São Paulo, domingo, 05 de março de 2000


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RELIGIÃO
Diferentes versões apontam perseguição religiosa e repressão a eventual levante contra os holandeses
Motivo de matanças divide historiadores

da Agência Folha, em Natal

A ocorrência dos massacres de Cunhaú e Uruaçu é comprovada historicamente por autores portugueses e holandeses. Porém as fontes divergem quanto à motivação das chacinas.
Para aceitar o pedido de beatificação dos mártires, o Vaticano se convenceu de que a motivação dos massacres foi religiosa, no contexto de perseguição de calvinistas aos católicos na época.
Os autores portugueses registram a presença de um pastor da Igreja Reformada no episódio de Uruaçu, que teria tentado demover os moradores de suas convicções católicas, como condição para não serem mortos.
Segundo os relatos, os índios Pedro Poti e Antonio Paraopaba, chefes dos potiguares na Paraíba e no Rio Grande do Norte, tinham estudado na Holanda e retornado convertidos ao calvinismo. Paraopaba teria comandado o massacre de Uruaçu.
Olavo de Medeiros Filho, 66, considerado o maior especialista em história do Rio Grande do Norte, reconhece os componentes religiosos nos dois episódios, mas defende que as duas matanças tiveram o objetivo de impedir um eventual levante local contra os holandeses, que então estendiam seus domínios de Sergipe ao Ceará. Autor de 12 livros sobre o Brasil colonial, Medeiros conclui que os massacres foram uma consequência da insurreição pernambucana, que tinha se iniciado dias antes e poderia se irradiar.
Medeiros integrou a comissão de peritos em história que analisou a pesquisa do processo de beatificação. No parecer final, a comissão assinala: "Parece-nos também ter havido a preponderância da motivação religiosa sobre a patriótica, por ocasião dos massacres".
Individualmente, Medeiros não tem a mesma opinião. "A perseguição religiosa poderia acontecer em qualquer ocasião. A Igreja quer a canonização, por isso se fixa no ângulo religioso. Mas não foi só religioso. A fidelidade à Holanda havia sido rompida", diz.
A tese de Medeiros se baseia em relatos de autores holandeses e franceses e de autoridades flamengas da época. Um relatório apresentado ao governo da Holanda em 1647, assinado pelos três conselheiros que sucederam Maurício de Nassau, diz que os índios tapuias souberam da revolta dos portugueses em Pernambuco e, por isso, foram para o engenho Cunhaú, para impedir eventual insurreição também ali.
Sobre o episódio de Uruaçu, os conselheiros H. Hamel, Adriaen Van Bullestrate e P. Jansen Bas escrevem que o massacre ocorreu porque alguns portugueses, rendidos em um forte, quebraram acordo de paz e fugiram para se juntar a revoltosos na Paraíba.
O documento diz ainda que a segunda chacina foi também uma vingança pela morte de 30 a 40 índios em agosto de 1645.




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