São Paulo, domingo, 07 de maio de 2006

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CONTAS NO CARIBE

Ex-funcionário movimentou R$ 15,5 milhões a partir de aparelho instalado na liderança do PMDB no Senado

Fax liga ex-assessor de Renan a paraíso fiscal

RUBENS VALENTE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Uma conta bancária aberta no paraíso fiscal da ilha Grand Cayman, no Caribe, que chegou a registrar R$ 11,1 milhões em depósitos, foi operada do Brasil por um aparelho de fax instalado na sala da liderança do PMDB no Senado, em Brasília, segundo papéis obtidos pela Folha.
A conta, de número 650303, é identificada pelo codinome "Pacto". Os papéis sugerem que o dinheiro foi transferido em 2003 para outra conta, de codinome "ABCDHGFE", cujo saldo de investimentos chegou a R$ 15,5 milhões em 2004.
Extratos, autorizações para compra de ações no exterior e relatórios bancários dos investimentos, num total de cem folhas, entre originais e cópias, relacionam todas as operações ao ex-assessor do Senado Francisco Sampaio de Carvalho, 64.
Coordenador do programa de modernização do Senado no biênio 95-96, ele trabalhou na liderança do PMDB quando o senador Renan Calheiros (AL) era o líder. Em 2005, foi levado por Calheiros para atuar na consultoria do então presidente do Senado.
Dos papéis, cinco foram recebidos em maio de 2005 pelo fax da Consultoria de Coordenação Técnica e Relações Institucionais da presidência do Senado, onde Carvalho trabalhava.
Em meio à apuração desta reportagem, Carvalho pediu demissão no dia 16 de março (a Folha recebera os papéis três dias antes). Alegou "motivos de ordem pessoal". Seu salário era de R$ 17 mil.
Ele negou a autoria das assinaturas nos papéis e negou ter mantido, transferido recursos ou adquirido ações no exterior.
Cópias de documentos com assinaturas atribuídas ao ex-assessor foram submetidas ao perito judicial e professor da Unicamp Ricardo Molina. Em parecer preliminar, ele concluiu: "Não há qualquer divergência significativa que permita excluir a hipótese de autenticidade das assinaturas. Ao contrário, os elementos gráficos passíveis de análise (...) apontam para uma origem comum de todas as amostras, qual seja a do punho escritor do sr. Francisco Sampaio de Carvalho".
A leitura dos papéis permite reconstituir o caminho das operações. Os funcionários do "private bank" -agência para clientes com depósitos superiores a R$ 1 milhão- do Unibanco em Belo Horizonte pediam autorização ao cliente para adquirir no exterior ações de empresas brasileiras. O pedido era enviado, para receber a assinatura de autorização, ao fax da liderança do PMDB no Senado ou à casa de Carvalho, em Brasília.
Autorizadas, as aquisições eram feitas, num primeiro momento, com recursos da conta "Pacto", aberta no UBT (Unicorp Bank & Trust Ltd.), uma subsidiária do Unibanco sediada em Grand Cayman, ilha do Caribe.
No auge das atividades da "Pacto", em 4 de abril de 2002, o banco apontou saldo de US$ 4,84 milhões em investimentos (R$ 11,1 milhões ao câmbio daquele dia).
A segunda conta bancária relacionada nos papéis a Carvalho foi aberta no mesmo banco e operada nas mesmas circunstâncias.
Os recursos da "Pacto" podem ter migrado para a segunda conta, que adquiriu ações do mesmo rol de empresas da primeira fase.
O conjunto de papéis também indica supostas contas e operações financeiras em outros bancos no exterior. Anotação em uma folha de agenda datada de 12 de janeiro de 2000 registra o número de uma conta no "Citibank-NY [Nova York]", 36013255, com recomendações para uma transferência "em favor da conta nš 650303 codinome Pacto".
Um papel do banco Excel de Nova York aponta o nome de "Sampa" para identificar uma conta cujo saldo era de US$ 117 mil no dia 29 de janeiro de 1999.
Um "aviso de confirmação de depósito" datado de julho de 1989 anota valor de US$ 158,8 mil numa conta aberta no Bank of America de Miami (EUA). O nome da conta é "Boaviagem", abaixo do qual aparece o nome de "Francisco Sampaio". O ex-assessor do Senado nasceu no município de Boa Viagem, no Ceará.


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