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HISTÓRIA
Documentos do governo norte-americano dizem que o fundador da empresa, Otto Meyer, apoiava a Alemanha
Para os EUA, Varig teria apoiado nazismo
SOLANO NASCIMENTO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Documentos do Departamento
de Estado e da Inteligência Militar
dos EUA produzidos entre 1938 e
1943 mostram que funcionários
do governo norte-americano investigaram as relações da Varig e
de seu fundador, Otto Ernst Meyer, com o nazismo.
De acordo com os relatórios,
que foram preparados em sua
maioria durante a Segunda Guerra Mundial, a empresa era controlada por alemães e selecionava
funcionários levando em conta a
ascendência germânica. Os documentos afirmam ainda que Meyer
apoiava o nazismo.
O material foi encontrado pelo
historiador gaúcho Alexandre
Fortes, que fez uma tese para o
curso de História Social do Trabalho sobre as mudanças na classe
trabalhadora de Porto Alegre causadas pelo desenvolvimento de algumas empresas, entre as quais a
Varig, e vai defendê-la no próximo dia 17 na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Os documentos estão guardados no National Archives and Records Administration (Arquivo Nacional dos Estados Unidos), em Washington.
Uma das primeiras referências à
Varig na documentação aparece
em uma carta escrita em março de
1938, antes do início da guerra,
pelo vice-cônsul norte-americano
em Porto Alegre, Guy Ray, ao embaixador dos Estados Unidos no
Brasil, Jefferson Caffery.
Na carta, que trata da importação de aviões da Alemanha, Ray
afirma que a Varig "é controlada
por alemães no que diz respeito à
confecção da agenda, escolha de
pilotos e compra de aviões".
Os primeiros aviões da Varig foram um hidroavião Dornier Wall,
seguido dos Junkers F-13, Junkers
A-50 e um Messerschmidt.
O tom dos comentários fica
mais pesado em novo relatório
preparado pelo consulado norte-americano em Porto Alegre, datado de setembro de 1939, quando a
guerra já havia começado.
O documento do consulado
transcreve um depoimento informal de um piloto da própria Varig, que teria afirmado que Meyer
era "um cidadão alemão e forte
apoiador do nazismo".
A pesquisa de Fortes mostra
que Meyer nasceu na Alemanha e
veio para o Brasil como aviador
veterano da Primeira Guerra
Mundial -tinha atuado na Luftwaffe (Força Aérea Alemã). Tentou criar uma companhia aérea
em Pernambuco, não conseguiu e
acabou fundando a Varig (Viação
Aérea Rio-grandense) em Porto
Alegre em 7 de maio de 1927.
A companhia e Meyer, segundo
Fortes, tiveram participação ativa
na Revolução de 30, apoiando o
então governador Getúlio Vargas.
Derrotado pelo governador
paulista Júlio Prestes na eleição
presidencial daquele ano, Vargas
liderou o movimento que culminou com a deposição do presidente Washington Luís, em 24 de
outubro, e sua posse na Presidência, em 3 de novembro.
O governo Vargas insistiu em
manter a neutralidade do Brasil
no início da Segunda Guerra, resistindo à pressão dos Estados
Unidos e de outros países aliados,
e esperou três anos para declarar
guerra à Alemanha.
Também em 1939, o novo vice-cônsul norte-americano em Porto
Alegre, Francis Jordan, preparou
um relatório chamado "O sistema
aeroviário Varig no Estado do Rio
Grande do Sul, Brasil".
No documento, Jordan considera um risco a combinação entre
as boas relações da Varig com políticos influentes no Brasil e suas
ligações com a Alemanha.
Restrições dos EUA
As restrições do governo norte-americano à Varig reapareceram
em 1942, quando a empresa gaúcha pediu aos Estados Unidos credenciamento para comprar
aviões norte-americanos.
O primeiro pedido, que era
apoiado inclusive pelo cônsul dos
Estados Unidos em Porto Alegre,
Daniel Braddock, foi negado pelo
Departamento de Estado.
Em sua resposta, o governo norte-americano afirmou que não seria considerada a concessão de
ajuda a qualquer companhia que
não tivesse "eliminado todos os
traços de influência alemã".
Rubem Berta, que havia assumido a direção administrativa da
Varig, fez então um novo pedido
ao Departamento de Estado norte-americano afirmando que Meyer havia se afastado da direção
da empresa e que só restava um
piloto alemão na companhia. O
pedido também está guardado no
Arquivo Nacional dos Estados
Unidos, em Washington.
Nessa mesma época, no entanto, o Escritório de Serviços Estratégicos em Washington recebeu
um relatório do Serviço de Informação tcheco-eslovaco em Nova
York reforçando as suspeitas em
relação à Varig.
O documento, escrito em francês e datado de maio de 1942, afirma que Otto Meyer esteve "envolvido em um episódio de espionagem na Bolívia e na Argentina",
sem detalhar a acusação. O relatório afirma ainda que um outro dirigente da companhia trabalhou
para o Ministério de Guerra alemão nas décadas de 20 e 30.
Ainda durante as negociações
da Varig em busca de seu credenciamento, um adido militar norte-americano no Brasil preparou
um relatório sobre a empresa afirmando que Meyer era "um bem
conhecido nazista" e dizendo que
um dos assessores que ajudou a
fundar a companhia foi preso no
Rio por ligações com o nazismo.
As negociações com os EUA
prosseguiram e, em meados de
1943, com a ajuda de políticos
brasileiros, a empresa conseguiu
finalizar o processo de compra
dos aviões norte-americanos.
Ao analisar a documentação sobre a Varig e seu fundador, o historiador Alexandre Fortes levanta
duas hipóteses principais: Meyer
teria sido uma espécie de agente
dos ideais e da política alemã ou
então seria um empreendedor individual que, por causa de seu
passado militar, aderiu de modo
apaixonado à ideologia nazista.
"A fronteira das duas imagens
se funde, e talvez nunca tenhamos
todos os elementos para ir além
das fortes sugestões", afirma.
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