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ELIO GASPARI
Lula deve ouvir Zilda Arns
Se Lula estiver preparando
uma reforma ministerial séria, poderia prestar atenção na
trombada de seu ministro da
Educação, Cristovam Buarque,
com Zilda Arns, a coordenadora
da Pastoral da Criança.
Trata-se de um caso de inépcia associada à prepotência e à
falta de respeito pela opinião
alheia. Aos fatos:
Numa entrevista à repórter
Soraya Aggege, Zilda Arns reclamou da burocracia do governo, contou que o número de pessoas alfabetizadas pela Pastoral
em 2003 caiu de 27 mil para 11
mil. Até aí, tudo bem. A desgraça veio no exemplo: "A cada
mês temos que mandar uma pequena redação escrita. Quem é
que vai analisar essas 11 mil redações, só da Pastoral, fora as
das outras entidades? É uma
coisa absolutamente inviável,
não é?".
A choldra aprendeu mais
uma. O doutor Buarque, que
pretende acabar com a universalidade do Provão, destinado a
aferir os conhecimentos dos alunos do ensino superior, universalizou o exame dos alfabetizandos. Ele diz que no ano passado o governo de Lula alfabetizou três milhões de pessoas. Se
cada uma delas fez três redações, o professor Buarque montou uma máquina que analisou
9 milhões de textos. Para aferir o
que? A sua capacidade de mandar aferir.
O ministro da Educação justificou sua posição:
"O que ela chama de burocracia a gente chama de cuidado de
fiscalização. Antigamente se falava em números de alfabetizados. Agora a gente fala em nomes no computador. A qualquer
entidade, a gente só paga depois
que tiver nome a nome. Não podemos deixar que esse programa se transforme num outro
Fundo de Amparo ao Trabalhador, que tinha fantasmas inscritos".
Pelo que disse o ministro, Lula
pode se orgulhar de presidir um
país onde se criou o Cadastro
Geral dos Analfabetos. Ainda
não se tem o Cadastro dos Bandidos Procurados pela Polícia,
mas isso pode ficar para depois.
O rigor cadastrante do professor Buarque inibe a capacidade
alfabetizante da doutora Arns,
mas Brasília faz milagres com
os cérebros humanos. Já houve
burocrata que ensinou à patuléia que os pepinos devem ser
medidos "no eixo que vai da base de inserção do pedúnculo ao
ápice do fruto".
O ministro da Educação foi
descortês ao associar, ainda que
acrobaticamente, as críticas de
Zilda Arns à vulnerabilidade
administrativa que gerou o descalabro do FAT. Uma parte do
dinheiro mandado para as centrais sindicais, coisa de algumas
centenas de milhões de reais, sumia no meio de listas fantasmas
de trabalhadores beneficiados.
Tentou-se abrir uma CPI para
investigar essa maracutaia, mas
infelizmente ela morreu pela
falta de apetite do governo de
FFHH e de interesse da bancada
petista.
A Pastoral da Criança não
tem nada a ver com o FAT.
Quem tem são as centrais sindicais, como a CUT. É a elas que o
ministro deve oferecer lições. No
seu 20º ano de vida, a Pastoral
tem 203 mil voluntários em
3.549 municípios. Ela tem muitas histórias, mas não tem crônica de roubalheiras. Quem
quer um dinheirinho fácil não
vai para a Pastoral, toma caminhos melhores.
O tipo de argumentação de
Cristovam Buarque ofende o
professor, deslustra o ministro e
maltrata a platéia. Em vez de
demonstrar que as redações
universais dos alfabetizandos
são necessárias para um programa sério (para o Provão, não),
Buarque respondeu que a medida se explica pela sua utilidade
fiscalizatória. Vai daí, sem as redações, a alfabetização vira um
FAT? Nem ele deve acreditar
nisso.
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