São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 2004

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REFORMA MINISTERIAL

Presidente hesita até na substituição de ministro do PSB

Base aliada teme que Lula desfaça acordos de Dirceu

Bruno Stuckert-9.jan.2004/Folha Imagem
O ministro José Dirceu (Casa Civil) em entrevista anteontem no Palácio do Planalto, em Brasília


KENNEDY ALENCAR
RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A centralização das negociações da reforma ministerial no ministro José Dirceu (Casa Civil) gera insegurança entre os aliados do governo. Os partidos temem que os arranjos acertados pelo ministro sejam depois desautorizados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como já ocorreu antes.
O PMDB, que tem hoje reunião decisiva com Dirceu, fez de tudo para que as conversas ocorressem ainda com Lula no país. Em dezembro de 2002, Dirceu acertou dois ministérios para a sigla, mas o presidente o desautorizou.
O trauma não é exclusividade do PMDB. PSB, PL, PTB e PP também se queixam de que Lula não negocia diretamente com eles e depois, vez por outra, prefere soluções diferentes das acertadas com o ministro da Casa Civil.
Na quarta-feira, Dirceu acertou a substituição do ministro Roberto Amaral (Ciência e Tecnologia) pelo líder do PSB na Câmara, Eduardo Campos (PE). Mas houve reação contrária ao convite a Campos, e o presidente transmitiu isso ao ministro, acrescentando que talvez eles tivessem de rever o acordado. Detalhe: numa reunião secreta da Executiva do PSB, Eduardo Campos já havia avisado Renato Casagrande (ES) que ele o substituiria na liderança.
Na sexta-feira, Amaral se antecipou e entregou um pedido de demissão ao presidente. Lula, no entanto, pediu que o ministro aguardasse até seu retorno do México, na próxima quarta-feira. Quer mais tempo para pensar. Dirceu luta para honrar o acerto com o PSB e não se desmoralizar.
A insegurança, porém, é mais sentida pelos peemedebistas, que têm no chefe da Casa Civil seu principal interlocutor no governo. No início da semana, Dirceu contatou a cúpula do PMDB convidando-a para uma reunião amanhã, segunda-feira. Lula já estaria cumprindo agenda no México, para onde embarca hoje à noite, às 23h. Desconfiados, os peemedebistas resolveram pressionar para antecipar a conversa.
Na noite de quarta-feira, Dirceu desembarcou no aeroporto do Tirirical, em São Luís. De lá, foi para a praia do Calhau, onde mora o presidente do Senado, José Sarney. Já estava no local o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), chamado por Dirceu.
Como de costume, Dirceu nega que tenha ido a São Luís. O encontro, no entanto, é confirmado por comensais da casquinha de caranguejo, servida na entrada, e do frango ao molho pardo servidos por Sarney. O ministro ofereceu as pastas das Comunicações e da Previdência para o PMDB, sinalizando que talvez pudesse entrar na negociação a Integração Nacional. Das três opções, o PMDB teria duas.
O partido viu com bons olhos as Comunicações, mas rechaçou a Previdência por avaliar que o cargo só causa desgaste político. De volta a Brasília, Dirceu informou Lula dessa recusa. Se a reunião ocorresse amanhã, como queria o ministro, o PMDB provavelmente só saberia da reação do presidente quando ele voltasse do México. Mas já sabe que Lula pediu para Dirceu insistir na Previdência.
Sigla com raízes nordestinas, o PMDB prefere ocupar a pasta da Integração Nacional, sobretudo depois que Lula descartou a hipótese de tirar Olívio Dutra do Ministério das Cidades, outra pasta desejada pela legenda.
Lula acha difícil mexer com Ciro Gomes (Integração Nacional), porque a principal alternativa seria deslocá-lo para o Planejamento. E a equipe econômica não quer trocar um petista de copa e cozinha, Guido Mantega, por um estranho no ninho: Ciro é do PPS e tem aspirações à Presidência. Apesar disso, Lula estuda remanejar Ciro, até para a Previdência.
Quando Lula embarcar esta noite para o México, o acerto do PMDB estará praticamente definido. O líder na Câmara, Eunício Oliveira (CE), já convidado por Dirceu para ser ministro, deverá saber o seu destino. Dificilmente não será Comunicações.
Já o nome do senador será referendado pela bancada em reunião prevista para quarta. Oito senadores são candidatos e se engalfinham. O mais cotado é Garibaldi Alves (RN), pelo perfil "suave" (conciliador), tem dito Dirceu.

Aliança eleitoral
Será o desfecho de um lento processo de incorporação do PMDB ao centro do governo. O partido oficializou o apoio a Lula em maio de 2003. Aos poucos, a legenda foi se infiltrando no segundo escalão com cargos no Palácio do Planalto, Petrobras, Banco do Brasil e nos ministérios de Minas e Energia, Transportes e Integração Nacional.
Desde a redemocratização, em 1985, quando ganhou o governo, o PMDB quase sempre esteve no poder. Algumas vezes no centro, como no governo José Sarney (1985-1990). Outras, nas franjas, como nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Raras vezes ficou de fora, como no governo de Fernando Collor de Mello (1990-1992).
Como reza a tradição dessa federação de caciques regionais, dificilmente o PMDB perfilará unido com o Planalto. Mas a adesão não assegura apenas maioria no Congresso. Lula e o PT contam com a estrutura capilar do partido em todo o país para fazer alianças e levar o governo a ser o grande vitorioso nas eleições de outubro.



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