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Militares apóiam coronel acusado de tortura
Oficiais evocam Lei da Anistia e se mobilizam por Ustra; segundo coronel, esquerda terrorista foi responsável por 120 mortes
Coronel reformado do
Exército enfrenta processo
no qual é acusado de tortura
nos anos 70 contra cinco
pessoas da mesma família
DA SUCURSAL DO RIO
O processo no qual o coronel
reformado do Exército Carlos
Alberto Brilhante Ustra é acusado de tortura contra cinco
pessoas da mesma família durante a ditadura desencadeou
uma ampla mobilização de oficiais das Forças Armadas -já
fora da ativa- em apoio ao réu.
O movimento se intensificou
depois da audiência da quarta-feira, quando testemunhas de
acusação afirmaram ter sido
torturadas por Ustra na década
de 1970. O pilar da argumentação dos oficiais solidários ao coronel é que a Lei de Anistia
(1979) beneficiou não apenas
os opositores condenados judicialmente mas também os funcionários dos governos militares, ainda que não tenham sido
alvo de ações na Justiça.
"Não existe anistia só de um
lado; a anistia só vale para
eles?", pergunta o general-de-divisão (três estrelas) reformado Francisco Batista Torres de
Melo, coordenador do Grupo
Guararapes. Sediada em Fortaleza, a associação reúne 463 oficiais das Forças Armadas (32
generais) e 1.020 civis.
Um manifesto do Guararapes considera a ação contra Ustra "descabida" e uma "afronta"
à Lei de Anistia.
O processo "é quase uma
aberração", na opinião do general-de-exército (quatro estrelas, o máximo concedido) da reserva Gilberto Barbosa de Figueiredo. Ele preside o Clube
Militar, no Rio de Janeiro.
"A lei [de 1979] valeu para os
dois lados", diz o general. "Depois dela, o processo não cabe.
É a mesma coisa que querer julgar alguém que assaltou um
banco. Zerou o jogo. Não vai
mais ser julgado por crime que
cometeu na época."
A idéia é reafirmada pelo advogado Paulo Esteves, defensor
de Ustra: "A moeda tem dois lados com idêntica possibilidade
de propositura de ações. É o
que a anistia buscou evitar".
"Há pessoas na administração pública que têm contra si
imputações [por atitudes] que
não são das mais corretas", diz
Esteves. "[O processo] traz à
baila um assunto que não interessa a ninguém. [No regime
militar] ocorreram de lado a lado coisas desagradáveis."
Crimes da esquerda
O advogado se refere a crimes de assalto, seqüestro e
morte cometidos por militantes da esquerda armada. Levantamento promovido por Ustra
calcula em 120 os mortos e 330
os feridos em ações de guerrilha e terrorismo.
Com o codinome "Tibiriçá",
o coronel dirigiu de setembro
de 1970 a janeiro de 1974 a seção paulista do órgão centralizador do combate à oposição, o
Doi-Codi (Destacamento de
Operações de Informações
-Centro de Operações de Defesa Interna). Nesse período, pelo menos 40 presos foram mortos nesse local, conforme o jornalista Elio Gaspari no livro "A
Ditadura Encurralada".
Os autores da ação contra
Ustra são o casal Maria Amélia
e César Teles, seus filhos, Janaína e Édson, e Criméia Almeida, irmã de Maria Amélia.
Eles acusam o militar por seqüestro e tortura em 1972 e
1973. Janaína tinha 5 anos, e
Édson, 4. Também foram levados para o Doi-Codi. Os adultos
militavam no PC do B. Eles narram diversas modalidades de
sevícias. Grávida então de sete
meses, Criméia conta que também foi submetida a violência.
A ação declaratória não visa
indenização pecuniária ou condenação. Pede o reconhecimento de Ustra como responsável por danos morais e à integridade física. Em primeira instância, a Justiça considerou
que, como a Lei de Anistia trata
de crimes, não se aplica a ações
civis, e o processo prossegue.
A Folha tentou ouvir Ustra,
74, mas ele não respondeu ao
recado. Em conversa em setembro, o militar chamou os
relatos de "mentiradas". Disse
que os acusadores ficam "inventando coisas" e "mulheres
mentem". Atualmente ele se
dedica a divulgar seu livro "A
Verdade Sufocada", com a versão sobre os anos de poder militar e os crimes da esquerda.
Um dos promotores do lançamento do livro em Porto Alegre é o general-de-brigada
(duas estrelas) reformado José
Apolônio Neto. Para o oficial,
"estão fazendo uma barbaridade com o coronel Ustra. É um
ato de rebeldia do pessoal do
outro lado da rua".
Indagado sobre o caso, o
Exército respondeu que, "como o assunto está tramitando
na Justiça, o Exército Brasileiro não se pronunciará".
(MÁRIO MAGALHÃES)
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