
sobre caixa dois em Ribeirão.
Colnaghi, o mais bem-sucedido
entre esses amigos de Palocci, foi
acusado por parlamentares de ter
se beneficiado da amizade em
seus negócios. Uma de suas empresas, a Soft Micro, recebeu R$
9,4 milhões de Tocantins, por
meio de convênio com o Banco
do Brasil, pela venda de programas de computador sem licitação. O BB, subordinado à pasta de
Palocci, diz que o governo de Tocantins escolheu a empresa. Colnaghi nega ter sido beneficiado.
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