São Paulo, sábado, 09 de novembro de 2002

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GOVERNO

Presidente, que receberá título, deve procurar acalmar empresários sobre perspectivas a respeito do governo Lula

FHC tenta tranquilizar Portugal sobre PT

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

A viagem que o presidente Fernando Henrique Cardoso inicia hoje a Portugal acabará tendo como eixo central a tentativa de tranquilizar os empresários locais que despejaram a formidável pilha de US$ 9,4 bilhões no Brasil, nos anos FHC, e estão algo inquietos com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva.
É verdade que o calmante já não é tão necessário, a julgar pelas avaliações obtidas pela Folha: há um sentimento majoritário, no empresariado português, de que Lula representa a mudança, mas não a ruptura. Essa, sim, poderia significar que o dinheiro investido durante o governo atual estaria sujeito a intempéries.
FHC terá duas ocasiões de ouro para repetir aos homens de negócio portugueses o que vem dizendo aos brasileiros, desde a reta final da eleição: as instituições brasileiras são tão fortes que aventuras heterodoxas não têm lugar.
Primeiro, recebe o título, inédito para brasileiros, de "presidente honorário" da Associação da Indústria Portuguesa, a equivalente local da CNI (Confederação Nacional da Indústria) do Brasil.
No dia 12, é homenageado como "Homem do Ano Brasil-Portugal e Portugal-Brasil", título outorgado pela Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira.
A viagem a Portugal, no entanto, nada teria a ver com o empresariado. Trata-se de cumprimento da rotina de reuniões anuais de cúpula Brasil/Portugal (será a sexta "cimeira" entre os países, termo preferido pelos portugueses).
Mas o momento nas relações bilaterais é tão bom que não há muito o que discutir no plano político/institucional.
Por isso, a principal tarefa do presidente será a que ele próprio vem oferecendo a Lula desde que o petista se tornou presidente eleito: funcionar como uma espécie de avalista do novo governo junto à comunidade internacional.
O prestígio de FHC nessa arena é, em geral, superior ao que desfruta internamente. Tanto prestígio que o presidente verá que é lenda a história de que, em fim de governo, até o café é servido frio.
Portugal, ao contrário, preparou recepção calorosa, a ponto de deslocar o encontro entre FHC e o primeiro-ministro José Manuel Durão Barroso para Sintra, encantadora cidadezinha que é Patrimônio da Humanidade desde 1995, só porque o governo local ficou sabendo que o mandatário brasileiro adora Sintra.
O encontro a sós entre o presidente brasileiro e o premiê português será no Palácio da Pena, construído no século 19 pelo genro de Dom Pedro 1º, Fernando Saxe-Coburgo-Gotha. Cercado por um parque, o Palácio (hoje museu) abriga excentricidades trazidas de várias partes do planeta.
Encontros de cúpula do gênero servem, acima de tudo, para uma troca direta de pontos de vista sobre a situação internacional, a situação de cada país e as perspectivas para o futuro imediato.
O esquema será repetido na reunião FHC/Durão Barroso, mas as circunstâncias de cada um são muito diferentes. FHC está a menos de dois meses do fim de seus oito anos de governo.
O primeiro-ministro de Portugal, ao contrário, assumiu em 6 de abril, depois de sete anos de hegemonia do Partido Socialista, comandado por um amigo de FHC, António Guterres.
Guterres, como o presidente brasileiro, fez parte do grupo que começou sendo chamado de "Terceira Via" e depois mudou para "Governança Progressista".
Foi uma invenção do primeiro-ministro britânico Tony Blair para diferenciar a nova social-democracia tanto no neoliberalismo puro e duro, como da velha social-democracia, teoricamente inclinada ao estatismo. A maioria dos líderes que participaram dos três encontros do grupo já foi apeada do poder, caminho que FHC está prestes a seguir.
Por isso mesmo, tem pouco a falar sobre perspectivas para o futuro como governante com um Durão Barroso que, ainda por cima, não é social-democrata, embora pertença ao Partido Social Democrata (que, em Portugal é sinônimo de conservadorismo).


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