São Paulo, terça-feira, 09 de agosto de 2005

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JANIO DE FREITAS

Um pouco de decência

A disposição do ministro Carlos Velloso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, de reunir uma comissão de magistrados e juristas para elaborar um anteprojeto de lei eleitoral, é a melhor resposta preliminar para a convicção geral, consolidada com as revelações de Roberto Jefferson, da necessidade premente de providências contra a impostura e as ilegalidades crescentes nas eleições brasileiras.
O próprio Carlos Velloso, contrário ao financiamento das campanhas com verba pública, já lança a proposta inicial de descontarem-se em impostos as doações de empresas e pessoas, que assim se interessariam por contribuições legalizadas e às claras. Sujeitas, mesmo, ao acompanhamento pela internet. Proposta é polêmica, mas dá partida ao debate. Importante agora, já que enfim está definida uma idéia de trabalho, é considerar a escassez de tempo: a legislação vigente proíbe alterações dos seus dispositivos nos 12 meses anteriores às eleições, período que se iniciará em outubro.
Na pior hipótese, a comissão sugerida incentivará uma discussão necessária e poderá deixar um anteprojeto pronto, para votação do Congresso e vigência na ocasião permitida. Tem ainda o mérito de deslocar a elaboração do anteprojeto para autores sem interesse pessoal ou partidário no tema, até aqui tratado, sempre, por deputados e senadores cujo destino político está pendente das normas da legislação eleitoral. Parlamentares tratam-na, pois, em causa própria.
A exigüidade de tempo não é, porém, impeditiva de algumas medidas aplicáveis já no futuro próximo. O anteprojeto não precisa ser, e provavelmente jamais poderia sê-lo, completo e perfeito. A urgência está em certas providências sem maior complicação.
O uso de dinheiro ilegal nas campanhas tem duas finalidades maiores, cuja importância varia de uma para a outra, dependendo do candidato e do cargo que aspira. São os gastos de modalidades marqueteiras de propaganda, pouco políticas e muito dominadas pelas técnicas publicitárias; e a compra de pacotes de votos controlados por cabos eleitorais. Esta última finalidade é de eliminação muito difícil, ainda mais com a proliferação das associações de moradores de áreas populares, que em sua maioria se tornaram instrumentos rendosos para candidatos pagadores e dirigentes recebedores.
Proibir -com desculpas para a palavra- a espetacularização marqueteira das campanhas equivale, no entanto, a eliminar a maior exigência de dinheiro ilegal pelos candidatos. Shows, trios elétricos e que tais? Proibidos. Comícios programados, com localização racional, passeatas, isso é campanha eleitoral.
TV, sim. Mas com uso democrático. Ou seja, idêntica para todos, como meio de propaganda. Proíbem-se os programas produzidos. Em seu lugar, o mesmo fundo neutro para todos os candidatos. E acabou-se o gasto de fortunas imensas com a produção de programas no horário eleitoral dito gratuito.
A partir das restrições à espetacularização externa e aos programas de TV produzidos, já as eleições ganhariam muito em moralização e em teor democrático. Duas medidas só. Para começar, suponho, nada mau.


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