São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 2002

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Importância do Estado volta a ser valorizada

DO COLUNISTA DA FOLHA

O debate de ontem transitou também por uma questão que parece vencida: as vantagens e desvantagens da privatização.
João Sayad provocou: "O Brasil tem mais celulares não porque privatizou [as teles", mas porque o mundo inteiro tem mais celulares". Luiz Carlos Mendonça de Barros, que comandou justamente a privatização das teles, reagiu: "Esse mundo teórico, ideológico, das estatais não é real. No Brasil, 89% dos telefones eram das classes A e B. Que diabo de estatal é essa, que concentra renda?".
Para o ex-ministro, "o Estado não é o diabo, mas também não é a salvação. É parte do problema e parte da solução".
Rabello de Castro aproveitou a divergência sobre o papel do Estado para introduzir o seu tema favorito. Criticou a privatização feita pelo governo FHC, não por ela em si, mas por ter sido feita de "forma excludente".
Rabello de Castro defende a tese da "privatização democrática", por meio do uso do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). Os trabalhadores teriam direito a usar os recursos de seu fundo para comprar, por exemplo, ações da Petrobras ou de qualquer outra estatal.
Pérsio Arida, quando presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), chegou a comprar a tese, mas saiu do governo antes de introduzi-la de fato. "Continua sendo a única fórmula para este país", defende Rabello de Castro, alegando que falta poupança para os investimentos necessários a um crescimento de 5% ao ano, que seria a sua meta, se fosse fazer um plano de governo (até fez, aliás, mas arquivado porque o PFL, que o encomendou, não tem candidato presidencial).
Sayad cita sua experiência na Prefeitura de São Paulo para defender uma maior presença do Estado. "A prefeitura é muito menor que as necessidades da cidade de São Paulo", diz.

Estatais
Embora crítico de FHC, Sayad usa argumento que é muito semelhante ao que o presidente tem esgrimido junto ao FMI no que se refere ao investimento de estatais.
Sayad lembra que, no governo Sarney, a Telebrás tinha "capacidade técnica, dinheiro e demanda, mas o ministro da Fazenda, na época Francisco Dornelles, não a deixava investir porque o investimento era contabilizado como déficit público pelo FMI".
Fernando Henrique Cardoso tem trabalhado para derrubar essa conceituação, exatamente para aumentar a capacidade de investimento das estatais na hora em que é preciso conter gastos.
Rabello de Castro, coerente com seu liberalismo, critica o déficit público, menos por ele em si e mais pelo que chama de "gastança pública". Vai contra o senso comum, que diz que o Brasil é um país que gasta pouco e gasta mal, especialmente na área social.
"O Brasil gasta muito e de forma perdulária", afirma, para defender que o corte da gastança "é a verdadeira renegociação a ser feita", em vez da renegociação da dívida pública, que está no ar em comentários tanto da mídia como de analistas financeiros.
Sayad, de seu lado, ataca outro vocábulo (risco-país) que se incorporou às análises tanto econômicas como político-eleitorais.
Para ele, o verdadeiro risco-Brasil é o fato de que "dois terços da pobreza brasileira está hoje nas grandes cidades, formadas por bairros que não têm ruas, jovens que não têm horizontes".
(CLÓVIS ROSSI)



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