São Paulo, terça-feira, 09 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ PRESIDENTE NA MIRA

Deputado muda tom em palestras em São Paulo, diz que deixará de defender o presidente e que não tem medo de impeachment

Lula "não gosta de serviço", diz Jefferson

CATIA SEABRA
CONRADO CORSALETTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Falando pela primeira vez em impeachment, o deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) substituiu ontem o discurso em defesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo do "benefício da dúvida". Embora argumente que seria "irresponsabilidade" atribuir ao presidente o que não sabe se fez, Jefferson não poupou o governo e chamou Lula de "preguiçoso".
"Ladrão, não vou dizer. Mas é preguiçoso e deu o governo para o [o ex-chefe da Casa Civil, José] Dirceu", afirmou ele, resumindo sua intervenção num debate promovido pela Associação Comercial de São Paulo.
O gesto revela uma aposta do deputado. Tanto em conversas com vereadores como embalado pelo "Fora Lula", ecoado no auditório da USP (leia ao lado), Jefferson disse que Lula não resistirá se os gritos chegarem às ruas.
Horas antes, no debate, ao se perguntar se votaria novamente em Lula, Jefferson respondeu que o presidente "não gosta de serviço". "Infelizmente, o negócio dele é passear de avião", disse, arrancando risos de uma platéia de mais de 300 pessoas.
Na Câmara, à espera do segundo ato do dia, Jefferson disse que não vai mais defender Lula. A vereadores, traduziu a insinuação da tarde: para ele, o mandato do presidente está sob ameaça. "Não tenho medo de impeachment", discursou, descartando ameaças às instituições.
Além disso, disse que "tudo só explode no Parlamento" para evitar tipificação de "crime de responsabilidade", já que "ministros mandaram sacar" e "tem secretário-executivo, chefe-de-gabinete, que meteu a mão no jabá".
Ele citou quatro ministros como envolvidos. Dirceu e Luiz Gushiken (ex-secretário de Comunicação) seriam mentores. "Aquilo era inteligência de governo". Sem mencionar seus nomes, Jefferson apontou Ciro Gomes (Integração Nacional) e Gilberto Gil (Cultura) como beneficiários.
Chamando o PT de "máfia", Jefferson reiterou a acusação de que Dirceu tentara obter recursos para o PT e o PTB com a Portugal Telecom. Irônico, disse que o esquema de caixa dois é "tão ousado" que Valério não é apenas um publicitário mas "o embaixador do Brasil em Portugal".
Ainda assim, disse que não poderia acusar Lula de participação. E, para se explicar, lembrou que Dirceu pediu que credenciasse um petebista para viajar a Lisboa em busca de dinheiro, afirmando "Nós recebemos [o presidente do Banco Espírito Santo]". "Nós quem? Pensei no presidente", contou Jefferson, acrescentando que, depois, se questionou se Dirceu não se referia a ele próprio e a Marcos Valério de Souza.
"O homem que teve 52 milhões de votos tem para mim o benefício da dúvida", alegou Jefferson.
Autor das primeiras denúncias sobre o mensalão -mas, até ontem, descrevendo Lula como inocente- Jefferson lembrou uma confraternização de final de ano, quando "almoçando no Palácio da Alvorada com o presidente, de repente mete a mão na porta e senta à direita de Deus pai o tesoureiro do partido. Não é ministro, nem parlamentar, mas se senta à direita de Deus pai, porque é homem do talão de cheque".
Para ele, a presença do tesoureiro expressa o "prestígio louco" atribuído aos responsáveis pelo esquema de caixa dois.
Jefferson acusou o deputado Jorge Bittar, candidato do PT à Prefeitura do Rio em 2004, de operar com caixa dois. Afirmando que tem cópia do contrato, ele afirma que Bittar gastou R$ 3,8 milhões apenas com publicidade em 2004. Mas declarou um gasto de R$ 800 mil. Bittar diz que Jefferson é "execrável" e faz "acusações sem provas". "Ele tenta dar o abraço dos afogados. Não sei de onde tirou esses números".
Segundo a prestação de contas oficial da campanha, Bittar gastou R$ 4.104.634,90, mas arrecadou bem menos, R$ 2.282.621,62. A dívida, de R$ 1.822.013,28, foi assumida pelo PT nacional.


Texto Anterior: Base aliada ensaia "operação abafa"
Próximo Texto: Lulagate: Universitários vaiam deputado e gritam "fora, Lula"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.