São Paulo, quarta-feira, 15 de junho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/DEPOIMENTO

Em depoimento, petebista citou o nome de seis deputados que teriam recebido mesada do PT

Se Dirceu não sair, vai fazer Lula virar réu, diz Jefferson

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

No depoimento mais esperado e concorrido do ano no Congresso Nacional, o presidente nacional do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), atacou duramente o ministro José Dirceu (Casa Civil), cuja companhia poderia transformar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em réu, citou o nome de seis deputados que fariam parte do esquema do "mensalão" e acusou o governo de estar por trás das denúncias publicadas contra ele na imprensa.
Durante toda sua fala de 6 horas e 35 minutos no Conselho de Ética da Câmara, Jefferson fez questão de inocentar Lula -"um homem honrado e correto"-, chegou a chamar José Dirceu de Rasputin (eminência parda da corte do último czar russo) e bateu boca com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e com o deputado Sandro Mabel (PL-GO), alvos de suas acusações.
"Dirceu, se você não sair daí [Casa Civil] rápido você vai fazer réu um homem inocente, que é o presidente Lula. Sai daí rápido para você não fazer mal a um homem que eu tenho orgulho de ter apertado a mão", afirmou o presidente do PTB, olhando para as câmeras de TV.
O ministro da Casa Civil foi um dos alvos preferenciais do petebista: "Tudo o que eu disse aqui é de conhecimento do ministro José Dirceu. Tudo!", frisou já no fim de seu depoimento. "Tudo o que eu disse aqui eu conversei com ele, tudo, até os acordos envolvendo o PT e o PTB nas eleições".
O deputado repetiu não dispor de provas sobre o que diz, mas citou novos detalhes e pistas de investigações, como o fato de o dinheiro que teria recebido do PT para campanha eleitoral ter chegado envolto em fitas do Banco Rural e do Banco do Brasil.
A outra novidade do depoimento foram os seis nomes de deputados listados por Jefferson que fariam parte do esquema do mensalão, todos do PL e PP: Valdemar Costa Neto (presidente do PL), Sandro Mabel (PL-GO), líder da bancada, Carlos Rodrigues (PL-RJ), Pedro Corrêa (PE), presidente do PP, José Janene (PP-PR), líder da bancada, e Pedro Henry (PP-MT). Os acusados negam.
O presidente do PTB esteve no Conselho de Ética por causa do pedido de cassação do seu mandato protocolado pelo PL, acusado por ele de receber mesadas do tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Hoje, Jefferson depõe reservadamente na comissão de sindicância da Câmara.
Jefferson, ao acusar o governo de tramar a sua destruição política, disse que a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) estava por trás das gravações que levantaram a suspeita de um esquema de corrupção comandado pelo PTB nos Correios. Ele também reclamou que os órgãos do governo não estão investigando a grande irregularidade na estatal, que estaria na diretoria de Tecnologia, cuja nomeação seria responsabilidade do secretário-geral do PT, Sílvio Pereira.
Tendo completado 52 anos ontem, o deputado citou a crença segundo a qual a pessoa passa por um inferno astral um mês antes de seu aniversário.
A principal acusação de Jefferson é a de que o esquema era de conhecimento da cúpula do PT, incluindo Dirceu e José Genoino, presidente da legenda, e que alertou, entre outros, a Antonio Palocci Filho (Fazenda) e a Lula.
Sobre o suposto fim da prática, ironizou a situação dos supostos ex-beneficiários. "Sei que de lá para cá secou porque os passarinhos estão todos com o biquinho aberto. E as coisas [votações] pararam aqui nessa Casa, é síndrome de abstinência. O presidente Lula é inocente nisso, a reação é a reação do traído."

MENSALÃO - Jefferson confirmou todas as acusações que fez, segundo as quais o PT pagava mesada mensal de R$ 30 mil a deputados do PL e do PP em troca de apoio político, mas não apresentou provas: "Não arredo uma linha do que disse à jornalista Renata Lo Prete [da Folha]. É a expressão do que vivenciei, do que senti, do que vivi. (...) Provas não tenho a exibir, sou testemunha", disse, afirmando não possuir gravações, como chegou a se especular em Brasília. O deputado disse jamais ter ouvido falar de mensalão nos governos anteriores, mas afirmou que, desde agosto de 2003, é "voz corrente" no Congresso que Delúbio Soares, tesoureiro do PT, usava como "pombo-correio" o publicitário Marcos Valério para distribuir mesadas a deputados.
Jefferson contou que recebeu a proposta de Delúbio no começo de 2004. Segundo ele, o tesoureiro teria sondado se o "mensalão" para o PTB poderia "desencravar uma unha". O petebista acrescentou que relatou o fato a Dirceu e a Palocci, e que muitos deputados de seu partido se sentiram tentados.
Segundo ele, Luiz Piauhylino (PDT-PE) saiu do partido "por dinheiro". "O motivo [pelo qual] ele saiu do PTB não é nobre, não é justo, foi por dinheiro", afirmou. O líder da bancada do PTB na Câmara, José Múcio, contradisse Jefferson e afirmou nunca ter recebido pressão do PL para receber o mensalão.

DEFESA DE LULA - Jefferson diz que Dirceu montou um cordão de isolamento em torno de Lula e que, quando o presidente ficou sabendo do esquema, o mensalão acabou. "A reação do presidente foi como uma facada nas costas. As lágrimas desceram dos olhos dele. Ele levantou, me deu um abraço e foi embora. E sei que de lá para cá secou porque os passarinhos estão todos com o biquinho aberto. E as coisas [votações] pararam aqui nessa Casa, é síndrome de abstinência. O presidente Lula é inocente nisso, a reação é a reação do traído", disse. "Vi um homem honrado se desfazer diante de uma cinta que fizeram em torno dele".

DEPUTADOS QUE RECEBERAM - Jefferson não apresentou provas, mas encerrou seu discurso citando seis nomes de deputados que seriam os responsáveis por receber o dinheiro do mensalão e fazer a distribuição do dinheiro: "Não são todos os deputados que recebem mensalão. Tem muita gente do PP que está acima disso, tem muita gente do PL que está acima disso. Mas, deputado Valdemar Costa Neto, deputado José Janene, Pedro Corrêa, Sandro Mabel, Bispo Rodrigues, Pedro Henry, me perdoem, de coração, não posso ser cúmplice de vocês".

ABIN - O presidente do PTB afirmou ter convicção de que agentes da Abin -chamados de "canalhas"- foram os responsáveis por fazer a gravação sobre corrupção nos Correios, que gerou toda a crise política. "Quero deixar claro isso aqui, minha convicção plena de que a montagem foi feita pela Abin", afirmou o petebista. Segundo ele, foi combinada com o governo a reportagem da revista "Veja" que mostra a gravação em que o ex-diretor dos Correios Maurício Marinho -indicado ao cargo pelo PTB- embolsa R$ 3.000.

O SAPO E O ESCORPIÃO - Alvo preferencial de Jefferson, o PT foi classificado por ele como o escorpião que fecha um acordo para atravessar o rio nas costas do sapo. Na fábula, o escorpião pica o sapo, afirmando que não pode contrariar a sua natureza, e ambos morrem afogados. "Essa gente [PT] não é leal, nos usa como o sapo para atravessar o rio e sempre nos dão uma picadinha aqui e ali. Isso pode nos levar ao fundo do rio, mas levaremos junto esses escorpiões da cúpula do PT."
(RANIER BRAGON, FABIO ZANINI E SILVIO NAVARRO)

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