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CASO BANESTADO
Fita da TV Senado flagra manobra do partido para retaliar PSDB
PT discutiu tática na CPI para preservar compadre de Lula
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Um diálogo captado pela TV Senado, logo após uma sessão da
CPI do Banestado, revela que integrantes petistas da comissão estudaram uma maneira de retaliar
a possível convocação, para depoimento, do advogado Roberto
Teixeira, compadre do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
A conversa foi gravada em 23 de
junho último na sala de reuniões
da CPI, sem que os petistas soubessem que as câmeras e microfones da TV estavam abertos. Participaram o relator da comissão, José Mentor (PT-SP), a senadora
Serys Slhessarenko (PT-MT) e o
deputado federal Eduardo Valverde (PT-RO).
A pedido da Folha, o diálogo,
travado em voz baixa e com trechos ainda inaudíveis, foi degravado ontem pelo perito Ricardo
Molina, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
No diálogo, o relator da comissão, José Mentor, qualifica Teixeira como "compadre do Lula (...), e
é meu amigo".
O relator indicou ter material
suficiente para tomar depoimentos de pessoas relacionadas ao
presidente da comissão, o senador Antero Paes (PSDB-MT),
com quem trava uma batalha política na comissão.
"Eu tenho um caminhão! É que
eu não quero fazer desse jeito, nós
não vamos desse jeito, vamos fazer de outro jeito", disse Mentor,
referindo-se à estratégia a ser adotada contra os tucanos.
"Nós vamos convocar o pessoal
dele [do senador Antero] também", afirma o deputado Eduardo Valverde. Mentor então tenta
tranqüilizar seus colegas petistas
sobre os rumos da CPI. "Nós
[conseguimos] fazer maioria
aqui."
Ouvido ontem pela reportagem,
Valverde confirmou que a tática
do partido é a retaliação na CPI.
"É lógico. Se atacar, recebe. É bateu, levou." Ele afirmou que "tem
muita coisa" contra o "tucanato e
esse pefelê [PFL]".
Procurado pela Folha, Mentor
disse se recordar de ter usado a
expressão "caminhão" em conversa com os colegas, mas preferiu não fazer mais comentários
antes de ter acesso e ouvir a fita.
"Eu preciso me recordar do contexto em que eu falei", afirmou.
Remessas
O nome do advogado Roberto
Teixeira, 60, apareceu nas investigações sobre o Banestado (Banco
do Estado do Paraná) porque ele
defende o empresário Antonio
Celso Cipriani, 57, proprietário da
Transbrasil, e também integrou o
conselho de administração da
empresa de aviação de São Paulo.
Ela quebrou em 2001, deixando
R$ 910 milhões em dívidas.
Roberto Teixeira não é investigado formalmente pela CPI nem
teve sigilos quebrados -sua convocação era pedida pelo senador
Arthur Virgílio (PSDB-AM).
De acordo com o laudo da Polícia Federal número 675, do ano
passado, o irmão de Cipriani e ex-conselheiro fiscal da Transbrasil,
Emídio Cipriani, aparece como
beneficiário de US$ 1,51 milhão
depositados em contas dos bancos United National de Miami e
First Union Jax, nos Estados Unidos. As transferências, de acordo
com o laudo, foram feitas por
meio de empresas de doleiros
brasileiros, como a June International, controlada pelo megadoleiro do Paraná Alberto Youssef.
Além disso, de acordo com ofício entregue à comissão pelo presidente da CPI, senador Antero,
Antonio Cipriani estaria relacionado à movimentação de US$ 35
milhões no exterior por meio da
empresa Beacon Hill Service, que
teve suas portas fechadas no ano
passado após a Promotoria de
Nova York (EUA) apontar fraudes financeiras.
Bate-boca
Antonio Cipriani teve seu sigilo
bancário quebrado por determinação da CPI, em fevereiro último. Por duas vezes, Mentor tentou inutilmente impedir a quebra
do sigilo, alegando que a apuração não poderia "pinçar nomes".
Na sessão que antecedeu o diálogo gravado pela TV Senado,
houve um intenso bate-boca entre Mentor e o senador Arthur
Virgílio (PSDB-AM) a respeito do
advogado Roberto Teixeira.
"Gostaria de não ver mais aqui
apadrinhamento a "seu" [Antonio] Cipriano [sic]. Gostaria de
não ver mais aqui apadrinhamento ao "seu" Roberto Teixeira. É hora de passarmos a limpo. É ladrão,
é para botar aqui e de fato execrar
o ladrão, pertença a que partido
pertencer", disse Virgílio.
A reação do relator, indicado
para a função pelo Palácio do Planalto, foi imediata: "Vossa Excelência está chamando alguém de
ladrão? Vossa Excelência está
chamando Roberto Teixeira de
ladrão?", perguntou Mentor, insistindo para que ele assinasse um
documento com a acusação.
Ante a recusa de Virgílio, o relator afirmou: "Vossa Excelência
não assina porque não sabe como
acusá-lo. (...) Vossa Excelência é
leviano. Não assina".
Teixeira e o presidente Lula são
amigos desde, pelo menos, a década de 80. Durante anos, Lula
morou numa casa emprestada
por Teixeira, em São Bernardo do
Campo (SP). Em meados da década de 90, Teixeira foi acusado por
militantes do próprio PT de fazer
lobby nas administrações petistas
para contratações, sem licitação,
da empresa de consultoria Cpem.
Em 19 de junho, Lula foi o convidado de honra do casamento de
uma filha de Teixeira em Monte
Alegre do Sul (120 km de São Paulo). Isso ocorreu quatro dias antes
da gravação da conversa de Mentor na CPI do Banestado.
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