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São Paulo, sexta-feira, 14 de novembro de 2003

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Investigação interna era farsa

DA REPORTAGEM LOCAL

Sindicância em vez de procedimento disciplinar (apuração mais rígida), com autoria desconhecida apesar de todos saberem quem foi o responsável e, ainda por cima, a chance de escolher quem iria chefiar a falsa investigação.
Segundo escutas telefônicas feitas com autorização judicial, o delegado da Polícia Federal José Augusto Bellini foi consultado pelo próprio corregedor-chefe da PF em São Paulo, Dirceu Bertin, já afastado do cargo, sobre a investigação que iria apurar denúncia de abuso de poder.
Nos grampos, o delegado Bellini é informado antecipadamente que a investigação contra ele será uma farsa. "Nós vamos instaurar uma sindicância [para] apurar, que não vai seu nome, não vai nada, entendeu?", disse Bertin, segundo escuta telefônica.
O ex-corregedor foi indiciado por formação de quadrilha na denúncia apresentada pela Procuradoria da República. Seu pedido de prisão foi negado pela Justiça.
Nas escutas, Bertin também pede que Bellini não se meta em mais confusão. "Me deixaram como o seu tutor, né, meu. Então vê se não arranja mais confusão, né véio", disse o ex-corregedor, que era chefe do delegado da PF Alexandre Crenite, acusado pelo Ministério Público Federal de beneficiar o empresário Ari Natalino da Silva, dono da Petroforte.

Sindicância
Os diálogos para se decidir o responsável pela sindicância, registrados pelas escutas telefônicas, mostram uma intimidade entre Bellini e Bertin. O delegado preso pela Operação Anaconda veta indicados pelo corregedor e só aceita um nome no qual ele tem certeza de que não será prejudicado na apuração.
Em relação ao primeiro nome indicado por Bertin, Bellini reage e chama esse policial de falso. O corregedor insiste: "É falso, mas ele vai ter de te atender."
Bellini não aceita a argumentação e recusa a indicação. "Não. Ele me atende, mas ele é falso. [Ele] te derruba daí se você der um mole", afirmou o delegado.
O corregedor finalmente concorda e pede uma indicação do próprio Bellini. O nome indicado, no entanto, é recusado por Bertin por não ser de um delegado de primeira classe -exigência técnica da sindicância.
Bertin então indica o nome de uma delegada, o que é finalmente aceito por Bellini. Ele vê a sindicância como a oportunidade de ver uma amiga. "Vou poder ver a V. [nome não-divulgado por não se saber sua relação com o caso], vai. Pega a V., então", disse.
No final da conversa, Bellini respira aliviado. "Legal, pronto. É mole para nós", resumiu o delegado da PF. Bertin se despede com um cumprimento fraterno: "Então um grande beijo".
A assessoria da Polícia Federal de São Paulo não comenta sobre a Operação Anaconda e as escutas telefônicas, afirmando ser de responsabilidade da PF de Brasília. A assessoria também não informa os contatos de Bertin e dos advogados dos outros envolvidos no caso presos na sede da superintendência de São Paulo.
Ao informar sobre o afastamento de Bertin, dias depois das prisões realizadas pela Operação Anaconda, a PF de São Paulo informou que todos os casos suspeitos apurados pelo ex-corregedor seriam revistos. (GP)


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