São Paulo, domingo, 07 de junho de 2009

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REGRA DO JOGO

Financiamento de campanha gera distorções, diz secretário

Pedro Abramovay diz que modelo atual cria promiscuidade entre empresas e políticos

Secretário afirma que lobby é legítimo, mas defende que servidores sejam obrigados a divulgar com quem se reúnem para tomar decisões

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Classificando de legítima a atividade de lobby, o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, diz que o financiamento privado de campanha eleitoral gera uma relação "promíscua" entre candidatos e poder econômico e um "acesso desigual" ao setor público. Ele defende um projeto que obrigue os servidores públicos a divulgarem com quem se reúnem para tomar decisões. Não acredita, porém, que seja aprovado no governo Lula. (VC e AM)

 

FOLHA - Como regulamentar o lobby no Brasil?
PEDRO ABRAMOVAY
- O mais importante é a questão da transparência. É muito importante que as pessoas saibam quem foi recebido por quem, qual o peso, que tipos de atores estavam envolvidos numa decisão tomada no Executivo e no Legislativo.

FOLHA - Como regulamentar o papel dos servidores públicos?
ABRAMOVAY
- Primeiro, acho o lobby legítimo. Não podemos fingir que ele não existe nem proibi-lo. Seria proibir um pedaço da democracia. No caso de servidores, temos de obrigá-los a divulgar com quem se reuniram e quem ouviram para tomar uma determinada decisão.

FOLHA - Mas não há sempre o risco do encontro às escondidas?
ABRAMOVAY
- Tem de ter uma punição dura. Quem não publicar que teve reunião com ator privado, que influenciou uma decisão, tem de ser punido. Aí contamos com a fiscalização da imprensa. Hoje não tem risco nenhum, o que é grave.

FOLHA - Alguns grupos têm mais acesso do que outros aos gabinetes de Brasília e levam mais vantagem?
ABRAMOVAY
- O acesso àqueles que tomam decisão é absolutamente desigual -e, em geral, desigual a partir do poder econômico. A regulamentação poderia disciplinar e dar mais transparência e controle social sobre o processo.

FOLHA - Lobby virou sinônimo de tráfico de influência e corrupção no Brasil. Como separar isso?
ABRAMOVAY
- A falta de uma cultura de transparência no Brasil faz com que esse tipo de suspeita ganhe muita força. E o modelo de financiamento de campanha que temos gera uma relação entre as empresas, o poder econômico e os candidatos promíscua, para dizer o mínimo. Se a gente sabe que os candidatos vão precisar recorrer às empresas para financiar suas campanhas, no momento que essas empresas procurem os candidatos é natural que se pense que há troca de favores.
Se tivéssemos financiamento público de campanha, isso seria bastante aplacado. O que não significa, e isso é importante, que empresas, associações, movimentos sociais não tenham de conversar com o setor público. É melhor que conversem o máximo possível. Mas isso tem de ser feito com todas as luzes possíveis e com a possibilidade do contra-argumento.

FOLHA - Há um desejo de regulamentação do lobby no Brasil ou alguns só querem ganhar um crachá?
ABRAMOVAY
- Acho que uma regulamentação real do lobby enfrenta resistências. Temos uma cultura da opacidade no Brasil.

FOLHA - Há chances de aprovar a regulamentação no governo Lula?
ABRAMOVAY
- Já é um ganho as pessoas entenderem que é preciso regulamentar o lobby, que ele tem de acontecer na democracia, mas tem de ser público. Podemos eventualmente não aprovar nessa legislatura. Só vamos conseguir no dia em que virar demanda da sociedade.


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