|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
AGENDA NEGATIVA
Em sua mais contundente crítica à gestão Lula, vice diz que política fiscal é irresponsável e que teme crise política
Alencar vê "maior crise social da história"
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O vice-presidente José Alencar
fez ontem sua mais contundente
crítica à gestão econômica e social
do governo do qual faz parte.
Dizendo que o país pratica uma
política fiscal "irresponsável", que
só interessa ao mercado financeiro internacional, o vice reclamou
não só dos juros altos, mas do superávit primário "exagerado", da
reforma agrária, e avaliou a atual
crise social como "talvez a maior
de nossa história" e que pode se
transformar em crise política.
O PL, partido de Alencar, tem
patrocinado várias críticas à política econômica comandada pelo
ministro Antonio Palocci (Fazenda). Além dos constantes ataques
do vice ao nível das taxas de juros,
o presidente do PL, deputado Valdemar Costa Neto (SP), chegou a
pedir a demissão de Palocci e do
presidente do Banco Central,
Henrique Meirelles, causando indignação no Palácio do Planalto.
"A crise social que atravessamos, talvez a maior de nossa história, não nos permite uma atitude contemporizadora, sob o risco
de degenerar-se e transformar-se
em crise política", afirmou Alencar, que cobrou a retomada dos
investimentos estatais nas áreas
social e de infra-estrutura. "Não
queremos o Estado nem grande
nem mínimo, nós queremos o Estado necessário", disse o vice.
As declarações dele foram feitas
na Câmara dos Deputados durante a abertura de um seminário nacional do seu partido para discutir
projetos de desenvolvimento. Na
primeira vez em que citou a questão dos juros, Alencar foi interrompido por aplausos. "Tinha
prometido a mim mesmo que
não falaria de juros, vejo agora
que fiz muito bem em falar", afirmou, arrancando risos da platéia.
De acordo com o vice, a rendição ao mercado financeiro internacional começou na gestão FHC.
"Só superaremos a profunda injustiça em que estamos mergulhados se acreditarmos em nossas
próprias forças. O governo anterior nos meteu numa armadilha
de política econômica alienante,
transferindo ao exterior o comando sobre o nosso destino como
economia e como nação", disse.
"Tudo o que se tem feito nos últimos anos tem sido no sentido de
atender ao mercado financeiro internacional. Temos taxas de juros
estratosféricas para atrair o capital financeiro especulativo", afirmou. E acrescentou: "Isso nos leva a uma política fiscal irresponsável na medida em que o custo
da dívida pública extrapola em
muito o superávit primário, não
obstante os níveis exagerados
deste". Esse superávit é a economia que o governo faz para o pagamento dos juros da dívida.
Para retomar os "investimentos
inadiáveis", Alencar cobrou a
queda dos juros básicos, hoje em
16%. "De onde virão os recursos
para a retomada dos investimentos públicos? Simplesmente da
queda dos juros. Pagamos, no ano
passado, quase R$ 150 bilhões de
juros sobre a dívida pública [R$
145 bilhões, segundo o Banco
Central]. Sobraram R$ 4 bilhões
para investimentos", afirmou. "Se
reduzirmos isso a um terço, ainda
assim serão as mais altas taxas básicas reais do planeta", concluiu.
No programa nacional de TV
do PT, que foi veiculado na semana passada, o partido deu destaque à afirmação de que a atual taxa representa o mais baixo juro
real da última década no país.
"Ao contrário do que alguns
propagandistas do status quo têm
dito, o Estado brasileiro não está
quebrado, está sim sendo depauperado pela alta taxas de juros",
continuou Alencar. O Ministério
da Fazenda não comentou as declarações do vice-presidente.
Reforma agrária
Ao fazer um parênteses em seu
discurso, Alencar criticou também a reforma agrária do governo, afirmando que o plano
"ideal", com assentamentos formados nos moldes de cooperativa
e com acesso a educação, saúde,
orientação tecnológica e comercial, ainda não saiu do papel.
"Essa seria a reforma agrária
ideal, sem briga. O brasileiro é pacato, é ordeiro, não gosta de briga.
Agora, é aquela história, nós [o
governo], com toda a boa vontade
que há, ainda não iniciamos um
trabalho dessa natureza", disse.
A assessoria de imprensa do Ministério do Desenvolvimento
Agrário afirmou que a pasta concorda com o conceito apresentado pelo vice e que isso está sendo
implantado nos assentamentos.
Sobre a postura que o PL tem
adotado em relação ao governo,
Alencar disse: "Não somos como
uma assembléia de notáveis, prévia à Revolução Francesa, convocados apenas para dizer sim".
Depois do seminário, Valdemar
Costa Neto voltou a criticar a gestão econômica do governo, mas
citou apenas o presidente do Banco Central. "O maior problema é
o Meirelles. Como banqueiro,
acho que ele não tem condições
de dirigir o BC. Se o Palocci conseguir mudar o BC, daremos um
grande salto", afirmou. O resultado do encontro de ontem será um
manifesto a ser entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Texto Anterior: Janio de Freitas: O bêbedo e o desequilibrista Próximo Texto: Memória: Vice sempre fez críticas à política econômica de Lula Índice
|