São Paulo, quarta-feira, 08 de março de 2006

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ HORA DAS CASSAÇÕES

Relator pede cassação do ex-presidente da Câmara, mas manobra de Angela Guadagnin (PT-SP) deixa a decisão para amanhã

PT adia votação de relatório contra João Paulo

FÁBIO ZANINI
CYNTHIA GARDA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Num relatório contundente de 68 páginas, o deputado Cezar Schirmer (PMDB-RS), relator do processo de cassação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP), pediu ontem a perda de mandato do deputado no Conselho de Ética. A votação do relatório ficou para a semana que vem após manobra da deputada Angela Guadagnin (PT-SP).
Líder da tropa de choque do governo no conselho, a deputada afirmara que não protelaria o processo, mas, atendendo a uma solicitação direta de João Paulo, ela pediu vista. A tendência é que o conselho aprove o parecer.
O relator lista dez fatos que incriminariam o petista e comprovariam seu envolvimento no esquema de financiamento ilícito montado pelo publicitário Marcos Valério de Souza. Os principais referem-se à relação do petista com Valério e às várias versões dadas para o saque realizado por sua mulher numa agência do Banco Rural, no valor de R$ 50 mil. Em nota divulgada à tarde, João Paulo prometeu fazer um "contra-relatório" e disse que "tudo tem e terá respostas".
Schirmer disse que João Paulo "mentiu" ao explicar o motivo do saque e que recebeu os recursos "na mais absoluta clandestinidade" e para uso próprio: "O representado colocou seu interesse à frente do interesse público".

Favorecimento
O relatório acusa o ex-presidente da Câmara de ter favorecido Valério ao conduzir um processo licitatório "eivado de irregularidades", para que uma de suas agências, a SMPB, ganhasse a conta de publicidade da Câmara dos Deputados, em 2003: "De todos os processos analisados por este conselho até agora, a materialidade dos fatos atribuídos ao representado é a mais indiscutível, incontroversa, incontestável e indubitavelmente comprovada".
Schirmer vê conflito de interesse no fato de Valério ter feito a campanha de João Paulo a presidente da Câmara no início de 2003 e, no final do mesmo ano, ter ganho a conta da Casa. Ele presenteou o petista com uma caneta Mont Blanc e sua secretária com uma viagem: "Trata-se de favores absolutamente fora dos padrões normais de relacionamento".
O peemedebista descreve a seqüência de fatos que desemboca na vitória da SMPB na licitação da Câmara, mesmo tendo ficado em último lugar em concorrência semelhante dois anos antes.
Em 3 de setembro de 2003, João Paulo abriu uma exceção em sua carregada agenda para receber Valério em café da manhã. No dia seguinte, sua mulher, Márcia, realizou o saque na agência do Rural e em 15 de setembro foi lançado o edital da concorrência. "Não é crível que tais fatos não tenham entre si conexão inexplicável e comprometedora". Para Schirmer, o contato entre João Paulo e Valério era "intenso".
O texto contorna a existência de "mensalão" e toca no assunto apenas de forma tangencial. Schirmer deixa claro que mais importantes são o caixa dois e "condutas outras" incompatíveis com o decoro parlamentar.
Um exemplo dessas condutas é a caracterização do que seria a "mentira" referente ao saque efetuado pela mulher do petista. Schirmer vê omissão deliberada por João Paulo quando disse que sua mulher havia ido à agência apenas pagar uma conta de TV.
Usando informações dos Correios, o peemedebista diz que seria impossível uma fatura emitida pela empresa TVA no dia 2 de setembro ter sido enviada a Osasco (SP) e depois de novo a Brasília em tempo de ser paga em 4 de setembro. "Uma análise acurada suscita estranheza e fragiliza o pretexto que motivaria a ida de sua portadora ao banco", diz. Segundo Schirmer, João Paulo enviou sua mulher ao banco para manter o sigilo do saque.


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