São Paulo, domingo, 09 de junho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

RUMO ÀS ELEIÇÕES

Afirmação de Soros confirma necessidade de novo rumo, diz Dirceu

Para PT, megainvestidor faz "chantagem" com o país

CLÓVIS ROSSI
EM NOVA YORK

O presidente nacional do PT, José Dirceu, rebateu ontem o que chamou de "chantagem", aludindo às declarações à Folha do megainvestidor George Soros, segundo quem o mercado financeiro imporá ao Brasil a escolha entre José Serra ou o caos.
"Aceitar essa chantagem significa acabar com o Brasil, liquidar com a soberania nacional", reagiu Dirceu, em telefonema à Folha no início da tarde de ontem.
Para o presidente do PT, as declarações de Soros "só confirmam a necessidade de o Brasil mudar de rumo e retomar uma proposta de desenvolvimento nacional", que, por extensão, reduza a dependência do capital externo.
Ele se diz muito preocupado não exatamente com as declarações de Soros, mas com o ambiente que vê criar-se no país, no sentido de que qualquer mudança seria desastrosa. "Se persistir essa idéia de que nada pode mudar, por causa da pressão dos mercados financeiros, aí sim é que o Brasil vai virar uma Argentina."
Soros havia dito à Folha que o mercado financeiro acha que Lula, se eleito, dará o calote na dívida. Por isso, desde já, começa a se prevenir para a hipótese, o que leva ao agravamento da situação financeira a tal ponto que, eleito o petista, encontrará um quadro insustentável e acabará sendo obrigado a dar mesmo o calote.
Já se Serra (PSDB), o pré-candidato do governo, for eleito, os mercados se acalmarão, acha Soros, porque não querem inviabilizar um país como o Brasil, que o financista aponta como "melhor aluno" do modelo econômico hoje hegemônico.

Coalizão
Rebate Dirceu: "Se a disjuntiva é essa, o Brasil está acabado como nação soberana". Ele diz que seu partido se dispõe a debater "de forma a mais transparente possível" como sair do que considera "chantagem". Propõe "uma nova coalizão político-empresarial", obviamente comandada pelo PT, mas que, segundo ele, teria o apoio de vastos segmentos do setor produtivo, especialmente médios e pequenos empresários.
Dirceu acha que quem se opuser a essa "nova coalizão" perderá eleitoralmente, porque será visto como pró-norte-americano (na verdade, Soros não disse que são os Estados Unidos que querem impor Serra, mas sim o mercado financeiro). A nova embaixadora norte-americana no Brasil, Donna Hrinak, já disse que seu governo não teme a vitória de Lula.
Dirceu conta que, nos contatos que o PT vem mantendo com funcionários norte-americanos, está alertando para o fato de que o Brasil seria "fator de estabilidade na América do Sul". Por isso, qualquer manobra para interferir no resultado eleitoral ou na governabilidade da próxima administração seria brincar com fogo.
Nos setores conservadores do mundo acadêmico norte-americano, pelo que a Folha ouviu em Nova York, a preocupação com uma eventual vitória de Lula é exatamente a complexa conjuntura sul-americana: a Venezuela vive à beira da combustão, a Colômbia vê agravar-se permanentemente o quadro de guerra civil, a Argentina está perto da anarquia e o resto do Mercosul também cambaleia.
Agregar a esse quadro um presidente de esquerda no maior país da região assusta o conservadorismo norte-americano. O PT, segundo Dirceu, não pretende mudar de discurso. "Não adianta ganhar a eleição dizendo coisas em que a gente não acredita. Somos um partido popular, mas também um partido responsável."


Texto Anterior: Nos EUA, convenções são liturgias coreografadas
Próximo Texto: Congresso: Novo governo terá base mais frágil
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.