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REGRA DO JOGO
Financiamento de campanha gera distorções, diz secretário
Pedro Abramovay diz que modelo atual cria promiscuidade entre empresas e políticos
Secretário afirma que lobby é legítimo, mas defende que servidores sejam obrigados a divulgar com quem se reúnem para tomar decisões
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Classificando de legítima a
atividade de lobby, o secretário
de Assuntos Legislativos do
Ministério da Justiça, Pedro
Abramovay, diz que o financiamento privado de campanha
eleitoral gera uma relação "promíscua" entre candidatos e poder econômico e um "acesso
desigual" ao setor público.
Ele defende um projeto que
obrigue os servidores públicos
a divulgarem com quem se reúnem para tomar decisões. Não
acredita, porém, que seja aprovado no governo Lula.
(VC e AM)
FOLHA - Como regulamentar o
lobby no Brasil?
PEDRO ABRAMOVAY - O mais importante é a questão da transparência. É muito importante
que as pessoas saibam quem foi
recebido por quem, qual o peso,
que tipos de atores estavam envolvidos numa decisão tomada
no Executivo e no Legislativo.
FOLHA - Como regulamentar o papel dos servidores públicos?
ABRAMOVAY - Primeiro, acho o
lobby legítimo. Não podemos
fingir que ele não existe nem
proibi-lo. Seria proibir um pedaço da democracia. No caso de
servidores, temos de obrigá-los
a divulgar com quem se reuniram e quem ouviram para tomar uma determinada decisão.
FOLHA - Mas não há sempre o risco
do encontro às escondidas?
ABRAMOVAY - Tem de ter uma
punição dura. Quem não publicar que teve reunião com ator
privado, que influenciou uma
decisão, tem de ser punido. Aí
contamos com a fiscalização da
imprensa. Hoje não tem risco
nenhum, o que é grave.
FOLHA - Alguns grupos têm mais
acesso do que outros aos gabinetes
de Brasília e levam mais vantagem?
ABRAMOVAY - O acesso àqueles
que tomam decisão é absolutamente desigual -e, em geral,
desigual a partir do poder econômico. A regulamentação poderia disciplinar e dar mais
transparência e controle social
sobre o processo.
FOLHA - Lobby virou sinônimo de
tráfico de influência e corrupção no
Brasil. Como separar isso?
ABRAMOVAY - A falta de uma
cultura de transparência no
Brasil faz com que esse tipo de
suspeita ganhe muita força. E o
modelo de financiamento de
campanha que temos gera uma
relação entre as empresas, o
poder econômico e os candidatos promíscua, para dizer o mínimo. Se a gente sabe que os
candidatos vão precisar recorrer às empresas para financiar
suas campanhas, no momento
que essas empresas procurem
os candidatos é natural que se
pense que há troca de favores.
Se tivéssemos financiamento
público de campanha, isso seria
bastante aplacado. O que não
significa, e isso é importante,
que empresas, associações, movimentos sociais não tenham
de conversar com o setor público. É melhor que conversem o
máximo possível. Mas isso tem
de ser feito com todas as luzes
possíveis e com a possibilidade
do contra-argumento.
FOLHA - Há um desejo de regulamentação do lobby no Brasil ou alguns só querem ganhar um crachá?
ABRAMOVAY - Acho que uma regulamentação real do lobby enfrenta resistências. Temos uma
cultura da opacidade no Brasil.
FOLHA - Há chances de aprovar a
regulamentação no governo Lula?
ABRAMOVAY - Já é um ganho as
pessoas entenderem que é preciso regulamentar o lobby, que
ele tem de acontecer na democracia, mas tem de ser público.
Podemos eventualmente não
aprovar nessa legislatura. Só
vamos conseguir no dia em que
virar demanda da sociedade.
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