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Para esquerda da época, AI-5 foi "2º golpe"
Em lugares diferentes ao saber da medida, Serra, Dilma, Gabeira, Valente e Jaguar temeram seus efeitos
FERNANDO BARROS DE MELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Exilado no Chile, o professor
de economia José Serra recebeu a notícia sobre o Ato Institucional de número cinco deitado na cama, em meio a calafrios causados por uma febre tifóide. No Rio, o jornalista Fernando Gabeira sentiu a mudança quando viu um censor assumir uma sala na Redação do
"Jornal do Brasil". Em Belo
Horizonte, a estudante de economia Dilma Rousseff tomava
o café da manhã de seu aniversário de 21 anos ao ser avisada
por um colega.
Em horas e locais diferentes,
todos esses importantes personagens da atual democracia
brasileira tiveram a mesma
sensação quando souberam do
novo ato. As coisas haviam mudado. "Eu estava com febre intensa e a notícia me foi passada
pela [economista] Maria da
Conceição Tavares. Ficou muito claro que os planos de voltar
iam ser só no longo prazo", relembra Serra, que hoje classifica o ato como "talvez o pior episódio da história republicana".
Na Redação do jornal a "Última Hora", o cartunista Jaguar
(Sérgio Jaguaribe) descobriu os
efeitos do ato ao ser demitido.
Ele se uniu a outros jornalistas
que tiveram o mesmo destino.
"Nós resolvemos fazer uma coisa mais idiota ainda, que foi
criar um jornalzinho chamado
"O Pasquim" para falar mal do
governo. Em seis meses, a
maioria dos caras, entre eles eu,
estavam em cana", conta.
Hoje deputado federal, Ivan
Valente estudava engenharia e
participava de movimentos
sindicais. "Houve muito medo
e autocensura." Para driblar os
agentes e infiltrados, Ivan fazia
reuniões em ônibus circulares.
"Nos bares era perigoso", diz
ele, que entrou para a clandestinidade em 1971.
O jornalista e escritor Zuenir
Ventura, apesar de não ter
atuação política, sofreu com o
chama de "paranóia" que se
instalou. "Haviam arrastões,
muita gente era presa", diz ele,
que também foi preso. Ventura
lembra de pais procurando por
filhos nos quartéis e do medo
-até mesmo na praia- de se
estar sendo gravado.
"A sociedade não sabia o que
ocorria nos porões, havia todo
um trabalho da ditadura para
mostrar que o país estava em
ordem", diz, relembrando a dificuldade de convencer amigos
de que ocorriam torturas.
Reação
Após os primeiros dias de impacto do AI-5, todos tiveram
que se adaptar às novas circunstâncias. Gabeira, por
exemplo, foi logo participar de
panfletagens para denunciar "o
golpe dentro do golpe". "Mas
era patético. Não havia nenhum clima entre as pessoas
que pudesse ser estimulado.
Como se um Maquiavel tropical dissesse: "Vamos fazer o mal
de uma vez só e antes do natal"."
Já Jaguar diz que os jornalistas do Pasquim foram obrigados a aprender truques para
driblar a censura. "Nossa primeira censora foi a dona Marina, que um dia me pediu um gole do meu whisky. No dia seguinte, eu deixei uma garrafa e
gelo na mesa dela, para agradá-la. Ela acabou demitida."
Quando a censura foi para
Brasília, Jaguar enviava uma
enorme quantidade de matérias para dificultar a análise. "A
gente mandava o rascunho a lápis. Eles aprovavam o desenho,
mas na obra final a gente mudava a expressão do desenho, o
que alterava o sentido."
Colaborou ANA FLOR, da Reportagem Local
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