São Paulo, sábado, 13 de outubro de 2007

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Depois do "chute na santa", Universal muda a imagem

Igreja ganha com apoio a Lula, disputa com Globo e menos ataques a outras religiões

Reação rápida a escândalos tem ajudado a mudar a imagem, como ocorreu no mensalão, em que os envolvidos foram afastados

MARCELO BERABA
DA SUCURSAL DO RIO

Em 12 de outubro de 1995, feriado consagrado à Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, a Igreja Universal do Reino de Deus desceu aos infernos. Os chutes e socos desferidos pelo bispo Sérgio von Helder na imagem da santa durante programa da TV Record empurrou a igreja, que já vinha acossada por denúncias de mercantilismo da fé, intolerância religiosa e sonegação de impostos, ao fundo do poço.
Passados 12 anos, a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao lado do bispo primaz Edir Macedo na inauguração da Record News, em 27 de setembro, foi uma indicação segura de que a igreja conseguiu mudar a imagem e deu a volta por cima. Lula, que nas eleições de 1989 e 1994 fora combatido pela Universal como reencarnação de satanás, também prestigiava o aliado político. Os discursos agora estavam afinados e tinham o mesmo alvo, o monopólio nas comunicações.
Em 1995, a reação ao ato iconoclasta do bispo von Helder foi fortíssima. Vários templos foram atacados pelos católicos e muitos parlamentares pediram a cassação da concessão da TV Record, , que foi adquirida pela Igreja Universal em 1990.
Na biografia autorizada que acaba de lançar ("O Bispo", de Douglas Tavolaro, Editora Larousse), Edir Macedo revela que quando tomou conhecimento do episódio, soube imediatamente que foi um erro. Na época, foi para a TV pedir desculpas e julgou o ato insensato. Agora, no livro, o define como "nosso maior erro".
No artigo sobre a história da Universal no Brasil para o livro "A Igreja Universal do Reino de Deus - Os novos conquistadores da fé" (Editora Paulinas), o sociólogo Ricardo Mariano constata que a partir do final da década de 1990 a Iurd "promoveu um verdadeiro processo de consolidação institucional" e "tem conseguido granjear maior legitimidade". Para isso contribuíram vários fatores.
Em primeiro lugar, a igreja diminuiu o ímpeto contra os católicos e mesmo contra as religiões afro-brasileiras.
O prestígio que Lula emprestou à inauguração da Record News revela dois outros fatores que contribuem para diminuir a rejeição à Igreja Universal. Desde o segundo turno da eleição presidencial de 2002 os parlamentares eleitos pelos fiéis da igreja apóiam o governo Lula. Essa foi uma mudança importante na estratégia política dos evangélicos que, salvas as exceções, sempre hostilizaram os partidos de esquerda e de centro-esquerda.
E a guerra contra a hegemonia da Globo atrai a simpatia de setores que, embora torçam o nariz para os métodos da Universal, consideram necessário o surgimento de atores fortes na comunicação.
Há, ainda, outros fatores que ajudam a formatar a nova imagem da igreja. É muito rápida e incisiva a ação da cúpula religiosa nos casos de escândalos públicos. Foi assim com vários deputados envolvidos nas denúncias do mensalão e dos sanguessugas, punidos pela igreja antes do fim dos processos.
Em questões de moral e comportamento, não é possível afirmar que a Igreja Universal tenha orientações liberais, mas é fora de dúvida que vem se diferenciando das posições conservadores de outras igrejas evangélicas e, principalmente, da Igreja Católica.
Em primeiro lugar, não faz campanha contra o aborto e o divórcio. Admite os dois nos casos previstos em lei por considerar que são questões de foro íntimo. Em relação ao aborto, parlamentares ligados à igreja defendem que seja estendido aos casos de comprovação de anencefalia do feto. Diferentemente da Igreja Católica, os bispos da Universal são favoráveis ao planejamento familiar e os métodos de contracepção.
Deve-se reconhecer que a Igreja Universal mudou sua estratégia, mas, como frisa Mariano, seus principais objetivos continuam os mesmos: sobrepujar a Rede Globo e a Igreja Católica.


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