São Paulo, domingo, 07 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ A LISTA DE VALÉRIO

Cruzamento aponta que maiores retiradas das contas do publicitário em 2003 ocorreram em época de aprovação de reformas

Votações coincidem com dias de saques

MARCELO SALINAS
DA REDAÇÃO

O cruzamento entre os maiores saques das contas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza divulgados até agora e as principais vitórias do governo Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso revela uma coincidência que pode indicar a existência do "mensalão", o pagamento de mesada a parlamentares em troca de apoio em votações na Câmara.
A aprovação das reformas tributária e da Previdência, que interessavam diretamente ao governo, ocorreram nos meses com o maior volume de saques das contas das empresas das quais Marcos Valério é sócio em 2003.
O levantamento foi feito pela Folha com base na lista de retiradas identificadas até agora pela CPI dos Correios e na conexão partidária dos sacadores. Os dados foram cruzados com os principais fatos políticos que aconteceram no governo Lula de 14 de janeiro de 2003, dia da primeira retirada, até a data da última, em 1º de outubro de 2004.
A reforma tributária foi aprovada em dois turnos na Câmara, em 17 e 24 de setembro, por 346 a 92, 38 votos a mais do que o necessário. Nesse mês, o volume dos saques foi o maior do ano: R$ 3,8 milhões. No dia da primeira votação, João Cláudio Genu, assessor do líder do PP na Câmara, José Janene (PR), começou uma série de saques que totalizaram R$ 1 milhão em 28 dias. De 49 pepistas, só três votaram contra a reforma.
Outros saques chamam a atenção. O deputado José Borba (PMDB-PR), então vice-líder do partido na Câmara, sacou R$ 500 mil em duas parcelas: um dia antes da votação no primeiro turno e um dia depois da aprovação em segundo turno, no dia 25.
Dos 77 peemedebistas, apenas três não apoiaram o governo.
Pelo PTB, houve saques um dia depois da votação de cada turno. Jairo dos Santos, ligado ao então presidente do PTB, José Carlos Martinez, morto em outubro de 2003, sacou R$ 200 mil no dia 18, R$ 100 mil no dia 25 e R$ 300 mil no dia 29: total de R$ 600 mil.
No partido, 46 deputados de 50 presentes apoiaram a reforma.
No PL, nenhum dos deputados votou contra: os saques atribuídos a membros da legenda foram de R$ 750 mil naquele mês.
As medidas aprovadas na reforma tributária mantiveram os "pontos-chave" para o governo, que conseguiu prorrogar até 2007 a cobrança da CPMF, que rende cerca de R$ 24 bilhões por ano, e a DRU (Desvinculação das Receitas da União), mecanismo que permite ao governo aplicar com mais liberdade 20% das receitas dos principais tributos. Ambas eram tidas como impopulares, mas importantes para o ajuste fiscal.

Previdência
A votação e aprovação da reforma da Previdência, em 17 e 27 de agosto daquele ano, coincide com saques de R$ 2,58 milhões das contas de Marcos Valério.
Desse valor, R$ 2,53 milhões foram retirados pelo ex-tesoureiro do PL Jacinto Lamas. Todos os deputados do partido, que é aliado de primeira hora do governo, votaram a favor da reforma. O governo venceu por 357 votos a 123, 49 a mais do que o necessário.
A reforma previdenciária estabeleceu a contribuição de servidores inativos e pensionistas (aumento de arrecadação estimado em R$ 1 bilhão por ano) e tornou mais duras as regras para a aposentadoria do funcionalismo.
Em 2004, os maiores saques mensais foram em agosto (R$ 5.532.600) e julho (R$ 5.056.940). O período coincide com o início da campanha eleitoral e com a justificativa mais ouvida pelos beneficiados dos saques -de que o dinheiro foi usado para saldar dívidas ou gastos de campanha.


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