São Paulo, quinta, 9 de julho de 1998

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CELSO PINTO

O mercado na retranca

A forte retração do mercado internacional de capitais pegou a Sabesp na contramão. A empresa de água e saneamento do Estado de São Paulo está autorizada a lançar US$ 300 milhões em bônus no mercado internacional, mas não consegue.
É mais um exemplo, expressivo, das dificuldades que o Brasil e outros países emergentes estão enfrentando, desde o final de maio, para levantar recursos no mercado internacional. As emissões de bônus virtualmente sumiram, com raras exceções, em geral em mercados europeus. A própria Petrobrás, mais conceituado tomador brasileiro, não conseguiu lançar US$ 250 milhões em bônus.
A Sabesp tinha uma autorização para lançar até US$ 500 milhões em bônus internacionais neste ano, explica o diretor-financeiro, Paulo Galletta. No ano passado, antes da crise de outubro, a Sabesp havia lançado, com sucesso, US$ 275 milhões em bônus com prazo de oito anos.
Depois da crise, contudo, o mercado complicou. Para facilitar a vida dos tomadores, no final do ano passado o Banco Central reduziu de três para um ano o prazo mínimo para contratação de recursos externos.
A Sabesp foi a primeira empresa a reabrir o mercado usando o prazo de um ano. Como estava muito difícil lançar bônus, a Sabesp acabou contratando um empréstimo sindicalizado de US$ 100 milhões, fechado em janeiro. Em março, a Sabesp montou outro empréstimo sindicalizado de US$ 275 milhões, também com prazo de um ano.
Em fevereiro, contudo, o BC elevou o prazo mínimo de um para dois anos. As operações de um ano só valiam se contratadas até o final de fevereiro e trazidas para o país até o final de março.
Hoje, embora a Sabesp tenha autorização para captar até US$ 300 milhões em bônus externos, não há quem queira fazer a operações pelo prazo de dois anos. Só há bancos interessados em operações de até um ano.
A Sabesp precisa do dinheiro para completar seu programa de investimentos neste ano, estimado em US$ 1 bilhão. A intenção é encerrar o governo cumprindo a meta de 100% de água tratada, já completada, 85% de coleta de esgotos (hoje está em 79%) e 60% de esgoto tratado. A meta é factível até dezembro, diz Galletta, mas precisa um equacionamento financeiro.
Na semana passada, o BC baixou a Resolução 2515 apertando mais um pouco as estatais: elas só serão autorizadas a captar recursos externos para refinanciar dívidas vincendas, melhorando o custo e o prazo. O dinheiro captado tem que ficar numa conta vinculada, com esse objetivo.
A intenção é evitar o aumento do endividamento das estatais que, pelo critério do FMI, usado pelo Brasil, engorda o déficit público. Este não seria, contudo, um obstáculo para a Sabesp, que tem uma dívida global de R$ 3,5 bilhões e usaria os US$ 300 milhões para melhorar o perfil de parte da dívida.
Não se pode dizer, também, que a Sabesp é um tomador duvidoso. A empresa passou por uma revolução nos últimos anos. Saltou de um prejuízo, em 94, para o quarto maior lucro entre as empresas brasileiras em 97, pelo critério da "Exame". Seu endividamento de R$ 3,5 bilhões é pequeno em relação ao seu patrimônio líquido de R$ 9 bilhões.
Mais do que isso, a Sabesp gera US$ 1,1 bilhão em fluxo líquido de caixa por ano. Como sua previsão de investimentos, a partir de 99, é em torno de US$ 600 milhões ao ano, durante cinco anos, existirá caixa disponível para reduzir a dívida ou investir em novos negócios. Galletta acha que a Sabesp deveria se associar, minoritariamente, a um grupo privado e disputar a privatização do setor no Brasil.
As ações da Sabesp, que chegaram a R$ 350 no pico do ano passado, hoje estão em torno de R$ 150, um tombo de 57% provocado pela saída de investidores externos. Os planos de buscar um sócio privado estratégico para 15% do capital foi reduzido para 5% do capital (ou US$ 500 milhões), em razão da retração do mercado externo.
A Sabesp vinha sendo uma história de sucesso no mercado e continua sendo um bom risco. Mesmo assim, se o mercado externo não melhorar, ou o BC voltar a autorizar emissões por um ano, a Sabesp vai ter que cortar despesas e reduzir investimentos.
PS - Saio de férias por duas semanas, espero que embalado pelo penta.




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