São Paulo, sábado, 09 de novembro de 2002

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PROGRAMAS SOCIAIS

Apenas 52% das famílias carentes constam de cadastro do governo para fins de recebimento de benefícios

Lista não contempla 18,7 milhões de pobres

RANIER BRAGON
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

Praticamente metade das famílias brasileiras consideradas pelo governo como pobres, ou seja, que não conseguem com sua renda suprir necessidades básicas como alimentação, vestuário e transporte, pode estar deixando de receber benefícios federais pelo fato de ainda não terem sido incluídas no Cadastramento Único dos Programas Sociais do Governo Federal, lista que vem sendo montada desde o ano passado.
De acordo com a última posição divulgada pela Caixa Econômica Federal -responsável por distribuir os benefícios-, apenas 52% dos 39 milhões de pessoas consideradas pobres pelo governo haviam entrado no cadastro, que tem por objetivo reunir em lista todos os atendidos por programas como o Bolsa-Escola, o Bolsa-Alimentação e o Auxílio-Gás.
Isto leva à constatação de que 18,7 milhões de pobres, ou 4,5 milhões de famílias, estão fora da lista. A secretária de Assistência Social do governo, Wanda Engel, afirma acreditar que grande parte dos que ainda não foram cadastrados deve estar recebendo benefícios federais, mas ressalta que só pode dar certeza sobre os 52%.
"Já estavam cadastrados 4,5 milhões de famílias no Bolsa-Escola, lista que está contida em parte no cadastramento único. Mas, como não batemos as duas coisas, não sabemos o grau de interseção. Certeza é para os 4,8 milhões de famílias, mas deve haver mais do que isso devido a essa lista anterior do Bolsa-Escola", disse.
Vale lembrar que o número de pobres com que trabalha atualmente o governo é menor do que o verificado em outros índices, como, por exemplo, o do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que calcula 57 milhões de pessoas pobres no país.
Os responsáveis no PT pela questão do combate à fome -ação eleita como prioritária pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva- trabalham com um número de 10 milhões de famílias pobres, o que daria algo em torno de 50 milhões de pessoas.
O cadastro único federal foi criado por meio de decreto presidencial, em 24 de julho do ano passado, estava previsto para ser concluído há dez meses, mas vem sofrendo sucessivos atrasos devido a problemas de relação entre governo federal e prefeituras, que são as responsáveis em fazer o recadastramento das famílias.
Segundo o governo, o atraso decorre de dois fatores: o período eleitoral, que criou suspeitas sobre um possível uso político da lista, e a dificuldade de obter as informações das prefeituras.
Associações de municípios ouvidas pela Agência Folha, porém, reclamam de supostas burocracia e complexidade no processo e afirmam que a demanda nas cidades é muito maior do que o número de benefícios oferecidos pelo governo. "Aqui em Piraí havia cerca de 1.000 famílias necessitadas, mas o governo só autorizou 200 benefícios", diz o prefeito da cidade fluminense, Luiz Fernando Pezão de Souza (PSB), que também é presidente da Associação de Prefeitos e dos Municípios do Rio de Janeiro.
"Toda coisa nova, até que as pessoas percebam a utilidade delas, tem sempre um período de resistência, de corpo mole. Os prefeitos estavam admitindo fazer o cadastramento das pessoas que já recebiam algum tipo de benefício, mas não queriam fazer do conjunto dos pobres, porque achavam que podiam levantar uma expectativa que poderia não ser atendida", diz Engel.
Na lista de cadastrados por Estado, o Distrito Federal e o Rio de Janeiro chamam a atenção pelo baixo número de famílias incluídas -13% dos pobres no Rio e ninguém em Brasília, o que deixa de fora 433 mil famílias nessas duas localidades. "O Distrito Federal não cadastrou um ser humano até agora. A gente já tentou tudo. O governador [Joaquim Roriz, do PMDB] ofereceu durante a campanha botijão de gás, mas as famílias pobres teriam direito ao Auxílio-Gás", diz Engel.
A secretária afirma que, no caso do Rio, os problemas estariam decorrendo devido ao atraso das prefeituras no repasse dos dados.
"Os Estados que mais avançaram são justamente os mais pobres, os do Nordeste, os da seca. Aqueles que viram a importância disso estão na frente", afirmou.
Para entrar no cadastro único, as famílias pobres têm que ser listadas pelas prefeituras, que fazem o cadastramento por meio da Caixa Econômica Federal (as informações podem ser obtidas no site do banco, o www.caixa.gov.br).


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