São Paulo, domingo, 06 de maio de 2001

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ROMBO TRANSAMAZÔNICO
Metasa, no RN, da qual o ministro foi sócio até 1998, recebeu cerca de R$ 6,5 mi de autarquia

Empresa de Bezerra teve verba da Sudene

ARI CIPOLA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM

A empresa que foi comandada pelo ministro Fernando Bezerra (Integração Nacional) durante nove anos recebeu quase todo financiamento de R$ 6,6 milhões que pediu à Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) e ainda assim não funciona como o previsto. O ministro é o responsável pela autarquia, extinta na semana passada com a Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia) pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. A empresa é a Metasa (Metais do Seridó S.A.), no Rio Grande do Norte. Durante nove anos, ela foi presidida por Bezerra e por seu filho Hélio. A empresa hoje pertence a um ex-sócio do ministro. A Metasa conseguiu junto ao Finor R$ 6,6 milhões. Restam cerca de R$ 100 mil para que a Metasa receba tudo que requereu. Segundo auditoria feita pela Sudene na empresa, sua implantação se arrasta há 12 anos e ela só produz 6% do que foi proposto para obter financiamento do Finor (Fundo de Investimento do Nordeste). Ela gera 60 empregos, segundo o atual proprietário, Mário Porto, ex-sócio de Bezerra. Deveria gerar mais de 140, segundo o projeto original, e, na semana passada, só havia 15 funcionários em atividade, segundo a chefia da produção. "Há problemas de mercado para nosso produto. A China está dominando 75% do mercado mundial", afirmou Porto. Os Bezerra deixaram a empresa em junho de 1998, durante a campanha do ministro ao Senado. A Metasa existe desde 1986. Bezerra passou a controlá-la em 1989 e, no ano seguinte, a empresa passou a receber recursos do Finor. Bezerra saiu da presidência em dezembro de 1994, quando assumiu no lugar do senador Garibaldi Alves (PMDB), que se elegera governador do Rio Grande do Norte. Ele deixou Hélio Araújo Bezerra, seu filho, no cargo. Apesar de produzir apenas 6% das 200 toneladas por mês de ferro-tungstênio que prometia fornecer, a Sudene continuou fazendo liberações à Metasa. O minério é usado em armas e sondas de petróleo. A última liberação ocorreu em dezembro de 2000, e foi de R$ 94 mil. Bezerra é ministro desde agosto de 1999. O ministro afirmou que quando a empresa foi concebida havia mercado para o produto, já que a empresa possui a única mina em atividade no país. De acordo com Bezerra, o avô de seu ex-sócio no negócio ""ficou milionário" durante a Segunda Guerra Mundial com a exploração da mesma mina. "Não quero defender a Metasa. Mas o problema está no modelo que estamos substituindo. Há muitos atrasos nas liberações de recursos. Além disso, o ramo mineral evolui muito rapidamente", afirmou Bezerra. O relatório da Sudene faz da Metasa um paradigma de um tipo de investimento que, por falta de retorno social e econômico, o governo tentou abolir na quarta-feira passada ao extinguir a Sudene e a Sudam e criar agências de desenvolvimento para substituí-las (leia texto nesta página). Além disso, a anistia de dívidas de empresários financiados pela Sudene e pela Sudam pode beneficiar a empresa que foi de Bezerra, idealizador da medida provisória que possibilita o perdão. O ministro descarta ter havido qualquer favorecimento à Metasa. ""Jamais faria isso." A MP elaborada pelo ministério, de agosto de 2000, ajuda cerca de mil empresas -inclusive aquelas que estão sendo investigadas por fraude. A anistia pode atingir R$ 1,7 bilhão de dívidas. O presidente Fernando Henrique Cardoso assinou a MP um mês depois que a Receita Federal entregou um dossiê sobre fraudes na Sudam. No caso da Sudene, a CPI do Finor já estava em curso. O rombo na Sudam, até agora, é estimado em R$ 1,8 bilhão, e o da Sudene, em R$ 2,2 bilhões -o ministério contesta esses dados. O Finor e o Finam tinham como objetivo ajudar empresários a se instalar no Nordeste e na Amazônia, respectivamente. Em operação desde 1974, eles estão estruturados como fundos mútuos de ações (frações de uma empresa que asseguram renda variável e tornam o possuidor "dono" de parte da companhia) e debêntures (títulos de empresas que asseguram renda fixa e tornam o possuidor um credor da companhia). A MP permite que os empresários convertam em ações as debêntures não conversíveis, que representam 25% dos recursos investidos pelos fundos nas empresas. No caso da Metasa, o eventual beneficiário pode ser o ex-sócio de Bezerra, Mário Porto. Desde 1991, os empresários tinham que restituir aos fundos esses 25% em pagamentos em dinheiro e em parcelas semestrais. A MP permitiu que essa dívida fosse convertida em ações. Como as ações dos dois fundos têm deságio médio de 96%, os empresários só terão que pagar, na prática, 4% de suas dívidas. O perdão da empresa pode ser de 96% do R$ 1,6 milhão que ela teria de emitir em debêntures quando o projeto fosse concluído. "A adoção da medida foi muito estudada pelo governo. Como a âncora do Plano Real era uma elevada taxa de juros, as empresas incentivadas ficaram com passivos (dívidas) muito altos. Foi uma renegociação semelhante à feita com os agricultores", diz Bezerra.


Colaborou EDUARDO SCOLESE, da Agência Folha

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