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REGIME MILITAR
Obra de Elio Gaspari cita declaração na qual o ex-presidente manifesta apoio a mortes durante a repressão
Sarney se diz "frustrado" com fitas de Geisel
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
"Foi frustrante." Assim reagiu o
presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), ao saber que o
assassinato de adversários do regime militar teve o aval do presidente Ernesto Geisel (1907-1996),
segundo revelação do livro "A Ditadura Derrotada", do jornalista
Elio Gaspari, colunista da Folha,
que chegou ontem às livrarias.
A reação de Sarney, que na época era senador pela Arena, resume
o sentimento expressado por outros protagonistas do período, como o ex-senador Jarbas Passarinho, o deputado Delfim Netto
(PP-SP) e o presidente nacional
do PT, José Genoino (SP), um dos
opositores do regime. "Estou perplexo", disse Passarinho.
Personagem do livro, Delfim
quer primeiro ler e depois comentar as passagens nas quais aparece
como manipulador do índice de
inflação ou em situações pouco lisonjeiras, como um comentário
de Mario Andreazza (ex-ministro
dos Transportes) a Geisel: "Conheço os podres do gordo".
"O livro do Elio é uma coisa séria. O que apareceu até agora na
imprensa é pouco. No que se refere a mim, li que ele retrata o conjunto de intrigas armado dentro
do staff de Geisel pelo temor que o
general tinha de que eu fosse eleito governador de São Paulo", disse Delfim, por e-mail, à Folha.
"Para mim, particularmente, foi
frustrante, porque vulnera a imagem que eu tinha do presidente
Geisel", disse Sarney. "Tanto mais
considerando a respeitabilidade
da fonte e a objetividade com que
o fato é narrado."
Passarinho diz que Geisel carregava a imagem de ser contra a tortura, desde a origem do regime.
Ele foi o encarregado pelo primeiro presidente do ciclo militar,
Castello Branco, de investigar denúncias de que presos políticos
eram torturados em Pernambuco. Depois demitiu o general Ednardo D'Ávila Melo do comando
do Exército em São Paulo, onde
presos foram mortos sob tortura.
Ministro do Trabalho do antecessor de Geisel, o general Emílio
Garrastazu Médici, cujo governo
era mais identificado com a eliminação dos opositores do regime,
Passarinho não resiste a uma ironia: "O [José] Genoino foi preso e
saiu vivo no governo Médici".
"O que está aí é a documentação
do que se sabia na época, do que
se sabia oficiosamente", afirmou
Genoino. O presidente do PT estava preso em fevereiro de 1974
-época da gravação em que Geisel demonstra admitir a morte de
opositores durante a repressão
militar- por ter participado da
guerrilha do Araguaia, movimento armado desencadeado pelo PC
do B no início dos anos 70, na selva amazônica. "É uma questão
histórica, e o povo vai tomando
conhecimento do passado sem
medo, sem idolatria e sem preconceito", afirmou Genoino, que
foi solto em abril de 1977.
Aldo Rebelo (PC do B-SP), líder
do governo na Câmara, disse que
"o episódio é uma mancha na história do Brasil".
O livro é o terceiro da série "As
Ilusões Armadas", que trata do ciclo militar (1964-1985) e foca a
abordagem nas trajetórias de Geisel, quarto dos cinco presidentes
do regime militar, e de Golbery do
Couto Silva (1911-1987), idealizador do extinto SNI (Serviço Nacional de Informações) e uma das
principais figuras do regime.
No livro, são utilizados trechos
de 222 horas de gravação de conversas de Geisel e assessores feitas
entre outubro de 1973 e março de
1974. Elas foram coordenadas pelo secretário particular do general,
Heitor Aquino Ferreira.
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