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OPERAÇÃO ANACONDA
Em conversa telefônica gravada em abril, policial federal disse a João Carlos da Rocha Mattos que ele teria saldo de R$ 130 mil
Para PF, juiz tinha "caixa" com quadrilha
ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O juiz João Carlos da Rocha
Mattos, preso na última sexta-feira, mantinha um caixa com a quadrilha desbaratada pela Polícia
Federal na Operação Anaconda.
No dia 25 de abril de 2003, o saldo
do "caixa" era favorável ao magistrado em R$ 130 mil, de acordo
com a PF.
Naquele dia, Rocha Mattos conversou por telefone com o agente
da PF César Herman Rodriguez,
preso há duas semanas. Falaram
sobre dinheiro. O juiz reivindicava um depósito de R$ 48 mil em
sua conta bancária. Combinaram
os detalhes. Rodrigues disse a Rocha Mattos que ele estava com
"130 de caixa". Avisou que o repasse seria abatido do "seu caixa".
Em entrevista à Folha no dia 31
de outubro, quando ainda não
havia surgido a informação sobre
o caixa, Rocha Mattos justificou o
recebimento dos R$ 48 mil como
um empréstimo.
A quadrilha tinha na estrutura
do Estado a principal fonte de inspiração para a prática de delitos.
Dispunha de livre acesso a arquivos da PF. Contava com informantes em companhias telefônicas e repartições públicas. Inclusive no Deic, departamento da polícia civil de São Paulo.
Abaixo, um resumo de três casos que expõem o estilo do grupo:
1) em telefonema de 17 de janeiro de 2003, dois policiais integrantes da organização conversaram
sobre "um cara que mexe com
tráfico de dólar". Definiram-no
como "pessoa muito rica", dono
de "carros importados" e três casas no condomínio paulistano de
Alphaville. Queriam "dar uma sacudida nele e pegar cem paus".
Dizem que, se confiada a um
agente da PF "ponta firme", a extorsão pode "render mais". O doleiro, afirmam, "é mais sujo que
pau de galinheiro";
2) em 20 de setembro de 2002, o
agente federal Herman Rodriguez
tratou de um negócio que farejara
em Recife (PE). Seu interlocutor
perguntou se seria possível "tomar uma grana forte" do cliente,
dono de "muito dinheiro". Havia
levantado a ficha da vítima potencial: "Está com quase US$ 20 milhões lá fora, fruto da lavagem de
dinheiro de bingo";
3) em 23 de outubro de 2002, o
delegado aposentado Jorge Luiz
Bezerra da Silva, outro integrante
do grupo preso pela PF, conversa
sobre dificuldades que estava tendo para obter informações a respeito de determinada empresa
suíça. Seu interlocutor diz que
conseguirá "um boletim frio", para "intimar alguém da firma". Falam também sobre uma corretora
uruguaia. Ouve-se na fita do
grampo o seguinte comentário do
delegado Bezerra da Silva: "Isso é
um bom prato para a Federal. Nós
passamos para o nosso delegado
daqui de São Paulo, para botar para a frente".
Ironia
Parceiro de Herman Rodriguez
e de Bezerra da Silva, o delegado
federal José Augusto Bellini era
expansivo ao telefone. Em diálogo
de 8 de maio de 2002, o delegado
disse, em tom irônico, que estava
"fodido". Só havia faturado, naquele dia, "US$ 50 mil".
No dia seguinte, em conversa
com um subordinado, o delegado
Bellini deu-lhe uma dura pelo telefone: "Você sai, ganha uma puta
de uma grana e me liga três horas
da tarde". Cobra a sua "porcentagem". O interlocutor disse que
ainda não recebera o dinheiro.
Marca um encontro numa churrascaria.
Negócios
Os funcionários da PF falavam
de cifras incompatíveis com o
contracheque de um policial. Em
conversa de 12 de dezembro de
2002, o agente federal Herman
Rodriguez negociava a compra de
um apartamento de R$ 550 mil.
Dispunha-se a pôr no negócio
dois carros ("um Jipe NL 320 e
uma perua Mitsubishi") e dois
imóveis (um no bairro paulistano
do Morumbi e outro na praia de
Maranduba, em Ubatuba).
No dia 28 de outubro de 2002,
Herman Rodriguez conversa ao
telefone sobre outro negócio imobiliário. Dessa vez, fala de um terreno de 4.500 m2. O preço: R$ 1,5
milhão.
Seu interlocutor sugere que
compre a propriedade em parceria com um amigo. Recomenda
que ponha no negócio "o apartamento de Santana", avaliado em
"R$ 600 mil".
O agente da PF revela na conversa que, em meio a um litígio
matrimonial, estava transferindo
os seus imóveis para o nome de
outra pessoa.
Carros e prédio
O grampo da PF captou ainda
um diálogo de 24 de março de
2003 em que o agente Herman
Rodriguez conversa sobre automóveis de luxo. Diz ao interlocutor que vendera um Mercedes
Benz blindado e que manteria,
para uso pessoal, outro carro da
mesma marca. No mesmo diálogo, conta que estava construindo
um prédio. Encontrava-se na terceira laje. Depois de pronto, lhe
renderia "trezentos paus" mensais de renda.
Em outro diálogo sobre dinheiro, de 14 de maio de 2003, o nome
do juiz Rocha Mattos é mais uma
vez citado, de modo cifrado. Um
companheiro de quadrilha diz ao
delegado Bellini estar sabendo
que "pegaram o Jotinha". Teria sido descoberto que o juiz mantém
"oito paus de verde na Suíça".
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