São Paulo, domingo, 11 de dezembro de 2005

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QUESTÃO AGRÁRIA

Com base frágil no Norte, MST reclama de falta de estrutura

Região amazônica concentra assentamentos sob críticas

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em busca de terras mais baratas e para preencher lotes esvaziados pelo êxodo rural, o governo federal está concentrando o assentamento de famílias sem terra na região amazônica, o que, na prática, desvia o anunciado atendimento prioritário a lavradores acampados do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
O MST, líder de invasões de terra e motivo de preocupação e monitoramento do Planalto, possui uma base frágil de militantes na região Norte do país. Com isso, vê famílias de outras entidades e outros movimentos furarem a fila na seleção de assentamentos do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
Documento do Ministério do Desenvolvimento Agrário obtido na semana passada pela reportagem mostra que, das 72,3 mil famílias assentadas entre janeiro e 23 de novembro em todo o país, 38,5 mil (53%) foram encaixadas em lotes de terra localizados nos nove Estados da Amazônia Legal (Estados do Norte mais Maranhão e Mato Grosso). "Uma de nossas prioridades são as famílias acampadas, o que não necessariamente casa com possibilidade de obtenção de terras", diz Rolf Hackbart, presidente do Incra.
O MST é crítico à concentração dos assentamentos na região amazônica. Alega que a falta de infra-estrutura inviabiliza a colocação de famílias em lotes criados na região. E aponta como agravantes a escassez de água tratada, rede de esgoto, energia e estradas de acesso, além da propagação de doenças como a malária.
"A demanda por estrutura na região Norte é muito grande. Esse é o ponto. Teremos muitos assentados e depois vamos correr atrás de estradas e de obras de infra-estrutura", declara Hackbart.
A carência de infra-estrutura, porém, é apenas um dos pontos que desagradam o MST. Outro é sua atuação tímida na região -o movimento ainda não está organizado em quatro Estados do Norte (AC, AM, AP e RR).
Números da Ouvidoria Agrária Nacional mostram a ausência do MST por lá. Das 419 invasões de terra organizadas pelo movimento entre julho de 2003 e outubro de 2005, apenas 5% delas (24) ocorreram na Amazônia Legal. As ações do MST no governo Lula representam 67% das invasões.
A realidade é que a lentidão para atender o MST a curto prazo tem preocupado o governo, que até agora não cumpriu nenhuma meta de assentamentos. Tornou-se comum auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sondarem o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Incra sobre os números -a meta é assentar 115 mil famílias até o final do ano.
O Planalto teme a radicalização do MST em 2006, contaminando a imagem do presidente durante sua virtual campanha à reeleição. "Com certeza nós vamos infernizar a vida do governo no ano que vem", diz João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST.
Além de ver a criação de projetos de assentamento longe de suas bases, o MST também questiona o uso excessivo de terras públicas e de lotes vagos no beneficiamento de camponeses sem terra. Das 72,3 mil famílias assentadas até 23 de novembro, 33,2 mil (46%) foram colocadas em terras públicas retomadas pelo governo.
O MST defende a intensificação dos processos de desapropriação de imóveis rurais para a reforma agrária como forma de punir os latifúndios improdutivos e diminuir a concentração de terra.


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