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ENTREVISTA/JOSÉ ALENCAR
Vice de Lula diz que Alckmin partiu para "apelação grosseira"
Candidato, José Alencar ameniza tom de críticas, atribui baixo crescimento a "casa desarrumada" e defende José Dirceu
JOSÉ ALENCAR , 74, outra vez candidato a vice
na chapa petista, ataca Geraldo Alckmin ao
dizer que o tucano partiu para o "desespero" e
para "apelação grosseira" ao aderir à "linha
pefelista" de críticas pessoais ao presidente Lula. Para
ele, a estratégia é "chover no molhado". Alencar diz ter
convicção de que o povo, "que vê em secreto", entendeu que Lula não estaria envolvido no mensalão e
isenta José Dirceu, contra quem "nada ficou provado".
VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE
BRASÍLIA
Escolhido candidato a vice na
última hora, depois de tentativas frustradas de Lula de atrair
PMDB ou PSB para sua chapa,
o empresário mineiro ameniza
o tom de suas críticas à política
monetária do governo.
Apesar de pedir mais "coragem" na redução dos juros, José Alencar (PRB-MG) agora
justifica que o discurso de campanha "não tomou posse" porque Lula recebeu a casa desarrumada. Mesmo assim, diz, os
juros caíram de 25% para
15,25%. "Não é brincadeira, isso foi muito."
Sobre o escândalo do mensalão, que manchou a imagem ética do PT, Alencar não só avalia
que não afetará a imagem presidencial como cutuca os tucanos, ao dizer que o caso também "afeta outros redutos partidários no Brasil".
O vice-presidente até testemunha a favor de alguns mensaleiros, como os deputados
petistas Professor Luizinho,
João Magno e João Paulo e o
petebista Romeu Queiroz. Diz
que os conhece bem e que não
cometeram crime.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
FOLHA - Se fosse definir numa frase o tema da campanha da reeleição, qual o sr. escolheria?
JOSÉ ALENCAR - Crescimento.
Estamos crescendo muito
aquém da potencialidade da
economia brasileira. Já fomos a
oitava economia do mundo. Estamos na 14ª posição. O Brasil
tem condições de se situar em
posição muito superior.
FOLHA - O primeiro mandato do
presidente Lula deixou a desejar em
termos de crescimento econômico.
Por quê?
ALENCAR - Deixou a desejar como os últimos 20 anos também
deixaram a desejar. Só que, nesse primeiro mandato, preparamos o Brasil como nunca para
crescer. Quando chegamos, o
risco Brasil era dez vezes superior ao de hoje. A taxa básica de
juros era de 25%. Hoje é de
15,25%. Nossa dívida tinha uma
parcela indexada ao dólar. Hoje, é praticamente zero. Pagamos antecipadamente ao FMI.
FOLHA - Por falar em FMI, o sr. arrancou dos petistas, na convenção
que oficializou a candidatura de Lula, o grito de "Fora daqui, o FMI".
ALENCAR - No passado, havia
uma indignação dos brasileiros, e eu me incluo entre esses
brasileiros, com a figura daqueles técnicos, que vinham ao
Brasil para ditar nossa política
econômica. Aquilo era uma
subserviência nacional.
Então, o brasileiro não queria aquilo, gritava: "Fora daqui,
o FMI". O Lula, que tem o mesmo sentimento, mandou o FMI
para casa. Só que enaltecendo a
credibilidade do Brasil no conceito internacional.
FOLHA - Durante o mandato, o sr.
foi um crítico da política monetária,
dos juros altos. Sente-se frustrado?
ALENCAR - Eles argumentam
comigo que têm o mesmo sentimento. E que, com base numa
média, a [taxa de juros] do governo passado foi muito superior à nossa. Mesmo assim,
continuam altas. Agora, a política de redução gradual está ligada a uma responsabilidade
com a economia. Acho que devemos ter um pouco mais de
coragem. É aquela história, a
frase antiga do PT: "Vamos perder o medo de ser feliz".
FOLHA - Então, no segundo mandato, tem de ter mais coragem?
ALENCAR - Não é só coragem.
Porque pode parecer sinônimo
de irresponsabilidade, e tem
que ter responsabilidade.
FOLHA - O aumento de gastos nesse ano, no governo Lula, está sendo
criticado e, para alguns analistas,
pode dificultar uma queda maior
nos juros. O que o sr. acha disso?
ALENCAR - É natural, em época
de eleição, criticar. Mas digo
que o Lula é intransigente com
essa questão, ele não abre mão
de que não podemos exacerbar
gastos. Não significa, porém,
retirar condições de sobrevida
dos pobres que estão sendo beneficiados pelo Bolsa-Família.
FOLHA - O sr. já disse que o discurso
de campanha não assumiu o poder.
O que é preciso fazer para que ele tome posse num eventual segundo
mandato?
ALENCAR - E ainda não assumiu
o poder. Por quê? Porque chegamos e a casa estava desarrumada. Hoje está arrumada. A
inflação está controlada e baixa. Mas não podemos admitir
inflação, pois não podemos admitir irresponsabilidade fiscal.
FOLHA - O sr. acha que uma reforma política é prioridade, principalmente para evitar outro mensalão?
ALENCAR - A reforma política
não tem nada a ver com o mensalão. O mensalão é uma coisa
que a história vai se incumbir
de trazer à tona, com as verdades, e por inteiro. Porque tem
muita coisa aí que não foi esclarecida e que afeta vários outros
redutos partidários no Brasil.
FOLHA - O sr. ficou decepcionado
com a revelação do escândalo do
mensalão envolvendo o PT e até o
seu ex-partido, o PL?
ALENCAR - Qualquer coisa que
acontece na vida pública que
possa ser objeto de repulsa me
deixa indignado. Porque acaba
afetando a todos os homens públicos. O cidadão comum olha
para a gente e fica na dúvida.
Passamos a ser um daqueles.
FOLHA - Foi uma decepção o festival de absolvições de deputados envolvidos no mensalão. Só três foram
cassados.
ALENCAR - Tem de ver o processo. Não posso igualar o pessoal
que recebeu dinheiro dessa história chamada mensalão. O
Congresso deve ter feito o trabalho de verificar caso a caso.
Agora, posso dizer, por
exemplo, que o [deputado petista] Professor Luizinho não
tem nada a ver com qualquer
crime. O João Paulo [PT-SP],
não acredito que pudesse fazer.
O João Magno [PT-MG] é um
rapaz sério, conheço bem. O
Romeu Queiroz [PTB-MG],
não acredito que tenha feito
nada de forma errada. Daí a razão por que foram absolvidos.
FOLHA - Falando em desvios éticos,
como o sr. analisa a queda do ministro Antonio Palocci?
ALENCAR - Foi um episódio que
não precisava ter acontecido.
Qualquer um ficaria indignado,
porque havia um rapaz, chamado Francenildo, que era caseiro, e que afirmou que o ministro Palocci ia na tal casa [do
lobby, onde se reunia a República de Ribeirão Preto]. De repente, chegou a notícia de que
havia depósitos incompatíveis
com o salário dele. Daí houve
uma infelicidade do Palocci.
Qualquer um gostaria de verificar aquilo, mas não daquela
maneira, então foi o grande erro. Se ele tivesse pedido em juízo a abertura do sigilo bancário
do cidadão que o acusava, não
teria acontecido nada disso.
FOLHA - E a queda do ex-ministro
José Dirceu?
ALENCAR - Ninguém provou nada contra ele. Tem um ditado
antigo que fala: a voz do povo é
a voz de Deus. E Deus vê em secreto. Mas o povo também vê
em secreto. Tanto que não afetou a imagem do Lula.
FOLHA - A oposição vai usar os desvios éticos do PT para bombardear o
presidente Lula na campanha...
ALENCAR - Tomara que use,
porque é chover no molhado.
Porque o Lula não tem nada a
ver com isso, eu estou perto dele. Não se mete nessas coisas.
FOLHA - Ele pode ser atacado de ter
sido omisso.
ALENCAR - Poderia se não tivesse determinado a saída dos ministros, alguns deles grandes
companheiros.
FOLHA - Como o sr. analisa a posição do PSDB e do PFL em relação ao
governo Lula?
ALENCAR - Eu sempre achei que
o melhor caminho para se disputar uma eleição é trabalhar a
favor de uma causa, não contra
alguém. Eles querem outro caminho. Provavelmente não podem defender a causa deles.
Porque, se falarem de economia, vão atirar no próprio pé.
Então, partem para a agressão
pessoal, que considero que só
vai fazer crescer, na opinião pública, a imagem do presidente.
FOLHA - O sr. acredita que, se dependesse apenas do Alckmin, o tom
da campanha seria outro?
ALENCAR - No momento em que
ele leu um discurso, numa convenção do partido em Belo Horizonte, marcou posição igual a
essa de ataque pessoal, como
um verdadeiro desespero.
FOLHA - Na visão do sr., qual foi o
momento mais crítico do governo
Lula?
ALENCAR - Nunca vi o Lula abalado. Nem no momento mais
grave das CPIs. É só fazer uma
retrospectiva. Qual o presidente que não se desgastou diante
de uma CPI? Todos. Ele não.
FOLHA - Houve um forte desgaste
no ano passado, quando o Duda
Mendonça admitiu o uso de caixa
dois nas campanhas petistas.
ALENCAR - O Lula não tem nada
a ver com caixa nenhum, não
mexe com isso.
FOLHA - O que o sr. acha que poderia ter sido melhor no governo Lula?
ALENCAR - A administração da
política monetária no que diz
respeito ao custo da dívida brasileira. Isso é alto. Não significa
que o governo se descurou disso. O governo defendia a tese de
que tem de haver uma responsabilidade para não haver um
desarranjo. Mas as taxas caíram, e caíram muito.
FOLHA - Mas não tanto quanto o sr.
queria...
ALENCAR - Não tanto quanto eu
queria. Mas caíram de 25% para 15,25%. Não é brincadeira,
foi muito. Mesmo assim ainda é
uma taxa despropositada, muito alta em relação às vigentes
no mercado internacional.
FOLHA - Depois que virou candidato, o discurso do sr. está menos inflamado contra a política monetária?
ALENCAR - Eu nunca fui crítico
ao governo. Não mudei nada.
FOLHA - Que nota o sr. daria para a
política monetária do governo Lula,
de zero a dez, então?
ALENCAR - Eu não posso dar
dez. Mas dou, tendo em vista a
responsabilidade com que foi
tratada, uma nota oito.
FOLHA - Oito! O sr. sempre foi muito crítico, não está sendo bonzinho?
ALENCAR - Quando dou oito já é
uma condenação.
FOLHA - O sr. defende alguma mudança no Banco Central num eventual segundo mandato?
ALENCAR - Tem que ampliar o
Conselho Monetário Nacional.
O Copom não, é um órgão técnico. Mas a política econômica
não é ditada pelo Copom, é ditada pelo Conselho Monetário
Nacional. Acredito que ele deveria ser composto por representações regionais e setoriais.
FOLHA - O sr. defende a autonomia
do Banco Central.
ALENCAR - O BC tem agido com
muita liberdade. Tá bom assim.
FOLHA - Como é que o sr. vai contribuir financeiramente para a campanha do presidente?
ALENCAR - Olha, eu saí das empresas, não sou mais diretor.
Mas é claro que elas terão o
maior prazer em examinar a
possibilidade de colaborar, como no passado.
FOLHA - E não se deram bem, porque até hoje o PT deve à Coteminas.
ALENCAR - Isso eu não misturo,
é uma questão empresarial.
FOLHA - Que nota o sr. dá para o
comportamento ético do governo?
ALENCAR - Acho que dou nota
dez. Acompanhei tudo, o Lula
não transigiu. Ele não acobertou nada, não permitiu que se
salvasse quem quer que fosse,
não interferiu nas investigações. Nunca houve no Brasil
tanta investigação como tem
havido no governo Lula.
FOLHA - Durante as investigações,
o presidente atacou as elites, dizendo-se vítima de preconceitos.
ALENCAR - Quando fala em preconceito, é da falsa elite. Determinadas pessoas têm uma verdadeira repulsa por aquele cidadão que pertence a uma classe menos favorecida, como no
caso dele, um líder sindical, um
torneiro mecânico que chega à
Presidência da República.
FOLHA - Mas o sr. acha correto ele
falar que é vítima de preconceito?
ALENCAR - Acho que algumas
pessoas não se conformam,
pessoas frustradas, que gostariam de estar no lugar dele.
FOLHA - O sr. acha que o ex-presidente Fernando Henrique está nessa categoria de frustrado?
ALENCAR - Não posso dizer nada
dele, porque ele várias vezes
quis que eu fosse seu ministro.
Agora, no lugar dele eu iria agir
como ex-presidente da República. E como um intelectual
responsável. Ele cresceria muito junto à sociedade brasileira.
FOLHA - Haverá mensalão num segundo mandato?
ALENCAR - Não. Isso é fora de
cogitação. É coisa do passado. E
não só para o PT, porque não foi
só o PT que entrou nisso.
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