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JANIO DE FREITAS
Social, mas não só
A regularização dos lotes
e respectivas moradias nas
favelas, determinada por Luiz
Inácio Lula da Silva como uma
das prioridades do governo, é
mais um tema polêmico entre os
que têm implicações sociais diretas. Se alguém disser que a natureza polêmica do tema não tem importância, porque o assunto não interessa aos que devem continuar tranquilizados, não há como o contestar. Mas a
experiência com medida idêntica teve muita importância e faz
prever que sua renovação não a
terá em menor proporção.
Ao se tornar poder no Rio
-uma virada inacreditável
quando o regime militar ainda
respirava-, o brizolismo anunciou a legalização das moradias
em favelas, com o título de propriedade e dispensa de impostos. O programa não se cumpriu todo, por falta de recursos e exiguidade do mandato, mas em
certas áreas foi aplicado e até
ampliado, com uma urbanização incipiente. Os proprietários
históricos dessas áreas ocupadas
haviam deixado de pagar os impostos, e assim deram o motivo
para vê-las tomadas legalmente
pelo governo e distribuídas,
também com todas as formalidades legais, aos ocupantes criadores da favela. Em outros casos, houve mesmo desapropriação, porque foi necessária ou
para apressar a distribuição.
Um plano barato, justo, corajoso e de grande alcance social.
Ninguém podia imaginar quais
eram os seus outros alcances.
Já o anúncio da legalização de
lotes e moradias levou ao ponto
aumento do território da favela,
com muitos moradores erguendo tetos precários em áreas adjacentes para obter, depois, a propriedade de mais este chão.
A estes logo se juntaram levas
procedentes do interior do Estado e, chamados pelos parentes,
mais e mais nordestinos. O comércio de lotes em favelas da
zona sul tornou-se atividade intensa e rentável. E mais favelizadora.
Ainda não de todo favelizadora, porém. A posse legal da moradia e seu chão levou os imaginosos a criar uma nova modalidade de especulação imobiliária. Os tetos das casas, ou lajes,
passaram a ser vendidos para
neles se erguerem outras casas.
E os tetos destas tornaram-se
vendáveis para a construção de
mais um andar. Três, quatro
andares. E mesmo cinco, há até
seis. Crescimento que não cessa.
Na engenharia precária, uma
casa se encosta na outra na solidariedade arquitetônica que as
impede de descerem, todas,
morro abaixo. E vão subindo
sempre mais, no morro e umas
sobre as outras, em novos andares da especulação da imobiliária com o pobre.
O plano barato, justo, corajoso
e de grande alcance, apesar de
ser tudo isso, resultou em aumento da dimensão territorial
das favelas anteriores, em aumento do número de favelas
com novas áreas ocupadas à espera da legalização, e em aumento incontrolável da população favelada. Com todas as consequências conhecidas e nem
por isso ausentes, um dia que seja, das páginas de jornal e dos
telejornais.
Pode ser que o governo Lula e
seu Ministério das Cidades consigam inventar medidas de preventivas, contra os resultados não pretendidos pela legalização dos lotes e respectivas moradias. Ainda que o consigam, continuará faltando aplicá-las e
fiscalizar sua permanência, o
que não parece mais fácil do que
inventar medidas de fato preventivas.
Cá por mim, vizinho visual e
testemunha de uma das favelas
agigantadas pelo plano generoso, continuo supondo que a solução de justiça social para as
favelas tem que ser também de
justiça com suas cidades. E existem, porém menos apressadas e
mais atentas às realidades vividas e às atuais.
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