São Paulo, domingo, 08 de fevereiro de 2004

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BRASIL CAMARADA

Ministério da Fazenda quer tentar reverter alta taxa de insucessos de processos no Conselho de Contribuintes

Regra para débito com fisco deve endurecer

SÍLVIA MUGNATTO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Uma empresa foi autuada pela Receita Federal, mas recorre, contratando um advogado para defendê-la nas instâncias administrativas da Receita. No Conselho de Contribuintes, a segunda dessas instâncias, o mesmo advogado pode aparecer como "juiz" de uma questão semelhante.
A situação acima é possível e é um dos motivos para o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) ter criado um grupo no ministério para discutir mudanças na estrutura do Conselho de Contribuintes. O grupo tem até o final do mês para apresentar uma proposta.
Às voltas com dívidas astronômicas para cobrar -algumas já parceladas em até 8.900 séculos como mostrou a Folha no domingo passado-, o Ministério da Fazenda começou a verificar também que é alta a taxa de "insucesso" dos processos do governo no Conselho de Contribuintes.
A avaliação é do procurador-geral da Fazenda Nacional, Manoel Felipe Rêgo Brandão, que defende a proibição da participação de advogados ativos.
Em 2002, o 3º Conselho de Contribuintes (o conselho é formado por três grupos, diferenciados por tipo de imposto em julgamento) julgou 2.408 processos. Em valores, do total de autuações de R$ 665 milhões, R$ 259 milhões ou 39% dos recursos foram negados ou acatados parcialmente. No 2º Conselho, dos 2.885 recursos julgados em 2002, 48% foram aceitos ou aceitos parcialmente.

Taxa de sucesso
O presidente do conselho, o auditor-fiscal Edison Pereira Rodrigues, disse que o resultado das atividades do órgão não pode ser medido pela taxa de "sucesso" do governo. "A pior coisa para o conselho seria ele se desmoralizar perante o Judiciário", comentou.
Segundo ele, hoje o Judiciário pede os processos do conselho para que eles sirvam de base para os seus julgamentos. Se o órgão fosse desmoralizado, os juízes não o tomariam mais como base.
Sobre a questão dos advogados, Rodrigues explicou que os conselheiros que têm interesse em alguma causa são obrigados -por uma questão ética- a se declararem impedidos. Segundo ele, o contribuinte poderia recorrer à Justiça se soubesse de algum impedimento dos conselheiros.
Com oito anos de Receita Federal, o ex-secretário Everardo Maciel, disse que "teoricamente" o procurador da Fazenda Nacional está certo. "Mas mexer nisso gera uma resistência política enorme e não acho que é uma questão essencial", comentou.
A resistência se explica porque o conselho, formado por 169 membros, é composto por auditores-fiscais e conselheiros -normalmente advogados- indicados pelas confederações CNC (comércio), CNA (agricultura), CNI (indústria) e CNT (transportes). O voto de desempate é da Receita.
A Folha entrou em contato com as assessorias das quatro confederações, mas nenhuma delas se posicionou sobre o assunto até a conclusão desta edição.
Rodrigues argumenta que o trabalho no órgão não é remunerado como acontece no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). "Eu entendo que, para julgar matéria tributária, tem que ser uma pessoa especializada porque o assunto é complexo. O contribuinte também poderia contestar a participação dos fiscais, pois eles fazem parte da Receita", completou.
Já Brandão lembrou que existe uma vedação expressa pelo estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). O artigo 28 do estatuto diz que a advocacia é "incompatível" com as atividades de julgamento em "órgão de deliberação coletiva da administração pública direta ou indireta".


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