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OPERAÇÃO SOCIAL
Chefe do Pnud considera "imprudente" programa social que não propicie "desenvolvimento sustentável"
Fome não é problema "isolado", diz ONU
FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON
O chefe do Pnud (Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento), Mark Malloch Brown,
afirma que o Brasil não deve atacar a fome "como um problema
isolado" -referência ao Fome
Zero, que distribui R$ 50 mensais
a famílias carentes para a compra
de alimentos. "Seria imprudente
colocar todo o enfoque em uma
ação de estilo humanitário", diz.
Brown terá um encontro amanhã com o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Sua organização desenvolve programas anuais com o
país da ordem de US$ 300 milhões. Leia entrevista que ele concedeu à Folha em Washington.
Folha - Quais as expectativas em
relação ao Brasil e ao novo governo
na sua área?
Mark Malloch Brown - A ONU
sempre teve um grande programa
direcionado ao Brasil e ficamos
realmente impressionados com o
tremendo trabalho que o governo
de Fernando Henrique fez na área
social, na redução da pobreza, na
educação e no sistema de saúde.
Sabemos que o Brasil vem sendo pressionado pelas demandas
ortodoxas do mercado. Mas acreditamos que muitos dos fundamentos da economia estão no lugar, e isso é muito importante para a redução da pobreza. Esse foi
um trabalho do governo anterior,
que criou uma plataforma para
que o presidente Lula agora amplie essas conquistas.
Sabemos que é difícil controlar
a situação macroeconômica sem
minar todo o resto. Os programas
realizados na área de redução da
pobreza e educação nos anos FHC
foram significativos. A adesão de
crianças à escola primária cresceu
dramaticamente. Na nossa visão,
isso é o mais importante, pois se
trata de uma mudança estrutural.
Folha - O sr. demonstra uma
preocupação de que a maior prioridade seja a fome, em vez de programas de longo prazo. É isso?
Brown - Acreditamos profundamente que não se pode atacar a
fome como um programa isolado, como um único item em uma
economia tão sofisticada como a
brasileira. É preciso uma visão
mais ampla e diversificada dos
problemas para que se tenha geração de riquezas, saúde e educação. Esses são os programas de
longo prazo, que oferecem uma
solução sustentável para a fome.
Creio que seria imprudente colocar todo o enfoque em uma
ação contra a fome de estilo humanitário, que subestime ou dê
um papel secundário a outros
programas básicos de desenvolvimento sustentável.
Mas creio que Lula pôs o dedo
em algo importante: o fato de os
anos 90 terem envolvido demais a
América Latina no Consenso de
Washington e em seus dogmas:
reformas liberais, privatizações,
orientação para o mercado. Sentimos isso na pele, vendo governos
se afastarem da ONU e de seus
programas em direção a grandes
organismos de Washington, como o FMI. Lula deixou explícito
que a América Latina ainda tem
problemas de desenvolvimento
antigos, como a pobreza e a falta
de confiança nas instituições políticas. Ele falou para as pessoas que
não viram a sua vida melhorar
com o sistema que existe.
Folha - Politicamente, Lula vem
dizendo isso. Mas, na prática, adota a mesma cartilha do consenso e
de FHC. Faz o que pode para acalmar os mercados.
Brown - Há uma forte correlação
entre os dois. FHC frisou suas credenciais macroeconômicas. Lula
procura externar as reformas sociais. Mas ambos estão juntos no
fato de que não é possível sacrificar a ortodoxia na economia e se
atirar em direção a reformas sociais sem sustentação.
Creio que o Brasil já tenha conquistado um teto mais elevado
para suas reformas sociais. E não
acredito que, para fazê-las, tenha
de jogar fora as conquistas alcançadas. O chamado Consenso de
Washington tem diretrizes que
são boas para os negócios. Mas a
ele devem ser somadas políticas
sociais consistentes.
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