São Paulo, quinta-feira, 12 de julho de 2007

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Acusados faziam acerto de edital por e-mail

Pivô do esquema desbaratado por operação da PF, Angraporto interferiu na confecção de licitação da Petrobras, diz investigação

Dois dias antes da abertura de proposta, funcionários enviaram a versão de um contrato a representantes da empresa acusada

ELVIRA LOBATO
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Com auxílio da auditoria da Petrobras, a Operação Águas Profundas da Polícia Federal e do Ministério Público Federal reuniu fortes indícios de interferência da empresa Angraporto na confecção de editais de licitações para o reparo das plataformas P-10, P-14, P-16 e P-22 da estatal petrolífera.
Um dos casos dissecados na investigação foi a contratação dos serviços de cais e apoio logístico da reforma da P-10, vencida pela Angraporto em 2004.
Em 21 de junho de 2004, a Petrobras enviou carta-convite às empresas aptas a prestar o serviço, mas, segundo a denúncia, tais cartas eram uma mera "encenação" porque, naquele mesmo dia, antes de elas serem enviadas, há registro de troca de e-mails entre funcionários da Petrobras sobre possíveis mudanças no edital sugeridas por Mauro Zamprogno, sócio da Angraporto e um dos 14 presos na operação até agora. O objetivo da mudança era aumentar o valor do serviço. A Angraporto venceu a licitação.
No dia 7 de julho, dois dias antes da abertura da proposta das empresas convidadas, os funcionários mandaram uma versão do contrato a ser assinado pelo futuro vencedor a representantes da Angraporto. A denúncia qualificou a realização da licitação como "um mero formalismo", já que estava tudo arranjado previamente para a vitória da Angraporto.
Nessa mesma licitação, foi apurado que a Petobras pagou R$ 634 mil à empresa Planeta Operadora pelo uso de uma chata -um tipo de embarcação- para um serviço de transporte marítimo que já estava previsto no edital. A denúncia considerou isso como uma "dupla remuneração" pelo mesmo serviço à Angraporto, pois a Planeta é controlada pelos mesmos sócios da empresa.
A denúncia detalha o suposto esquema a partir de 2003, quando o gerente-geral da unidade serviços de sondagem, Carlos Heleno Netto Barbosa, também preso, pediu autorização para realizar os serviços de docagem e estadia para reforma da P-22. Pelas regras da Petrobras, a profundidade (o calado) mínima exigido era de 9 metros. Foram enviadas cartas-convite a quatro empresas em 9 de julho de 2004 para que os interessados fizessem propostas no dia 16 daquele mês.
Uma auditoria realizada pela própria Petrobras percebeu que o edital exigia uma profundidade menor (8,23 metros) do que o estabelecido pelas regras da companhia. Foi apurado que isso teria sido feito para atender à Angraporto, cujo cais tem profundidade de 8,84 metros.

Regras da licitação
Pelas regras da Petrobras, as licitações e contratações de serviços precisam da aprovação de diferentes níveis hierárquicos, dependendo do valor. Procurada, a estatal não forneceu dados sobre as licitações sob suspeita e informou que nenhum executivo iria falar.
Especialistas ouvidos pela Folha dizem que, pelos valores dos contratos, de até R$ 88 milhões no caso da P-14, haveria a necessidade de aprovação ao menos do diretor da área para a realização do serviço e da licitação. Para valores mais altos, seria necessário até o aval de toda diretoria colegiada, que inclui o presidente da companhia.
O ex-diretor de serviços de gás e energia da Petrobras Antonio Luiz Menezes disse que as áreas técnicas identificam a necessidade de fazer os serviços e enviam os pedidos à diretoria, que constitui a comisão de licitação. "O diretor repassa as atribuições, mas não a responsabilidade [sobre a contratação]. Na minha época, qualquer valor acima de R$ 30 milhões tinha de ser aprovado pelo diretor", disse Menezes, que saiu da empresa em 2003. Obras menores (reparo, manutenção e despesas de operação) dispensam o aval dos diretores. São autorizadas pelos gerentes-executivos e gerentes gerais.


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