São Paulo, domingo, 15 de junho de 2008

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JANIO DE FREITAS

A norma da transgressão


O mais acintoso dos negócios inescrupulosos, a compra da Brasil Telecom pela Oi/Telemar só depende agora dos tribunais

O MAIS acintoso dos negócios inescrupulosos entre governo e interesses particulares só depende agora dos altos tribunais, onde as maiores probabilidades indicam que desembocarão as artimanhas, regidas pela Presidência da República, para violação das normas legais e oficialização da compra da Brasil Telecom pela Oi/ Telemar.
O acordo formalizado na quinta-feira entre os quatro conselheiros da Agência Nacional de Telecomunicações -Ronaldo Sardenberg, Pedro Jaime Ziller, Pedro Aguiar Jr. e Antonio Bedran- chancelaram-na, para todos os efeitos, como face oficial de maquinação jurídica com origem privada. A (i)legalidade do seu papel na trama sujeita-se à decisão judicial sobre seu poder, e direito, de subverter as normas nacionais da telefonia para dar legalidade a um negócio privado feito antes. E, além de antes, em transgressão e desafio ostensivos (públicos mesmo) à legislação vigente.
No mínimo, para ficar no mínimo, todo leigo pode indagar o que foi ou será feito do preceito básico de que novas normas jurídicas não têm efeito retroativo, como é dado agora em benefício de um negócio fechado e comunicado de público, com pagamento consolidável posteriormente, comum nas compras da ordem dos bilhões. No caso, de R$ 5,5 bilhões.
Outro aspecto para a esperada apreciação do Judiciário são as negociações consolidadas entre o BNDES e a Oi/Telemar, em plena vigência da proibição legal do negócio, para que o banco cumpra aí duas funções: proporcione recursos aos compradores (Oi/Telemar= grupos Andrade Gutierrez, sócio financiador de um filho de Lula, e Carlos Jereissati); e, como reforço complementar, a eles associe o subsidiário Banespar.
Os quatro conselheiros mostraram-se tão bem entendidos para a alteração unânime imposta ao Plano Geral de Outorgas, que sua entrevista televisada exibiu tropeções cômicos na justificação da manobra. Para o relator Pedro Jaime Ziller, por exemplo, ao possibilitar o negócio das telefônicas, a Anatel quis seguir "a tendência mundial das fusões". Para Ronaldo Sardenberg, a Anatel, da qual é o presidente, agiu "para promover a concorrência". Com a compra da Brasil Telecom, nenhum disfarce poderá contrariar a evidência de que a Oi/Telemar deterá o monopólio da telefonia fixa em todo o Brasil, excetuada uma parte de São Paulo. Segundo Sardenberg, portanto, fundem-se duas empresas para estimular a concorrência da nova com ela mesma.
Em tempo: o renovável mandato de Ronaldo Sardenberg como presidente da Anatel termina no fim deste mês. O de Pedro Jaime Ziller termina em novembro. Ambos já fizeram por merecer a renovação, mas, com as capacidades que demonstraram, por certo não lhes faltam perspectivas até melhores.

Dívidas
Vinte e cinco anos é o tempo de um dos critérios para medir uma geração. Esta coluna está fazendo 25 anos, ou o tempo de uma geração, ou, diriam os mais antigos, Bodas de Prata com o jornal. O aniversário, a rigor, foi no dia 7, mas a idade justifica a dose de senilidade que esqueceu a data.
Quando Carlos Castello Branco me disse, em fins dos anos 80, que sua incomparável coluna política no "Jornal do Brasil" completava 25 anos, fiquei abismado com os tantos significados e implicações disso, pessoais, profissionais, emocionais, tantos. Castellinho já estava obrigado pelo cardiologista a escrever pela manhã, não mais ao fim da tarde, para poupar-se das tensões que antecediam o confronto com o papel branco, hoje substituído pela tela não menos ameaçadora.
O "Jornal do Brasil" ficou devendo muito à Coluna do Castello. Esta coluna deve tudo à Folha, muito em especial a Octavio Frias de Oliveira e a Otavio Frias Filho, e aos demais Frias, aos que foram e aos que são meus colegas, aos que proporcionaram informação. E, fico abismado outra vez, à tolerância dos leitores que se revezaram aqui nestes 25 anos.


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